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A força do movimento feminino

Uma bela exposição no Centro Cultural dos Correios, no Rio de Janeiro, ilumina a batalha das pioneiras do atletismo brasileiro entre 1948 e 1984

Por Fábio Altman Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 16 out 2024, 12h57 - Publicado em 16 out 2024, 12h43

Na Olimpíada de Paris, em julho e agosto deste ano, pela primeira vez na história havia atletas mulheres e homens em igual quantidade. O Brasil, aliás, salvou-se no ranking de medalhas em virtude da força feminina. O COB enviou para a França 277 esportistas – 153 eram elas e 124, eles. O pelotão feminino representava 55% do total e as mulheres responderam por 65% das medalhas (13 no total, os homens 7), incluindo as únicas três douradas da lista. Foi extraordinário. 

Não foi travessia simples, ao contrário. Ainda que falte muito, mas muito mesmo para que a sociedade respeite as mulheres como se deve, é bom lembrar que deu-se a conquista nos esportes de modo tardio, fruto de sólidas e inaceitáveis bases machistas fincadas no nascedouro dos Jogos da Era Moderna, na Grécia, em 1896  — uma estreia sem mulheres. À frente da empreitada estava o francês Barão de Coubertin (1863-1937), autor de um comentário que hoje fere ouvidos, é terrível, mas àquele tempo foi recebido com naturalidade: “Impraticável, desinteressante, inestética e, não hesitamos em acrescentar, incorreta — é isso que seria uma Olimpíada com mulheres”. 

Na vez de Paris, em 1900, elas eram minguadas 22 representantes, que nem sequer duelavam por medalhas. Seu prêmio eram certificados de participação. Em 1924, na mesma Cidade-Luz, foram 4% do total, o que dá a dimensão do quão relevante é o salto de hoje. Nesse percurso, um sacolejo decisivo veio do ímpeto revolucionário de uma francesa, Alice Milliat, que fundou os Jogos Mundiais Femininos nos anos 1920, um evento à parte que acabou por chamar a atenção do Comitê Olímpico Internacional (COI). 

Um modo de acompanhar essa aventura, feita de esforço e militância, é ver a exposição Pioneiras do Atletismo Brasileiro nas Olimpíadas 1948 – 1984, no Centro Cultural dos Correios, no Rio de Janeiro, a partir desta quarta-feira, 16 de outubro. A mostra é um trabalho da ESPM, escola de referência, autoridade em marketing e inovação voltada por os negócios, por meio do LEMBRAR, o Laboratório de Estudos de Memória Brasileira e Representação.   

Idealizada pela ex-atleta Eleonora Mendonça – a primeira maratonista brasileira a ir a uma olimpíada, em 1984 –, a coleção de fotos, vídeos e áudios retrata a trajetória das primeiras mulheres brasileiras que competiram no atletismo olímpico, abrangendo dez edições dos jogos, de 1948 a 1984. “A ideia é levantar o véu da escuridão que apagou a carreira das atletas”, disse a VEJA Eleonora, que criou um Instituto destinado a iluminar as injustiças. “Além de destacar os desafios enfrentados por essas pioneiras, a mostra apresenta um rico acervo visual que inclui uniformes, reportagens jornalísticas e depoimentos das personagens que fazem parte dessa história pouco conhecida”, afirma André Beltrão, pesquisador do Laboratório LEMBRAR da ESPM. No sábado, 19 de outubro, das 14 horas às 17 horas, haverá um evento especial com a presença de Eleonora e algumas das ex-atletas que contam essa saga.  

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“Apagada”

Destacam-se, entre as personagens elencadas entre as pioneiras, nomes que precisam ser recuperados. A própria Eleonora Mendonça, a primeira da maratona brasileira, em 1984. Wanda dos Santos, dos 80 metros com barreiras da Olimpíada de 1952. Aída dos Santos, quarto lugar no salto em altura dos Jogos de 1964, em Tóquio. E uma figura especialmente emocionante, Irenice Maria Rodrigues, “apagada” das enciclopédias pelas autoridades. Recordista brasileira dos 400 e dos 800 metros em 1967, a atleta negra correu o risco de ser proibida de disputar os Jogos Pan-Americanos de Winnipeg – naquele tempo, a prova dos 800 metros era considerada desgastante demais para o corpo das mulheres.

Irenice integrou um movimento de protesto que reuniu os atletas contra o autoritarismo do Conselho Nacional de Desportos e, ao fim, foi inscrita no Pan. No ano seguinte, integrou a delegação brasileira nos Jogos da Cidade do México. Contudo, acusada de indisciplina e agressão por supostamente ter brigado com uma colega, em meio a exclamações de racismo, foi desligada e teve de voltar ao Brasil. A vida de Irenice foi contada no excelente curta-metragem Procura-se Irenice, de Marco Escrivão e Thiago B. Mendonça, que poderá ser visto durante a exibição de Pioneiras do Atletismo Brasileiro nas Olimpíadas 1948 – 1984. 

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-Irenice Maria Rodrigues: contestadora, ela foi “apagada” pelas autoridades no tempo da ditadura
Irenice Maria Rodrigues: contestadora, ela foi “apagada” pelas autoridades no tempo da ditadura (//Reprodução)

 

Eleonora Mendonça no cartaz da exposição: a primeira brasileira a participar de uma maratona olímpica, em 1984
Eleonora Mendonça no cartaz da exposição: a primeira brasileira a participar de uma maratona olímpica, em 1984 (//Divulgação)

Assista ao curta-metragem Procura-se Irenice

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