Johnny Hooker: “A arte me salvou”
Voz poderosa da nova MPB, o músico recifense de 33 anos diz que, embora a pandemia afete sua inspiração, conseguiu superar a depressão
A pandemia mudou seu processo criativo? A sensação de impotência, de não poder fazer nada, me consome. Quando tudo começou, estava gravando meu disco e precisei me desafiar para terminá-lo trabalhando em casa. Essa fase de medo, horror e luto atrapalha minha inspiração para compor. E impede o melhor da vida do artista, que é fazer shows. A catarse no palco é insubstituível.
Será que o público vai voltar aos shows, depois de tanto consumir entretenimento em casa? Estou confiante em que será uma explosão. Ninguém aguenta mais o isolamento. Os shows vão lotar de pessoas celebrando com dança, arte e emoção.
Como a indústria da música está passando por esta crise? A indústria sempre funcionou à base da produção em massa. Nós, artistas, somos cada vez mais cobrados. Mas como se pode trabalhar normalmente com todas essas mudanças? O mundo está muito doido em dizer “você não pode parar”. Pelo contrário, podemos e devemos respeitar nosso tempo para preservar a saúde mental.
Você sofreu depressão. Como se sente agora? Hoje me sinto muito bem. Gritar, cantar, escrever e produzir com certeza me ajudou a lidar com os meus demônios e curar minhas feridas. Eu reconheço a importância da medicina, mas o que me salvou mesmo foi a minha arte.
Também reclamou de que as relações homossexuais são tão superficiais que nem sabe mais se gosta de homem. Não sabe mesmo? Eu falei em tom de brincadeira. Mas vejo o machismo e o patriarcado presentes em muitas relações. Procuro identificar essa “opressão masculina” para diluí-la e combatê-la. Agora, o que é masculino e é feminino? A gente quer gostar de tudo e ser livre.
Em tempos difíceis, os aplicativos de relacionamento são uma válvula de escape? Amo esses aplicativos. Foi uma libertação poder me aventurar nesse grande labirinto de pessoas. As novas maneiras de se relacionar são uma forma de remar na direção contrária à das normas existentes.
Já viveu uma relação abusiva? Sim. É uma situação extremamente complexa e você não consegue notar que está dentro dela. Eu vivi a violência verbal e psicológica e a humilhação frequente.
Publicado em VEJA de 19 de maio de 2021, edição nº 2738