Toronto: ‘Três Anúncios para um Crime’ provoca reações fortes
Frances McDormand é candidata ao Oscar por sua atuação como a mãe que publica outdoors cobrando ação da polícia na investigação do assassinato da filha
Se o mundo fosse justo, Frances McDormand levaria o Oscar de melhor atriz por Três Anúncios para um Crime, escrito e dirigido pelo dramaturgo Martin McDonagh, apresentado no Festival de Toronto depois de levar o prêmio de melhor roteiro no Festival de Veneza. McDonagh sabe que tem ouro nas mãos e deixa a câmera captar cada nuance da performance da atriz, que vai do ódio ao desespero, à compaixão e ao sarcasmo em frações de segundo. McDormand concorreu quatro vezes à estatueta dourada, levando uma, por Fargo (1996), dirigido por seu marido, Joel, e o cunhado, Ethan Coen.
Martin McDonagh, diretor do esperto Na Mira do Chefe (2008) e de Sete Psicopatas e um Shih Tzu (2012), é londrino de origem irlandesa, mas capta aqui o espírito da América profunda como poucos. McDormand é Mildred Hayes, que teve sua filha estuprada e assassinada na pequena Ebbing, Estado de Missouri. Sete meses se passaram, e a polícia não tem pistas do criminoso. Frustrada e com raiva, ela decide pagar por três outdoors cobrando ação do xerife Bill Willoughby (Woody Harrelson, ótimo), amado pela população. O resultado é que a cidade se volta contra Mildred, especialmente depois da revelação de que ele está com câncer. As coisas então se complicam, porque ela precisa lidar com Jason Dixon (Sam Rockwell, excelente), um policial de intelecto limitado, violento e racista que ainda mora com a mãe.
O roteirista e diretor expõe a falta de confiança nas instituições e a raiva permanente em certas camadas da sociedade americana, especialmente entre brancos, de classe média, sem educação superior, que, em grande medida, contribuíram para a eleição de Donald Trump. Mas ele nunca trata o assunto, o lugar ou as pessoas de maneira simplista. Há muita compaixão em seu olhar, o que é fundamental em uma obra também muito sarcástica e violenta.
Em muitos momentos, o espectador ri e imediatamente percebe que talvez não devesse, ou se surpreende e se emociona quase simultaneamente. Talvez por isso provoque reações catárticas nas plateias que tiveram a chance de ver até agora, com aplausos em cena aberta. O elenco tem um desafio e tanto nas mãos e brilha, até mesmo Peter Dinklage, com um papel pequeno. É um filme raro, que surpreende sempre, sem ser maldoso nem forçar a barra pelo choque puro e simples. E que mostra que ter raiva o tempo todo talvez não seja o melhor caminho.