A Americanas entrou em recuperação judicial e, dentro do déficit de 20 bilhões de reais em seu balanço, criou um rombo assustador de 102,5 milhões de reais nos cofres de editoras e distribuidoras de livros. O número é de um levantamento exclusivo obtido por VEJA com fontes do mercado. Um pente fino na lista de credores divulgada pela Americanas mostra que 104 empresas correm o risco de sofrerem calote, com valores que variam de míseros 527 reais a exorbitantes 14,1 milhões de reais, como o caso da editora Somos Educação. Para o presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livro, Dante Cid, o cenário é desesperador pois os valores podem ser recebidos ou não em um cronograma de pagamentos que pode durar entre 10 e 15 anos. As empresas não devem ver o dinheiro da dívida tão cedo.
“Uma prática comum do mercado fazia com que as editoras dessem a mercadoria para Americanas e um prazo para receber os pagamentos conforme as revendas. Era uma dependência e expectativa de que houvesse o cumprimento desse compromisso. Daqui para frente, é provável que as editoras e distribuidoras só vendam livros para a Americanas mediante pagamento adiantado. Editoras que estavam para receber os lucros das vendas da Black Friday, promovida em novembro, caíram nesse limbo da recuperação judicial e não deve ver o valor tão cedo. Fomos informados de que o rombo ultrapassa os 100 milhões de reais, é um número muito chamativo”, explica Dante Cid a VEJA.
Marcial Conte Jr., editor-chefe da Citadel Editora, lamenta que a Americanas deva 2,3 milhões de reais à empresa e torce para que o empresário Jorge Paulo Lemann ajude a contornar a crise. “O Grupo Citadel sempre apostou na Americanas por acreditar na gestão de Lemann. Nós acreditamos que ele vá interceder pelas editoras, distribuidoras e fornecedores que dependem desse dinheiro. Nós honraremos o nosso compromisso com os autores, que vão receber todos os royalties, porque eles não têm culpa dessa situação trágica”, diz Conte à reportagem.
A crise da Americanas chega, ironicamente, em um momento em que as editoras pareciam se recuperar no período pós-pandemia. O retorno das aulas presenciais em universidades e escolas impulsionou a venda de livros didáticos, proporcionando um crescimento real de 2,54% em faturamento. Com o rombo, o prejuízo tem quase a mesma proporção. Ou seja, o mercado livreiro ficou sem lucro justamente quando as vendas foram aquecidas.