Fenômeno precoce: os próximos passos do tenista João Fonseca
O carioca de 18 anos acumula façanhas e, mantido o ritmo atual, tem tudo para se tornar a nova estrela mundial do tênis

A não ser que você tenha estado em Marte nas duas últimas semanas, deve ter ouvido falar na grande surpresa do esporte: o tenista brasileiro João Fonseca, de apenas 18 anos. Ao derrotar o russo Andrey Rublev na estreia do Aberto da Austrália, por 3 sets a 0, o carioca deflagrou iguais doses de celebração e espanto, com a vitória de um número 113 do ranking mundial contra um número 9. “Não consigo acreditar como esse cara já é bom”, disse o grande John McEnroe. “Tenho sido fã do jogo dele, tem um futuro brilhante”, cravou Novak Djokovic. O mundo está “fonsequizado”, na expressão já popularizada pela transmissão da ESPN para o Brasil.
A vitória inaugural em Melbourne estabeleceu marcas extraordinárias, que maus resultados em futuro breve são incapazes de deletar. Ele é o segundo tenista com menos de 20 anos a superar um adversário do top ten em torneios do Grand Slam (Austrália, Roland Garros, Wimbledon e Aberto dos Estados Unidos) desde 1973. Em nove partidas, até o estalo na Oceania, percorreu dezenove sets disputados e nenhum perdido. E mais: na disputa com Rublev, cravou um forehand — o golpe da raquete com a palma da mão virada para a frente, no caso de Fonseca, com a direita — a impressionantes 181 quilômetros por hora, superando as celebradas potências do espanhol Carlos Alcaraz e do francês Giovanni Perricard.
É muita coisa, e a derrota por 3 a 2 na segunda rodada, contra o italiano Lorenzo Sonego, 55º lugar, não impede o caminhar luminoso. É certo que Fonseca estará entre os 100 primeiros na semana que vem. Comparam-no com o italiano Jannik Sinner, o primeirão do planeta, forte e rápido, de saque absurdo e riqueza nas variações de fundamentos — além de extremamente calmo e objetivo em decisivos tie-breaks, embora erre, é claro.

Há um outro modo, didático, de aferir a largada do brasileiro: compará-lo, a esta altura da vida, aos 18 anos, a grandes nomes (veja no quadro). Nessa idade, Gustavo Kuerten, o Guga, o maior tenista da história do Brasil, um dos maiores de todos os tempos, tricampeão de Roland Garros e líder do ranking de dezembro de 2000 a boa parte de 2001, ainda não tinha estreado em nenhum dos torneios da ATP Tour. Fonseca encerrou a temporada de 2024, ano em que chegou à maioridade, como número 145 do ranking. Guga, em 1994, aos 18, terminou como o 418 da lista. Nas premiações — régua habitual de medida de sucesso no tênis —, o iniciante já amealhou 970 000 dólares, o equivalente a 5,6 milhões de reais. Guga, naquele ponto de sua trajetória, tinha conseguido 2 500 dólares, pouco mais de 15 000 reais.
Na ponta do lápis, portanto, Fonseca largou melhor que Guga, ídolo de infância e ainda hoje, registrado em fotografias — não é garantia de sucesso, mas é excelente ponto de partida para um menino que desde os 11 anos chama a atenção, dados o vigor e a habilidade que exibia com destreza nas instalações do Country Club, no Rio, sempre acompanhado do treinador Guilherme Teixeira. Ensaiou o futebol de salão, mas, depois de se machucar, foi para a bolinha felpuda.
Cabe agora ter a cabeça tranquila (ele tem) e nenhuma preocupação com dinheiro (tem de sobra, porque o pai, Christiano Fonseca Filho, é dono da IP Capital Partners, uma das maiores e mais antigas gestoras de recursos do país). Segundo pessoas próximas ao empresário ouvidas por VEJA, a visão de Christiano, ou Crico, como é conhecido no mercado financeiro, é de que a carreira do filho vai bem, muito bem, porque o menino tem “cabeça boa” para cuidar do corpo e da mente. “Quando chegávamos falando o quanto era o máximo o João ter chegado a um Grand Slam, o Crico só mandava ‘pois é, superlegal’ ”, diz um amigo que prefere o anonimato. “São todos muito low-profile.”
O próximo passo: fazer valer o estouro precoce para o amanhã. Com a palavra o brasileiro Marcelo Saliola, de 51 anos, que em 1987 bateu um recorde: foi o mais jovem tenista a marcar pontos em um torneio oficial, com pouco mais de 14 anos, e depois não chegou ao cume. “Naquela época, não se dava tanto valor pro mental”, lembra. “Era difícil ficar longe da família, falando por orelhão, sem smartphone, sem acompanhamento específico, sem cuidados pontuais.”
Fonseca, tudo indica, tem avenida mais aberta. Parece não haver erro, a medir pela aposta dos patrocinadores. Ele atraiu marcas globais como a On, de calçados e roupas esportivas, que tem Roger Federer como principal investidor; a Rolex; e a Yonex, de raquetes. Pode, sim, ter nascido um novo Guga. Ainda na quadra da primeiríssima conquista australiana, Fonseca foi ao microfone e, em inglês corrente, de sorriso tímido e juvenil a emoldurar as sardas, agradeceu para no fim pedir tempo para uma coisinha a mais e bradar em português castiço, como menino que é: “Aqui é Brasil, vamô!”.
Colaborou Juliana Machado
Publicado em VEJA de 17 de janeiro de 2025, edição nº 2927