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Livro de Ziraldo é tirado de escolas de cidade mineira; entenda a polêmica

Livro com temática racial publicado na década de 1980 é mais um caso de obra acusada de ser inadequada por pais e responsáveis

Por Amanda Capuano Atualizado em 19 jun 2024, 18h44 - Publicado em 19 jun 2024, 18h42

O livro O Menino Marrom, de Ziraldo (1932-2024) , foi suspenso temporariamente do currículo escolar do município mineiro de Conselheiro Lafaiete depois de uma série de reclamações em relação ao seu conteúdo. “Levando em conta nosso respeito aos pais e à comunidade escolar, a Secretaria Municipal de Educação de Conselheiro Lafaiete, diante das diversas manifestações e, divergência de opiniões, procedeu a solicitação de suspensão temporária dos trabalhos realizados sobre o livro”, informou a prefeitura em comunicado, afirmando que a suspensão se deu “a fim de melhor readequação da abordagem pedagógica, evitando assim interpretações equivocadas”.

Publicado em 1986, o livro de Ziraldo é uma leitura corriqueira em escolas brasileiras há décadas e está dentro da faixa etária indicada. A obra conta a história de amizade entre dois garotos, um branco e um negro. Apesar das diferenças, a dupla desenvolve um laço profundo, descobrindo juntos o papel das cores, a própria identidade e os preconceitos do mundo. A relação é usada de fio condutor para discutir temáticas sociais de maneira lúdica. “Utilizando uma linguagem simples e ilustrações atraentes, Ziraldo consegue envolver as crianças e facilitar a compreensão de conceitos complexos como racismo e empatia. Ao abordar esses temas desde cedo, Menino Marrom ajuda a construir uma base sólida para o desenvolvimento de atitudes positivas e inclusivas nas novas gerações”, argumenta o comunicado da prefeitura.

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A reação negativa ao livro ganhou força no Whatsapp. Em um áudio que circulou por grupos da cidade, um pai argumenta que a obra de Ziraldo poderia induzir crianças a comportamentos inadequados. Nas redes sociais, uma docente da região, identificada apenas como professora Érica, disse que a situação foi gerada por pais que “pinçaram trechos do livro” sem contexto. Ela cita uma passagem em que uma senhora maltrata o menino negro quando ele tenta ajudá-la a atravessar a rua. Chateada, a criança acorda cedo nos dias seguintes para vê-la fazer o mesmo percurso, imaginando um possível atropelamento — situação considerada inadequada por alguns pais. “Crianças têm sentimentos, inclusive ruins. A leitura da obra dá a eles a oportunidade de entender e discutir esses sentimentos. Também demonstra que nem todos os adultos são de confiança. Que eles podem ser maltratados por alguém e vão precisar lidar com isso”, explica a pedagoga.

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Nos comentários da publicação da prefeitura, usuários cobram aulas de interpretação de texto para os pais, e lamentam a retirada da obra das escolas. “Não dá pra acreditar que, em 2024, estamos censurando Ziraldo!”, escreveu uma usuária no Instagram. “Triste tal decisão! Daqui a pouco estão queimando livro em praça pública”, escreveu outra. Houve, no entanto, quem concordou com a suspensão. “Peguem na biblioteca e leiam para os filhos de vocês. Não somos obrigados a engolir goela a baixo o que não queremos”, atestou um outro perfil.  Já a prefeitura, disse que é necessário um “momento de diálogo junto aos responsáveis para que não sejam estabelecidos pensamentos precipitados e depreciativos em relação às temáticas abordadas.”

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Outro livro censurado: O Avesso da Pele

Menino Marrom não é o primeiro caso de livros que foram limados das escolas por pressão dos responsáveis. Outro exemplo recente é o romance O Avesso da Pele, do escritor Jeferson Tenório, que foi recolhido de escolas do Paraná, Goiás e Mato Grosso do Sul há alguns meses. As secretarias de Educação desses estados alegam que a obra, vencedora do Prêmio Jabuti 2021 na categoria Romance Literário, apresenta linguagem imprópria para menores de 18 anos e conteúdo sexual. 

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Temas como identidade, relações raciais e negritude são abordados na trama, que acompanha Pedro, jovem negro que busca resgatar o passado da família após a morte prematura do pai, vítima de truculência policial. Entre as cenas reprovadas pelos estados que determinaram o recolhimento da obra está um trecho em que personagens usam palavrões para descrever órgãos genitais. Em outro momento da história, Pedro relata como perdeu a virgindade.

Em setembro de 2022, O Avesso da Pele foi selecionado para compor o Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), do Ministério da Educação (MEC). A decisão permite que escolas públicas entreguem a obra a estudantes do Ensino Médio, com idades entre 15 e 17 anos. O livro também é leitura obrigatória para o vestibular do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), instituição pública de ensino superior. 

Após a censura, o autor recorreu às redes sociais para compartilhar sua indignação: “As distorções e fake news são estratégias de uma extrema direita que promove a desinformação. O mais curioso é que as palavras de ‘baixo calão’ e os atos sexuais do livro causam mais incômodo do que o racismo, a violência policial e a morte de pessoas negras.”, afirmou Tenório em uma publicação no Instagram.

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