Ele é o máximo: a grande fase de Max Verstappen, o “holandês voador”
Na espetacular temporada de 2023, ele aumentou sua pilha de recordes na Fórmula 1, com uma forma de competir que não dá espaço para ninguém
É comum — no esporte, sem dúvida, mas também em outras atividades — que filhos sigam a carreira de pais bem-sucedidos. É incomum, contudo, que façam sucesso. O caso do piloto holandês Max Verstappen, da escuderia Red Bull, é particular, como se ele tentasse corrigir as curvas do destino. O pai do tricampeão de Fórmula 1, Jos, foi corredor mediano, e olhe lá. Entre 1994 e 2003, disputou 107 provas, com apenas dois pódios, e nunca venceu. A mãe, a belga Sophie-Marie Kumpen, bicampeã de kart, abandonou as pistas um ano antes do nascimento de seu primeiro filho. Aos 26 anos, o “holandês voador”, como foi apelidado, escreve um capítulo diferente — e espetacular.
Dos 21 Grandes Prêmios disputados em 2023 antes da derradeira competição, em Abu Dhabi, no domingo, 26, ele venceu dezoito — o equivalente a 82% de sucesso, à frente de outros mitos do volante (veja no quadro). Até a penúltima disputa, em Las Vegas, tinha somado 549 pontos, ante 273 do companheiro de equipe, Sergio Pérez, e os 232 de seu principal rival, Lewis Hamilton, da Mercedes. É diferença imensa, resposta natural para o menino que aos 4 anos subiu em um kart e não parou mais. Ele tem talento e determinação de sobra, com iguais doses de arrogância e autossuficiência, e em muitos aspectos lembra o perfeccionismo lendário de Ayrton Senna, que não aceitava errar, ainda que pouco errasse. “Verstappen é diferente”, disse a VEJA Felipe Giaffone, piloto brasileiro da Fórmula Truck e comentarista da Band. Claro que o acerto dos bólidos faz diferença na F1, e um carro ruim estraga tudo, mas convém lembrar que mesmo o genial Hamilton comeu poeira. Tome-se, então, como régua, o parceiro da Red Bull, o mexicano Sergio Pérez, de 33 anos. Não há comparação possível.
Mas, afinal, o que faz de Verstappen um personagem tão especial? Não há uma única resposta. Ele não dá bola para o festival de caras e bocas, festas e rapapés do circo da velocidade. Não hesitou, portanto, em criticar a escolha de um circuito em Las Vegas. “Na minha infância, o que importava era a emoção do esporte”, disse. “Foi por isso que me apaixonei, e não pelo espetáculo.” Na condução lembra, de algum modo, o estilo agressivo de Senna. A entrada de curva muito rápida e precisa pode ser notada até por quem não tem muita intimidade com o ronco dos motores. É postura cultivada por anos de trabalho — o holandês foi o mais jovem piloto a iniciar uma prova, em 2015, no Grande Prêmio da Austrália, então pela Toro Rosso, uma espécie de Red Bull B. Um ano depois, em Barcelona, se converteu no mais jovem vencedor, aos 18 anos e 228 dias, já pela Red Bull.
Acompanhá-los nas próximas temporadas será exercício fascinante, o crescimento de uma figura que adora desafios. Pouco importa que o ambiente lhe seja adverso. Tanto no ano passado quanto agora, em 2023, ele chegou ao GP de São Paulo campeão. Foi vaiado pela torcida nas arquibancadas, que há anos adotou Hamilton como ídolo. “Faz parte”, disse Verstappen, mais de uma vez, confrontado com as agressões verbais. Tentou se aproximar, apoiado no fato de ter uma namorada brasileira, Kelly, filha de Nelson Piquet. Sabe algumas palavras de português, diz-se torcedor do Vasco da Gama, mas nem assim caiu nas graças da turma de cá. Um aviso: quem torce o nariz para Verstappen deve ir se acostumando. Ele tem longa supremacia pela frente. Ao menos até 2026, quando as mudanças estruturais dos carros mudarem a história. Por ora, não há indício algum de que vá frear o imparável ímpeto.
Publicado em VEJA de 24 de novembro de 2023, edição nº 2869