Samara Joy: quem é a cantora que renovou o jazz – e é fã de Djavan
Prestes a se apresentar no Brasil, a americana traz um sopro de renovação ao gênero graças à voz potente e conexão com a nova geração
Quando Olivia Rodrigo subiu ao palco para anunciar o vencedor da categoria artista revelação do Grammy, em fevereiro, Samara Joy não esperava ouvir seu nome proclamado pela cantora do hit juvenil Drivers License. Aos 23 anos, a nova-iorquina Samara era até então desconhecida por uma parcela considerável da audiência e concorria com atrações de apelo popular inegável, como a brasileira Anitta e a banda italiana Måneskin. Mas foi seu jazz embalado por uma voz potente que levou para casa a cobiçada estatueta. “Fiquei tão descrente que deixei meu celular com o discurso na mesa e tive de improvisar na hora”, contou ela a VEJA — a artista se apresenta no festival C6 Fest, no Rio e em São Paulo, em 19 e 21 de maio.
Dona de um timbre marcante e técnica vocal apurada, Samara surge como uma renovação bem-vinda em um gênero marcado por cantoras lendárias, impondo a ela comparações inevitáveis com as divas do passado. “É como se Sarah Vaughan e Ella Fitzgerald vivessem em seu corpo”, descreveu a atriz Regina King, citando duas das maiores representantes do jazz. “No começo, senti a pressão. Hoje, gosto quando dizem que eu lembro Sarah Vaughan, já que ela é uma das minhas inspirações. Mas também fico feliz que reconheçam que tenho minha própria voz”, reflete a cantora, que aponta Betty Carter, Aretha Franklin, Chaka Khan e Beyoncé como outras fontes de influência.
O livro do jazz: de Novas Orleans ao século XXI
Nova estrela de uma vertente musical tradicional hoje quase alijada do mainstream, Samara reverencia as figuras históricas da música, mas não deixa de ser fruto de seu tempo: ativa nas redes sociais, ela acumula mais de 4 milhões de visualizações no TikTok, no qual compartilha suas apresentações e vídeos divertidos — como aquele em que reage ao elogio de Regina King. “Tenho um público para o qual posso apresentar e difundir o jazz. A internet ajuda, mas não sem sacrifício”, afirma ela, que sofreu uma onda de ataques on-line de brasileiros depois de bater Anitta no Grammy: “As pessoas têm opiniões. Não presto muita atenção, nem fico ofendida”.
Nascida no Bronx, em Nova York, Samara é fruto de uma família musical: os avós paternos fundaram o grupo gospel The Savettes, e o pai, baixista, fazia turnês com o cantor Andraé Crouch. “A música estava por toda parte. Gospel, R&B: cresci ouvindo e imitando muitos cantores”, relata ela, que se interessou pelo jazz no ensino médio, quando começou a cantar com a banda do colégio, mas só se decidiu por esse caminho na faculdade. A opção, no entanto, não foi fácil. Escanteado pela indústria musical americana, hoje pautada pelo pop e pelo hip-hop, o jazz acabou virando música de nicho, restrito a iniciados. Para Samara, estar fora do circuito tradicional é um fardo e uma bênção. “É prejudicial para os artistas porque as pessoas não enxergam o gênero como algo popular. Mas também gosto de estar fora do mainstream porque, de certa forma, o estilo se mantém puro. Não é unicamente por dinheiro ou atenção: é sobre a música”, afirma.
Com dois álbuns lançados, o autointitulado Samara Joy (2021) e Linger Awhile (2022) — esse último vencedor do Grammy de álbum de jazz —, é difícil negar que o ritmo que nasceu na comunidade negra de Nova Orleans, no sul dos Estados Unidos, seja, de fato, sua casa. Mas a cantora também tem ouvidos para outras melodias: prestes a aterrissar no Brasil, Samara diz estar ensaiando canções em português — e tem uma afeição nacional curiosa. “Eu adoro Djavan”, proclama. A diva do jazz 3.0 é coisa nossa.
Publicado em VEJA de 19 de abril de 2023, edição nº 2837
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