A fórmula para uma boa nota na redação do Enem
Com a proximidade do exame, acelera-se a corrida aos cursinhos, que ensinam os caminhos para vencer um dos mais desafiantes capítulos da prova
Às vésperas do Enem, exame que serve de porta de entrada para as principais universidades públicas e privadas do país, milhões de estudantes buscam caminhos para vencer tão angustiante etapa. E, nessa acirradíssima corrida, dominar as ferramentas para uma boa redação se tornou um pré-requisito essencial, diante do peso que ela carrega no conjunto do resultado final da prova, marcada para 13 e 20 de novembro. Não basta apenas se expressar de forma clara e objetiva, mas também desenvolver no papel uma fórmula argumentativa em que não cabem improvisos. Daí a elevada procura, impulsionada pelas lacunas deixadas pela pandemia, por cursinhos e plataformas voltados para ensinar ao aluno como escrever o texto de que o Enem gosta.
De olho na nova oportunidade de negócio, a Cogna Educação, a maior empresa brasileira do setor, incorporou a Redação Nota 1000, plataforma on-line de correção de textos sob medida para vestibulares. “O número de redações corrigidas pelo site aumentou 60% no período pós-pandemia”, afirma Clayton Dick, criador da startup. Com franquias espalhadas pelo Brasil, o Colégio e Curso AZ, que já oferecia aos alunos três aulas semanais de texto, abriu um módulo extra para estudantes não matriculados na rede. “Assim como uma ginasta vai para a Olimpíada com uma coreografia milimetricamente ensaiada, é estratégico que o aluno chegue ao Enem bem preparado para escrever como se espera”, compara a professora paranaense Luma Dittrich, criadora de um método próprio que promete guiar os alunos a pontuações acima dos 900 na redação do Enem, algo extraordinário diante da média de 630.
A fórmula ensinada pelos cursos do gênero é em geral extraída da estrutura de redações avaliadas com a nota máxima. Citações, por exemplo, são fundamentais, valendo memorizar pensamentos de Platão e Rousseau que se apliquem a vários propósitos. O bom uso dessas aspas adquiriu tamanha importância que alguns colégios e cursinhos dão “aulas de citação”, que podem ser pinçadas tanto da cultura erudita como da popular — um trecho de um bom rap sempre faz sucesso. Outros macetes ressaltados são o bom uso de termos conectivos (todavia, contudo), para alinhavar os parágrafos, e listas de sinônimos para ampliar o vocabulário (veja no quadro). “A divulgação dos textos com nota máxima e dos critérios cada vez mais objetivos de correção do exame favoreceu a criação de técnicas reproduzidas em escolas”, explica Tiago Moreira Gomes, coordenador de língua portuguesa do Colégio Vital Brazil, de São Paulo.
A prova de redação do Enem não privilegia o melhor estilo. Mais importante do que escrever com floreios e metáforas é seguir atentamente o roteiro dividido em parágrafos nos quais se apresenta o problema, se desenvolvem os argumentos e se propõe uma solução. Posto dessa forma, o texto será julgado em uma leitura rápida pelos avaliadores, sempre premidos pelo tempo. Na média, a redação representa 20% da nota, mas o critério muda conforme o curso escolhido — e o porcentual pode ser bem mais alto. Um zero nessa prova exclui o candidato da disputa por uma vaga. Determinada a cursar medicina, a mais concorrida de todas as carreiras, Ádina do Nascimento, 16 anos, decidiu se matricular em um cursinho de redação para complementar o conhecimento adquirido na escola de Ariquemes, cidade de Rondônia, onde mora. “Senti falta de uma correção mais profunda e de um acompanhamento individualizado no colégio”, justifica.
Na luta também por um lugar ao sol na almejada faculdade de medicina, o potiguar Guilherme Belo, 19 anos, se diz satisfeito com o investimento nas aulas extras de redação, que variam de 60 a 400 reais conforme o pacote contratado. “Por ter vindo de escola pública, os efeitos da pandemia foram avassaladores na minha preparação. Com o cursinho, minha nota na redação vem aumentando gradativamente”, comemora. Especialistas, no entanto, alertam para o fato de que é preciso tomar cuidado com os milagres em curto prazo. “O ideal é o aluno ser capaz de dissertar sem se limitar às fórmulas e à decoreba pura e simples”, lembra o professor Gomes. Fica a dica: treine bastante a redação do Enem, deixando espaço para a criatividade e a articulação de ideias que, afinal, compõem a arte de escrever bem.
Publicado em VEJA de 9 de novembro de 2022, edição nº 2814