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Rufus Wainwright: a saga de superação (e brilho) de um dândi da música

Após superar o vício e acumular discos, óperas e trilhas de prestígio, o cantor celebra o folk, ritmo que marcou sua trajetória familiar

Por Thiago Gelli Atualizado em 4 jun 2024, 10h20 - Publicado em 2 jul 2023, 08h00

Em 2002, o canadense Rufus Wain­wright recebeu uma ligação de Elton John. O pianista britânico sabia que o pupilo e amigo passava por problemas similares aos seus no passado: a dependência química, a ânsia por sucesso e o deslocamento sentido nos Estados Unidos. Ao ser atendido, Elton ofereceu um conselho que mudou a vida do colega: “Vá para a reabilitação”. Em entrevista a VEJA, Rufus cita a saúde de hoje como seu maior orgulho, mas frisa que sua vida é movida por outro prazer: “Escrever óperas é muito divertido”. Aos 49 anos, ele acumula mais de dez discos lançados, duas óperas — Prima Donna e Hadrian — e trilhas para o cinema — incluindo Moulin Rouge e Shrek. Após se livrar do vício, lançou dois álbuns de sucesso, Want One e Want Two, que o fizeram receber o elogio máximo de seu ídolo e salvador em 2004: Elton proclamou Rufus como o “melhor compositor vivo”. Agora, no disco e na turnê Folkocracy, celebra o ritmo que marcou sua trajetória familiar. Mesmo no folk, porém, não dispensa a energia cênica grandiosa — e dramática.

FOLKOCRACY

Frequentemente coberto de echarpes, Rufus deu seus primeiros passos de dândi aos 13 anos, quando “se assumiu gay para si”. A descoberta o levou a uma educação clássica: leu Jean Cocteau e Oscar Wilde, admirou os concertos de Tchaikovsky, se apaixonou pelos sonetos de Shakespeare e se viu em Judy Garland, por quem eternizaria seu amor mais tarde ao gravar Rufus Does Judy At Carnegie Hall. Na sequência, se afeiçoou à cena underground dos anos 1990, e com ela adquiriu a persona provocativa que o solidificou como um “segredo escondido”, como diz. Hoje, ele despreza a nostalgia excessiva por aquela época, mas não renega suas influências: espera que a geração atual possa descobrir os filmes de Jim Jarmusch e cantoras de rock que “contrariavam o sistema”, como Courtney Love e Shirley Manson.

Ao analisar a indústria da música do presente, ele lamenta a decadência das letras e a exigência de “representatividade positiva” na mídia. Exaspera-se, sobretudo, com o crescente conservadorismo nos Estados Unidos, e está disposto a deixar as diferenças de lado para se unir à comunidade LGBTQIA+ “nas trincheiras” pela afirmação de seus direitos: “Antes, diria que o Mês do Orgulho é um pouco comercial demais”.

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Rufus Does Judy At Capitol Studios

Parte da preocupação vem de casa: enquanto leis homofóbicas surgem em estados americanos como a Flórida, ele forma uma perfeita família não tradicional. É pai de Viva, pré-adolescente que cria junto com o marido, Jörn Weisbrodt, e a amiga Lorca, filha do grande Leonard Cohen (1934-2016). O lado família do cantor se completa com a reverência aos próprios genitores: primogênito de dois músicos consagrados do folk, Loudon Wainwright e Kate McGarrigle, ele homenageia suas raízes no belo Folkocracy.

Sua relação com a mãe marca suas lembranças do Brasil, onde tocou em 2008 e 2013. Fã de Tim Maia, Astrud Gilberto e Villa-­Lobos, ele trouxe Kate em sua primeira visita ao país, e assim proporcionou a última viagem da mãe, morta em 2010. “Quando voltamos para casa, ela sentiu que havia vivido algo profundo”, diz. Encantado pela “outra dimensão” sonora nacional, promete voltar em breve. Será impossível não notar o brilho do dândi por aqui.

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Publicado em VEJA de 5 de Julho de 2023, edição nº 2848

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