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Walcyr Carrasco: A burrice quântica

Gurus da “nova era” apelam à física, mas nem sabem o que dizem

Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 4 jun 2024, 15h59 - Publicado em 23 ago 2019, 06h30

Confesso, sempre tive um lado místico. Aprendi meditação, tenho fascínio por ioga. Meu maior sonho seria ficar de ponta-cabeça, apoiado só no crânio. Paixão pelo lado oculto do universo não me falta. Mas, juro, não entendo a nova “espiritualidade quântica”. Ou seja lá qual for o nome da atual moda esotérica existencial. Outro dia encontrei um amigo que pretende viver de maneira “quântica”. Fiz expressão de sabedoria. Se não tenho a menor ideia do que alguém está dizendo, é o que faço: expressão de sabedoria. Não teria vergonha de assumir ignorância. Só senti que não teria paciência para a explicação. Aprendi a fazer essa expressão diante dos gurus da década de 60, que diziam coisas do tipo: “O nada é tudo, o tudo é nada”. Multidões deslumbravam-se como se estivessem diante de uma revelação. Enquanto o guru provavelmente comia lagosta e caviar regados a champanhe com a grana dos fiéis. A palavra da ordem de agora é “quântico”.

A física quântica, de onde deriva toda essa “sabedoria”, é o ramo teórico da ciência que estuda os fenômenos que ocorrem com as partículas atômicas e subatômicas. Ah, não me peçam para explicar. Procurei no Google para dar respeitabilidade a estas linhas. Mas… há alguns anos a física quântica virou pop porque se sabe que ela entra em campos revolucionários do conhecimento do universo. Tipo o que é não é e é ao mesmo tempo. (Ixi!) Há um exemplo simples: um gato está dentro de uma caixa. Se a caixa for aberta, o gato morrerá. Pergunta-se: o gato está vivo ou está morto? Resposta quântica: está vivo e está morto. As duas condições são reais para o gato. Não entra no exemplo nenhuma teledramaturgia, sinto muito. Eu, como autor, já faria a heroína da novela salvar o gato arrancando o fundo da caixa. Mas não pode. O exemplo é esse mesmo. No mundo atômico e subatômico, entre prótons, elétrons e nêutrons, ocorrem fenômenos que desafiam a realidade tal como a entendemos. Tudo isso ouvi de orelhada.

“Entrei num site que promete ‘cura reconectiva’. Como existe gente capaz de pagar caro por uma modinha espiritual!”

A partir dessa noção superficial, criou-se um novo esoterismo. Explodiu, virou moda. Entrei no site da Amazon. Encontrei 656 títulos em português relacionados. Alguns exemplos: Médico Quântico; Corpo Quântico; Toque Quântico (com poderes curativos); Enigma Quântico — O Encontro da Física com a Consciência e, oh, oh, oh, Amor Quântico. Entrei em um site “quântico”. Promete “ressonância harmônica”, “cura reconectiva”. Mais adiante, uma advertência: nossa realidade pode ser um holograma!

Eu me admiro. Como existe gente capaz de pagar caro por uma modinha espiritual!

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Quando meu amigo falou em “vida quântica”, certamente se referia a morar no mato, desprendido dos bens materiais. Se alguém vier vender um workshop com “mergulho quântico”, ou um novo tratamento baseado em “energia quântica”, peça-lhe que traduza. Vai ouvir palavras desconexas, adjetivos, mas nenhuma explicação clara. Talvez algumas palavras sobre harmonia e conexão com o cosmo. O guru da nova era nem sabe o que está dizendo. Burrice é cair nessa.

Publicado em VEJA de 28 de agosto de 2019, edição nº 2649

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