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‘Pico da Neblina’: o bagulho não é tão simples

Ao vislumbrar um futuro em que a maconha é legalizada no Brasil, a série da HBO prova que não existem saídas fáceis para essa questão delicada

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 2 ago 2019, 15h07 - Publicado em 2 ago 2019, 07h00

Parlamentares digladiam-se na votação de um tema controverso no Congresso. Talvez nem um impeachment presidencial causasse tamanho furor: o que está em jogo é a legalização da maconha para uso recreativo no Brasil. Um deputado esbraveja: “Por Deus, pela família, eu voto NÃO”. Outro sai em defesa da medida: “Viva a maconha! Eu voto SIM”. Longe de Brasília, em uma boca de fumo na Zona Leste de São Paulo, traficantes reagem de modo inusitado (mas com­preen­sível) ao circo televisionado: enquanto os deputados que votam contra a liberação ganham aplausos, quem fica a favor é vaiado. A cena resume as complexidades do vespeiro cutucado por Pico da Neblina, nova série brasileira que estreia neste domingo, 4, às 21 horas, na HBO.

Com a fictícia mudança na lei, vislumbra-se um Brasil do “liberou geral”. Mas a coisa não é tão simples. Ao mesmo tempo em que nasce um mercado oficial da maconha, o tráfico tem de se ajustar — assim como seus agentes e consumidores. Quem puxa a fila da adaptação forçada é Biriba (Luís Navarro), traficante popular entre clientes das classes média e alta. Biriba é cuidadoso no trato com a Cannabis — que seu melhor amigo e chefe da boca, Salim (Henrique Santana), lhe entrega quase bruta. O rapaz lava, processa e prensa a erva, criando produtos variados. O lucro é revertido no sustento da casa em que vive com a mãe, a irmã (a cantora Leilah Moreno) e as duas sobrinhas. A liberação coloca o rapaz diante de dois caminhos: sair da ilegalidade e abrir uma loja de maconha com o atrapalhado ex-cliente Vini (Daniel Furlan, do Choque de Cultura), um playboy que tenta provar que tem tino de empreendedor, ou assumir a vaga de gerente na boca — que vai reforçar o comércio de cocaína para suprir o desfalque da Cannabis. “Vou correr pelo certo agora”, diz Biriba, ao tentar se afastar do tráfico. Esta, porém, não é uma escolha cujas consequências ele poderá controlar.

A série brasileira engrossa o nicho voltado para o tema, sobretudo na produção americana. No ar de 2005 a 2012, Weeds trazia uma viúva que prospera no comércio de maconha, antes de sua legalização em alguns estados americanos. A abobalhada sitcom Disjointed, lançada em 2017 pela Net­flix, é uma celebração deslumbrada da legalização da erva. Ao retratar um momento em que essas experiências pelo mundo já começam a ser avaliadas na prática, Pico da Neblina mostra que uma hipotética liberação teria desdobramentos mais complicados do que acreditam tanto seus defensores quanto seus detratores contumazes. Com seu fundo cômico, a série lembra que os dramas sociais, a violência do tráfico e os efeitos do entorpecente não seriam eliminados da noite para o dia. Um acerto dos dez episódios conduzidos por Quico Meirelles (filho do diretor de Cidade de Deus) é a presença de atores iniciantes da periferia de São Paulo. Eles conferem prosódia rea­lista a um roteiro que oscila da ironia à provocação — e que fornece menos fu­maça e mais ideias concretas.

Publicado em VEJA de 7 de agosto de 2019, edição nº 2646

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