Unesco tomba Sítio Burle Marx, no Rio, como patrimônio mundial
Com mais de 3 500 espécies de plantas, a propriedade que sintetiza a obra do paisagista é o 23º bem brasileiro a integrar a lista do órgão vinculado à ONU
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) reconheceu o Sítio Roberto Burle Marx, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, como Patrimônio Mundial nesta terça-feira, 27. De valor inestimável para a botânica e o paisagismo, o espaço é agora o 23º patrimônio brasileiro a receber a honraria.
Em reunião realizada em Fuzhou, na China, o Comitê do Patrimônio Mundial do órgão vinculado à ONU constatou o “valor excepcional universal” da obra de Burle Marx, que, por meio da inventividade do movimento modernista associada a trabalhos inestimáveis na catalogação de espécies tropicais e subtropicais, criou o aclamado conceito de “jardim tropical moderno”. A decisão representa a consagração mundial do legado pessoal do paisagista e pintor brasileiro, figura múltipla da arte moderna nacional.
“O Sítio Roberto Burle Marx é certamente uma obra de arte, onde as paisagens são o elemento de maior destaque, ligando todo o conjunto com poderosa personalidade”, diz Claudia Storino, diretora do espaço, em comunicado enviado à imprensa. “Os espaços ajardinados do Sítio materializam tanto os princípios paisagísticos da obra de Burle Marx quanto os processos de análise, cultivo e experimentação que impulsionaram a criação do paisagismo tropical moderno.”
A origem do sítio data do século XVII, originalmente batizado de Fazenda ou Engenho da Bica pela proximidade com fontes de água que atendiam à população local, na região de Barra de Guaratiba. A construção da capela de Santo Antônio, em meados de 1681, lhe atribuiu outro nome: Engenho Santo Antônio da Bica, e, depois, Sítio Santo Antônio da Bica. Passados mais de 200 anos, Roberto e o irmão Guilherme Siegfried Burle Marx compraram, em 1949, o primeiro terreno que hoje integra o espaço, na busca de um ambiente que unisse boa diversidade de espécies, solos adequados para cultivo e trabalho botânico, rochas expostas, água em abundância e com um entorno a salvo de projetos de especulação imobiliária. Reunindo os ecossistemas manguezal, restinga e Mata Atlântica, o Sítio foi casa de Burle Marx em seus últimos anos de vida, de 1973 a 1985, até ser doado ao governo federal pelo próprio paisagista. Ele hoje está sob tutela do Iphan, autarquia vinculada ao Ministério do Turismo
“Deus, para mim, é a natureza”, disse certa vez Burle Marx, cuja vida de relação estreita com as plantas culminou em trabalhos esplendorosos nas áreas da botânica e do paisagismo. O Sítio é o mais eloquente representante do pensamento do paisagista: com mais de 3 500 espécies de plantas organizadas em viveiros e jardins, algumas destas descobertas pelo próprio Burle Marx, o espaço é um dos mais importantes acervos naturais do mundo. Além disso, também reúne pinturas, esculturas, cerâmicas e tapetes feitos pelo artista, somados a centenas de outras peças de arte representantes de coleções cusquenhas, pré-colombianas, sacras e popular-brasileiras. Na área de 405 000 metros quadrados, também há sete edificações, seis lagos e uma vasta biblioteca.
23º representante brasileiro na lista de Patrimônios Mundiais da Unesco, o Sítio Burle Marx faz companhia à cidade de Ouro Preto, em Minas Gerais, e aos centros históricos de Olinda (PE) e Salvador (BA). As ruínas de São Miguel das Missões, no Rio Grande do Sul, também foram tombadas pela Unesco.
O paisagista de bigode simpático também foi responsável pelos jardins de espaços como o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM/RJ), o Eixo Monumental de Brasília, o Aterro do Flamengo, no Rio, e a Embaixada do Brasil em Washington, nos Estados Unidos. Morto em 1994, vítima de uma embolia pulmonar, Burle Marx deixou um legado de mais 2 000 jardins projetados Brasil afora – e um que entra, agora, para o panteão de patrimônios mundiais.