Paula Toller a VEJA: ‘Falo de política, mas não sobre os políticos’
Ao lançar um DVD que celebra suas quatro décadas de carreira, a cantora critica polarização nas redes sociais e comenta a expectativa de se tornar avó
O lançamento de um DVD ao vivo, Amorosa, celebra suas quatro décadas de carreira. Imaginava atingir essa marca, aos 61 anos de idade? Chamo de aniversário de casamento com o público. É legal olhar para trás e saber que sempre coloquei a música como prioridade. Não fiz concessões aos modismos da indústria. É uma coisa para comemorar.
Que tipo de concessões evitou? O Kid Abelha chegou ao sucesso cedo e tivemos uma espécie de passaporte para fazer as coisas como gostávamos. Apesar disso, sofríamos pressão de todos os lados, de rádios e TVs. Se eu fosse atrás do que era sucesso, teria feito lambada e pagode. Eu sei qual é a minha praia e onde acertei, mesmo com altos e baixos.
Nos anos 1980, o Kid Abelha era uma das poucas bandas com uma mulher nos vocais. O rock era mais machista? Fomos muito criticados porque rock era coisa de homem, né? Como alguém tirava uma menina de casa para ir para a estrada? Mas naquela época havia um clima de entusiasmo. Com o fim da ditadura, a gente queria os brinquedos dos americanos: a guitarra elétrica e a democracia. De lá para cá, a sociedade avançou muito, mas ainda vivemos uma falta de diálogo terrível e toda essa polarização. Hoje, você só fala para o seu nicho. Acho muito triste.
Nos últimos anos, a esquerda e os bolsonaristas se alternaram nas críticas às suas posições. Também foi vítima da polarização? Sim, fui uma vítima dos dois lados. Estou em outra geometria social. Tenho amigos de todos os tipos. Não acredito em ficar batendo de frente com as pessoas, como se fosse de uma seita. Não tenho ídolo político. Sou pragmática. Falo de política, mas não sobre os políticos.
A descoberta de que tinha diabetes, em 2009, a levou a cuidar mais da saúde? Acho importantíssimo falar sobre isso e mostrar que, com bons controles dos índices de glicose, podemos ter uma vida praticamente normal. Para mim foi difícil, no começo, conciliar a vida desregrada da estrada com os cuidados. Tenho de seguir horários fixos para me alimentar, devido ao tratamento com insulina. As pessoas ao meu redor tiveram de entender isso. Hoje, sou dona do meu tempo. Tenho uma disciplina bem grande, quase como a de uma atleta. Todo dia faço alguma atividade física.
Seu filho, Gabriel, dirigiu seu novo show e, em breve, vai lhe dar sua primeira neta. Como é a relação com ele? Já tinha trabalhado com o Gabriel no clipe da música Eu Amo Brilhar, em que ele cantava e dirigia. Foi bom porque consegui separar a mãe da profissional. Como diretor, ele se impôs com sua tranquilidade. Sobre ser avó, é um momento de inspiração. É o relógio da vida passando. Meu filho vai ter uma filha. É uma sensação muito boa.
Publicado em VEJA de 2 de agosto de 2024, edição nº 2904