A história da Olimpíada de Paris em 10 imagens
VEJA selecionou momentos marcantes dos Jogos, o mais extraordinário de todos os tempos no casamento de uma cidade com o esporte
Acompanhe, a seguir, a seleção de VEJA. Seria possível fazer outras duzentas listas como essa, igualmente bonitas e interessantes. Mas aí vai uma piscadela para os Jogos, que já deixam saudade na memória coletiva.
SUA MAJESTADE, REBECA I
Lá no futuro, quando os escafandristas forem investigar os ecos de estranhas civilizações, o pódio da prova de solo na ginástica artística feminina terá capítulo de relevo. Foi a cena mais impactante de toda a Olimpíada, em imagem que percorreu o mundo. Lá estavam Simone Biles, de um lado, a dona da prata, e Jordan Chiles, bronze. Ao centro, Rebeca Andrade. As americanas, em gesto de humildade e de meninas sapecas, claro, encurvaram o corpo, como reverência à rainha brasileira. Foi bonito. Rebeca: “Eu vi como algo carinhoso delas, de ver o quanto a gente luta, de merecimento. Sei que a Simone queria estar ali, mas é entender que outras pessoas também têm espaço e respeitar esse momento. Elas são as melhores do mundo. Fiquei muito feliz e honrada”. Em tempo: no sábado, 10, o COI acatou recurso da Romênia e devolveu o terceiro lugar para Ana Barbosu. É provável que ela também se curvasse para a brasileira de Guarulhos.
A ESTÁTUA GREGA DO TAITI
Gabriel Medina parece ter congelado o tempo, como uma estátua grega no mar do Taiti. Ele ficou com o bronze, e não o tão sonhado ouro. Mas essa fotografia está eternizada – e não por acaso uma marca de cadernos do Brasil vai estampá-lo na capa. O fotógrafo francês Jérôme Bouillet, da agência AFP, vive há mais de dez anos na Polinésia Francesa e gira o mundo atrás dos bailarinos dos oceanos. Da soma do conhecimento do esporte e das agressivas ondas daquela praia, de mãos dadas com perfeito controle de tempo e sorte, ele fez a imagem que circulou pelas redes sociais. Parece ter sido tratada digitalmente, filha da inteligência artificial, mas não. É 100% real. Hum, mas um detalhe, que brotou com o passar dos dias: outros fotógrafos fizeram o mesmo registro, em ângulos muito parecidos.
A LIÇÃO DE ANATOMIA DE MARCHAND
Foi assim. Às 20h37 de uma noite de calor em Paris ele venceu os 200 metros nado borboleta. Às 21h35 subiu ao pódio para ouvir a plateia cantar a Marselhesa e entoar os gritos de “Léon, Léon”. Allons enfants! Às 22h31 caiu na piscina de novo para levar o ouro nos 200 metros nado de peito. O relógio cravou 22h46 e lá estava o garotão de 22 anos de volto ao andar mais alto da plataforma. Léon Marchand teve noite de Michael Phelps. Aux armes, citoyens!, urrava o público, diante do primeiro-ministro demissionário Gabriel Attal. Ao longo dos jogos, Marchand ganhou quatro medalhas de ouro. Nascido em Toulouse, de sorriso aberto, de meninão, Leon sai da Olimpíada como um dos grandes nomes – certamente como o principal destaque francês, resultado de habilidade natural, genética e ciência. Ele treina nos Estados Unidos com o técnico de Phelps, Bob Bowman. Os segredos: ninguém tem virada tão perfeita quanto ele, capaz de estender ao máximo o mergulho, sem descer muito e voltar à tona sem quebrar o ritmo. Vê-lo por meio das câmeras subaquáticas é uma aula de mecânica do nado, uma lição de anatomia.
“FOI PELA VÓ, É PRA VÓ, MÃE”
Depois de Santos Dumont, no Champs-de-Mars, sucesso de igual monta só mesmo o de Beatriz Souza, paulista de Itariri criada na cidade litorânea de Peruíbe, em São Paulo, e que desde criança esteve em tatames. Ela ganhou o ouro na categoria acima de 78 quilos. O sorriso pueril e o choro emocionado da campeã olímpica foram o primeiro grande momento do Brasil na Olimpíada de Paris. E ninguém mais esquecerá a frase dita diante das câmeras de televisão enquanto via e ouvia os pais pelo celular: “Foi pela vó, é pra vó, mãe”.
A ESGRIMA NO LINDO PALÁCIO
O frontão do Grand Palais anuncia com empáfia para o que ele veio ao mundo: “Monumento consagrado pela República à glória da arte francesa”. Construído entre 1897 e 1900 para a Exposição Universal de Paris, é um típico exemplo do estilo beaux arts, uma das escolas em vigor durante a Belle Époque. Tem mais ferro do que a Torre Eiffel. A cobertura de vidro é um dos derradeiros acenos da arquitetura ao período anterior à eletricidade – a transparência do teto faz entrar luz natural. Foi ali, com pompa e circunstância, que ocorreram as provas de esgrima, esporte que os franceses adoram. A esgrima é, de longe, a mais vencedora modalidade olímpica da França – eram 42 de ouro, 41 de prata e 35 de bronze até o início da atual olimpíada.
O RIO QUE PASSOU EM NOSSAS VIDAS
A cerimônia de abertura ao longo de seis quilômetros do Sena foi de tirar o fôlego, linda que ela só – especialmente para quem a acompanhou pela televisão. Em que outro lugar do mundo seria possível uma festa atravessar a história das dores e amores da civilização ocidental, diante de edifícios ainda em pé, colados a manchas da história. Houve até a Maria Antonieta de cabeça cortada. Os conservadores da extrema-direita, é claro, odiaram. Problema deles. E que fique na memória, ao fim de tudo, ao fim dos tempos, o clássico Hymne à L’Amour, de Edith Piaf, interpretado por Céline Dion no segundo andar da Torre Eiffel.
O MONUMENTO DE QUIMONO
Allez Teddy, Allez Teddy! Com exclamação, porque assim a torcida francesa na Arena Champs-de-Mars recebeu o judoca Teddy Riner nas cinco lutas que o levariam ao ouro na Olimpíada de Paris na categoria de 100 quilos – a terceira dourada, depois dos títulos de Londres, em 2012, e Rio de Janeiro, em 2016. Nunca houve uma personalidade esportiva francesa tão carismática, capaz fazer da agressividade no tatame o chamariz para o apoio incondicional. Ele depois ajudaria a França a levar o título por equipes. Riner, não há dúvida, virou monumento.
O ADEUS DE UMA LENDA CUBANA
O lutador cubano Mijaín Lopez é uma lenda em seu país, e não por acaso ele levou a bandeira do país de Fidel Castro na cerimônia de abertura, no Sena. Em Paris, ele ganhou sua quinta medalha de ouro sucessiva em olimpíadas na luta greco-romana da categoria de 130 quilos. Superou gente grande, um esquadrão de elite, turma que contava quatro topos do pódio: Michel Phelps (200 metros medley), Carl Lewis (salto em distância), Katie Ledecky (800 metros nado livre), Al Poerter (disco, no atletismo), Paul Elvstrom (vela) e Kaori Ico (luta greco-romana). Para Lopez, a vitória teve sabor político especial: ele venceu na final o cubano naturalizado chileno Yasmani Acosta por 6 a 0. Depois, tirou as sapatilhas e, como quem pendura as chuteiras, as posou no meio do tablado.
NEM O CÉU É O LIMITE
O sueco Armand “Mondo” Duplantis venceu a prova do salto com vara ao ultrapassar a marca de 6m25, e novo recorde mundial. Antes, ele dizimara a marca olímpica do brasileiro Thiago Braz, de 2016, de 6m03. Duplantis, depois de garantir o ouro, tinha três chances de superar a si mesmo na mais alta das alturas. Na terceira tentativa, com o Stade de France em silêncio, seguido de explosão inacreditável, como gol em final de Copa do Mundo, o atleta desenhou como parábola um dos mais extraordinários feitos da Olimpíada. Perto dele, talvez até um pouquinho acima dele, mas em prova menos badalada, houve a americana Sydney McLaughlin-Levrone nos 400 metros com barreiras, que parece correr em outra galáxia.
O SONHO DO DREAM TEAM
Em 35 dos 40 minutos da semifinal, contra a Sérvia, o basquete americano pareceu à beira do precipício. Aí LeBron James olhou para Stephen Curry, Curry deu uma piscadinha para Kevin Durant e o mundo voltou a girar como sempre. Levaram um susto, foi tenso, seria uma derrota inesquecível, mas viraram o placar nos minutos finas para vencer por 95 a 91. A final contra a França seria outro papo.