Tico Santa Cruz, sobre hit ‘Micheque’: “Não cometemos crime”
Após lançar música que satiriza os depósitos de Fabrício Queiroz na conta da primeira-dama, cantor do Detonautas critica Flordelis em nova letra
Ficou com medo de um processo ao saber que o Detonautas está na mira da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, por causa de Micheque? Nós nos resguardamos juridicamente antes de lançar a música. Não cometemos nenhum crime. Se algo acontecer, será mais intimidação que qualquer outra coisa. O fato é que, depois que os assessores dela falaram que estaríamos cometendo crimes, a letra chamou ainda mais atenção. A música faz perguntas que todos os jornalistas já fizeram. É um direito do povo saber. Ninguém explicou a mecânica desses depósitos.
Foi uma surpresa a música ter viralizado entre os jovens? A hashtag #micheque já estava circulando. A música fala por si só e tem uma abordagem simples, com um vocabulário mais brincalhão. A faixa viralizou no TikTok, o que ajudou a nos conectar com uma geração mais jovem, que talvez não tenha tanto interesse no rock.
Depois de Micheque, o Detonautas lançou também Mala Cheia, que critica os “falsos cristãos”. Como surgiu a música? Peguei um versículo de Lucas, em que Jesus entra no templo dizendo que transformaram o local em um covil de ladrões. A música não é uma crítica às religiões, nem aos evangélicos. Ela critica os falsos cristãos que usam a fé para fazer dinheiro, usando o fundamentalismo religioso para determinar o comportamento das pessoas, pregar o ódio e o preconceito.
Mala Cheia cita a deputada e cantora gospel Flordelis. Qual foi a reação dela? Usamos o nome dela com outra fonética: Flordélis (com acento agudo). Na verdade, não fizemos nenhuma acusação. Na letra, apenas dizemos: “casa com a Flordélis que é o melhor que você faz”. A frase não quer dizer nada e, até que se prove o contrário, ela é inocente. Se se sentir incomodada, ela vai estar assumindo uma coisa que até o presente momento não foi provada.
Nos governos do PT, o Detonautas não fazia menos músicas de protesto? De 2016 a 2020, a gente fez quatro ou cinco músicas de protesto. Desde o lançamento do nosso primeiro disco, em 2002, já somamos umas catorze canções políticas. No Rock in Rio de 2011, fizemos um protesto dizendo que o governo deveria temer o povo. Na época, as pessoas ainda não estavam muito interessadas em política. Além disso, letras sobre o tema quase não tocam nas rádios. Isso não significa que as músicas não foram feitas. Agora, estamos no estúdio gravando uma música sobre fake news. É um tema urgente nessas eleições.
Publicado em VEJA de 4 de novembro de 2020, edição nº 2711