Poeta Louise Glück conquista o Nobel de Literatura em 2020
Americana de 77 anos foi eleita como uma 'voz poética inconfundível' pela Academia Sueca
A poeta americana Louise Glück conquistou o Nobel de Literatura em 2020. O anúncio foi feito pela Academia Sueca, responsável pela honraria, na manhã desta quinta-feira, 8. Segundo a Academia, Louise é uma “voz poética inconfundível que com sua bela concisão faz da existência individual algo universal”.
O prêmio será entregue direto à vencedora e não na tradicional cerimônia em Estocolmo, que normalmente acontece no fim do ano, por causa da pandemia. Ela será convidada para uma homenagem na cerimônia do ano que vem.
Nascida em Nova York, em 1943, filha de uma família de imigrantes húngaros de origem judaica, Louise Glück começou a carreira em 1968, com o lançamento da primeira de doze coletâneas de poesias, Firstborn. Desde então, tem sido aclamada como uma relevante voz da literatura atual, sendo premiada com o Pulitzer Prize (1993) e o National Book Award (2014). Além de poetisa, Louise é uma prestigiada ensaísta e professora de literatura na Universidade de Yale. Em sua obra, ela escreve especialmente sobre relações familiares, muitas vezes sob a ótica ou influência de mitos clássicos gregos e romanos, e a partir de um fundo autobiográfico.
Leia abaixo dois poemas de Louise Glück, traduzidos para o português pelo professor, autor e tradutor Pedro Gonzaga:
O dilema de Telêmaco
Nunca consigo decidir
o que escrever
nas lápides de meus pais. Sei
o que ele quer: ele quer
amado, o que por certo
vai direto ao ponto, particularmente
se contarmos todas
as mulheres. Mas
isso deixa minha mãe
a descoberto. Ela me diz
que isto não lhe importa
para nada; ela prefere
ser representada por
suas próprias conquistas. Parece
pura falta de tato lembrar aos dois
que alguém não
honra aos mortos perpetuando
suas vaidades, suas
projeções sobre si mesmos.
Meu próprio gosto dita
precisão sem
tagarelice; eles são
meus pais, consequentemente
eu os vejo juntos,
às vezes inclinado a
marido e mulher, outras a
forças opostas.
Ítaca
O ser amado não
precisa viver. O ser amado
vive na cabeça. O tear
é para os pretendentes, suspenso
como uma harpa de brancos filamentos.
Ele era duas pessoas.
Era corpo e voz, o fácil
magnetismo de um homem vivo, e então
o sonho revelado ou a imagem
formada pela mulher manejando o tear,
ali sentada num salão cheio
de homens de mentes literais.
Se te causa pena
o mar enganado que tentou
levá-lo para sempre
e devolveu apenas o primeiro,
o verdadeiro marido, deverias
sentir pena desses homens: eles não sabem
para o que estão olhando;
eles não sabem que quando alguém ama dessa maneira
o manto se torna um vestido de casamento.
Após se envolver em um escândalo de assédio sexual em 2017, a Academia Sueca agora retorna à velha rotina. No ano passado, Olga Tokarczuk e Peter Handke foram anunciados juntos como vencedores do Nobel de Literatura. O austríaco venceu por 2019, enquanto a polonesa levou o prêmio pelo ano de 2018, quando a cerimônia foi cancelada. A pausa ocorreu em resposta ao caso do ano anterior, quando Jean-Claude Arnault, marido de Katarina Frostenson, escritora e membro da Academia, foi acusado de assédio sexual por 18 mulheres. Arnault foi condenado a dois anos de prisão por estupro.
Ao cancelar a entrega do prêmio, a instituição disse que perdeu a “confiança” no mundo exterior e que estava “enfraquecida”. A Academia declarou ainda que precisava de “tempo para recuperar sua força plena, envolver um número maior de membros ativos e restaurar a confiança nela antes de escolher um novo vencedor”.
As controvérsias, porém, continuaram. A escolha do premiado, Peter Handke, causou furor pelo passado do autor, acusado de ser um negacionista do genocídio da Guerra dos Balcãs, e defensor de Slobodan Milosevic, chamado de “Carniceiro dos Bálcãs”, tendo não só comparecido a seu julgamento em Haia como ido ao funeral dele, em 2006, para prestar homenagem.