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Produtor de peça de ‘Harry Potter’ quebra silêncio a VEJA após cancelamento

Vinícius Munhoz traria 'A Criança Amaldiçoada' para São Paulo, mas produção teve fim brusco após complicações nos bastidores

Por Thiago Gelli Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 5 Maio 2025, 14h22 - Publicado em 5 Maio 2025, 13h23

No dia 25 de março, atores esperançosos e fãs da saga Harry Potter foram surpreendidos por uma notícia negativa: após três meses de antecipação e semanas de audições, a peça A Criança Amaldiçoada não seria mais realizada em São Paulo. Escrita por J. K. Rowling no original, a continuação da franquia foi primeiro lançada em 2016 na Inglaterra, teve seu texto publicado como livro e foi apresentada em mais cinco países. Uma rara superprodução de prosa, em vez de musical, a peça contemplava o sonho de vários profissionais e prometia ser um arrasa-quarteirão, com dois anos em cartaz e sessões de terça a domingo, além da cenografia e dos efeitos complexos exigidos pelo material. O orçamento necessário era vasto e, para captá-lo, a produtora Vinícius Munhoz Entretenimento precisava de patrocinadores numerosos — desafio que logo se provou grande demais. O cancelamento brusco foi confirmado por e-mail da produtora, mas ainda deixou várias perguntas no ar e provocou incerteza quanto ao pagamento entre profissionais que trabalharam na pré-produção. Um mês depois, o produtor Vinícius Munhoz quebra seu silêncio em entrevista a VEJA, faz mea culpa e esclarece os percalços dos bastidores ao mesmo tempo em que se mostra animado com o futuro da empresa:

O comunicado da empresa alega que as negociações com a produtora inglesa Sonia Friedman ocorriam há quase dez anos. Qual atrito rompeu a parceria? Não houve atrito, continuamos nos falando e a relação entre produtoras é boa. Eu sou um potterhead (como se chamam os fãs da saga) e, quando a peça estreou em 2016, se tornou meu objetivo de vida viabilizar a produção brasileira. Negociar isso não seria tarefa fácil e demorou tanto porque o projeto é planejado para acontecer ordenadamente em determinados países, logo só poderíamos recebê-lo aqui em 2025. Antes passou por Tóquio, pela Alemanha e mais nações. O trabalho de realizar teatro e teatro musical no Brasil demanda uma pré-produção longuíssima. Para tirar Matilda do papel, como fiz em 2023, também precisei de dez anos de negociações, com início das conversas em 2013. Para fazer Harry Potter, tivemos que alinhar a agenda de 68 profissionais internacionais que precisavam chegar aqui em data determinada. Toda essa logística exigiu tempo e acho que ficou claro que o projeto tinha meu apreço e carinho. Diria que sou uma das pessoas mais frustradas pelo fato de não realizá-lo esse ano, mas produzir e empreender no Brasil envolve acertos e erros. Posso citar alguns exemplos que passaram pela minha mão e não chegaram aos palcos, como Mary Poppins, Anything Goes e a primeira tentativa de trazer A Pequena Sereia para o Brasil. Menos de 30% dos projetos que solicitam recursos da Lei Rouanet chegam a acontecer.

No caso de Harry Potter, qual foi o elemento chave para o cancelamento? Essa peça já passou por nações com economias muito estabelecidas e câmbio forte. O Brasil é um mercado emergente e, portanto, precisaríamos obrigatoriamente de patrocínio, premissa que foi aprovada a partir do momento zero junto aos detentores de direito. Como produtor ouço mais não do que sim. Devo ter falado com mais de cem empresas sobre financiamento do espetáculo. Cheguei a confirmar pelo menos seis marcas de cotas menores para o projeto, mas dependíamos de um patrocínio máster, de uma marca que apresentasse a peça. No final de janeiro, recebemos uma formalização de que eles não avançaram no projeto. Tudo que fizemos antes — o processo de audição e o anúncio do espetáculo, por exemplo, partiu de recurso próprio, dinheiro que guardei na minha vida. Não captamos o investimento em tempo hábil, mas não tenho dúvida de que Harry Potter tenha chances de acontecer no Brasil futuramente. Somos o terceiro mercado que mais consome a franquia.

O projeto inauguraria a VME Entretenimento em grande estilo, com orçamento de 200 milhões, dois anos em cartaz no Teatro Renault e apresentações de terça a domingo. O que motivava a ambição? Olha, eu não seria o primeiro a realizar esse feito no Brasil. Comecei minha carreira em 2013 trabalhando em O Rei Leão, que ficou em cartaz por dois anos. Em 2025, acho que Harry Potter seria um novo marco. Fizemos uma pesquisa de mercado junto aos patrocinadores para entender a penetração da saga no país e entendemos que o volume previsto se encaixava nesta proposta. Nós tínhamos o direito de exclusividade na América Latina, então também tínhamos planos de comunicação com outros países para que fãs viessem ao Brasil assistir à peça. O mercado brasileiro chegou num lugar adulto, no sentido de que crescemos dos anos 2000 para cá, desde Os Miseráveis e Fantasma da Ópera. Podemos chamar esse nicho de indústria.

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O cancelamento foi mais surpreendente por conta do início das audições. É procedimento padrão iniciar o projeto em meio ao processo de captação de recursos? É um modelo quase inerente ao meio. É impossível garantir 100% dos recursos para que a gente comece a pré-produção de um espetáculo. Em todos que realizei — e foram mais de doze — iniciamos sem que todos os recursos estivessem captados. O primeiro motivo é que dificilmente uma produção já começa com os recursos em mãos e a bilheteria é necessária para completar o cálculo. O segundo é que, a partir do momento que tenho qualquer contrato de patrocínio, o projeto já está acontecendo. Além disso, alguns direitos são cedidos por período determinado. Estou desde 2016 conversando sobre colocar o projeto em cartaz em 2025. Ele nunca foi postergado, nem com a pandemia. Não adianta falar para você que Harry não estreia agora, mas vem em 2026. Não vai. Eles já anunciaram que vão para Amsterdã ano que vem, assim como para outro país em 2027 e outro em 2028. É uma escala muito difícil, se você não faz esse movimento em conjunto, acaba sem conseguir realizar o necessário dentro do período estipulado.

Outra reclamação foi de atraso de pagamentos para funcionários envolvidos na pré-produção. O que provocou esse descompasso? Foram poucos casos, mas houve atraso nos pagamentos sim. Hoje, todos estão regularizados. Não imaginei que Harry Potter seria interrompido após o processo de audição, então a empresa como um todo teve que reaver a rota. Na hora que ouvi sobre os registros no Sated (Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões), no começo de abril, liguei para meus contatos de lá e perguntei quem eram, porque nunca recebi uma notificação formal de denúncia. Falaram que nunca receberam denúncias formais, apenas contatos de profissionais que informaram a falta de uma data prevista de pagamento. No fim, não se passaram mais de 15 dias entre o final do processo e a quitação de dívidas. Foi uma falha de comunicação interna e, nessas duas semanas, pessoas ficaram confusas tentando descobrir quando receberiam.

De onde partiu a decisão de abrir sua própria produtora? Sempre quis ter meu próprio cantinho pra desenvolver outras coisas, não só teatro musical. Eu sempre quis fazer a gestão de equipamentos culturais, por exemplo, e na época não conseguia. Agora, inclusive, estou tendo essa conversa com você dentro do Teatro Multiplan, que é uma gestão nossa, um teatro de 300 lugares dentro do Shopping Morumbi.

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Como é sua relação com o meio? Tenho porta aberta com 99,9% dos detentores de direitos fora do Brasil. Todos eles receberam a notícia com muita felicidade, já que agora contam com mais uma possibilidade na hora de licenciar produções originadas na Broadway ou no West End, em Londres. Quero também desenvolver conteúdo original brasileiro — hoje, temos dois autores comissionados dentro da VME para a criação de peças baseadas em propriedades intelectuais nacionais. Não é novidade a ideia de criar peças fora do eixo anglófono que depois são exportadas, já aconteceu na Espanha. Costumo brincar que tenho problemas mentais, no sentido de gostar muito do que faço e ser muito ambicioso. Nosso objetivo é realmente mostrar do que o Brasil é capaz.

Quais serão os próximos passos da VME? Em breve, vamos iniciar uma programação musical intimista por aqui. Além disso, trabalhamos com ilusionismo e estamos fazendo turnê pelo Brasil com a dupla Henry & Klauss, que vai passar por oito capitais. Aqui, no foyer do teatro, também teremos shows de drag queens às noites de segunda-feira. O espaço vai se transformar em um clube de comédia para destacar o trabalho das drags. Obviamente, também vou continuar fazendo teatro musical. Temos planos em desenvolvimento que vão até 2030.

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