Sem surpresas, final de ‘Insensato Coração’ tem falhas, pérolas e morte com requinte
Assassinato de Léo por Cortez, em cadeia que reunia todos os vilões da novela, teve câmera lenta e trilha clássica. No último capítulo, Pedro volta a trabalhar
Casamento de mocinhos, punição dos vilões e revelação de segredos. O último capítulo de Insensato Coração reuniu todos os finais clássicos de novela. Alguns elementos técnicos, porém, atualizaram os desfechos batidos e deram requinte à conclusão da trama. A sequência da morte de Léo na prisão, por exemplo, teve música clássica na trilha sonora, captação de imagens em contra-luz e aplausos de Horácio Cortez (Herson Capri) ao lado do corpo desfalecido. Os efeitos renderam uma linguagem pouco usual à teledramaturgia brasileira.
As inovações, porém, não cobriram a falha do texto que, que conseguiu reunir numa mesma cadeia todos os vilões da novela. Nem se refletiram no Ibope, que marcou 47 pontos. Apesar de ser considerado um resultado bom, não chega perto de audiências registradas em capítulos finais de novelas como Passione (50 pontos) e Caminho das Índias (55 pontos).
O título do folhetim Insensato Coração representou, no fim, a maior pista para o mistério de quem assassinou Norma (Glória Pires). A madame deslumbrada Wanda (Natália do Vale) justificou os três disparos na ex-presidiária como um ato extremo de amor maternal, feito para evitar com que seu filho Léo (Gabriel Braga Nunes) fosse parar na cadeia. Ao contrário do irmão de Pedro, Horácio Cortez não inspirou piedade de nenhum outro personagem e ainda engoliu em seco desaforos do filho Rafael (Jonatas Faro). O banqueiro corrupto terminou atrás das grades. Wanda entrou em crise de depressão e terminou delirando numa cama de hospital, obcecada pelo filho preferido, assassinado ao mando de Cortez. O corrupto soube por Jandira (Cristina Galvão), braço direito de Norma, que seu antigo funcionário fora o responsável pelo vazamento de um vídeo que o incriminava.
Longe da trama policial, o lado romântico e cômico do último capítulo teve como destaque o casamento de Carol (Camila Pitanga) e Raul (Antonio Fagundes). A cena do enlace conclui a trajetória de quatro personagens em um take só. Depois do “sim”, Marina (Paola Oliveira) deu início ao trabalho de parto de seu filho com Pedro (Eriberto Leão).
O piloto, aliás, enfim voltou a trabalhar no último capítulo, depois de passar a novela toda perseguindo o irmão ou tentando reconquistar a aguada Marina.
Pérolas – “Vamos fazer uma drenagem linfática nessa corrupção. Vamos combater a celulite do governo.” Foi com esse erudito discurso que Natalie Lamour subiu ao palanque como candidata a deputada pelo PMP – Partido da Moralidade Pública. Um arremedo de Tiririca – por si só um arremedo de político -, ela disse ao irmão, ignorante do que fazia um deputado, que se eleita ela lhe contaria a função.
Na categoria romântico-afetiva, a graça ficou com a comemoração de André (Lázaro Ramos), ao descobrir que ainda podia, sim, dar conta de um rala-e-rola com alguém. Ele interrompeu uma corrida em volta da Lagoa Rodrigo de Freitas para festejar, com gritos de ‘yes’, o seu retorno ao esporte de alcova. Ficou também com o comentário sem sal do herói sem sal para a mocinha sem sal. “Huuuum, os hormônios deixaram você impossível”, soltou ele ao vê-la com barrigão de grávida. Terminaram tão sem sabor como começaram.
Momentos de autoajuda – A empresa moralizadora dos autores Gilberto Braga e Ricardo Linhares não economizou no uso de sermões. Quem quis acompanhar a novela até seu suspiro derradeiro – a manjada cena autorreferente em que funcionários da produção festejam a alforria – teve de encarar a conversão do individualista André (Lázaro Ramos) em ser social e a exaltação aos valores familiares, no brinde de Vitória (Nathalia Timberg) que encerrou a trama propriamente dita.
“Você me fez entender que precisamos dos outros para viver”, disse o antes lobo solitário André à sua agora melhor amiga Carol (Camila Pitanga). “E que a maior perda de tempo é tentar ser quem a gente não é.” É claro que André estava feliz por ter vencido, com a mãozinha de Leila (Bruna Linzmeyer), a impotência sexual que veio de brinde com um câncer de testículo. Mas não precisava exagerar.
Já Vitória lembrou a importância da união familiar, enquanto seu bisneto passava de braço em braço entre os convidados de uma festa – onde, sem a menor educação, alguém perguntou a Oscar (Luigi Baricelli) que pena tinha recebido seu filho pitboy, Vinicius (Thiago Martins). “Doze anos”, respondeu. “Espero que ele use esse tempo para refletir”, disse uma irreal Alice (Paloma Bernardi). “Há conflitos, claro, mas, se os sentimentos continuarem vivos, ninguém vai poder destruir a família”, bradou Vitória depois. De fazer corar.
Toda novela termina em casamento… gay – Um dos pontos de destaque do capítulo final de Insensato Coração foi a atualíssima união homoaefetiva dos personagens Eduardo (Rodrigo Andrade) e Hugo (Marcos Damigo). Apesar dos freios impostos pela Globo ao tratamento da questão gay na novela, os autores positivaram o tema até o final. No meio do casamento, o homofóbico jornalista Kléber (Cassio Gabus Mendes) aparece para dar um abraço no filho recém-descoberto – coisa de novela: só no penúltimo capítulo Kléber descobre que é pai de um garoto de quase trinta anos. Mas houve também casamento hetero: de Raul (Antônio Fagundes) e Carol (Camila Pitanga), que ultrapassou o parceiro em dez centímetros com o salto.