‘House of Cards’: após crise, última temporada pode redimir a série
Abatido por problemas de enredo e pela demissão de Kevin Spacey por acusações de assédio, seriado lança seus oito episódios finais nesta sexta
Os últimos tempos não foram nada fáceis para a equipe de House of Cards, a primeira série original da Netflix. Lançada em 2013 com pompa, assinada pela grife David Fincher e protagonizada por um nome forte de Hollywood, a produção foi se tornando cada vez mais irregular. Na quinta temporada, de 2017, esticou arcos narrativos desnecessariamente, inventou tramoias esdrúxulas, e, basicamente, perdeu a graça. Como o que está ruim sempre pode piorar, a série se viu no olho do furacão que varreu Hollywood no ano passado, quando sua maior estrela, Kevin Spacey, foi acusada por dezenas de jovens de assédio sexual. Spacey foi demitido e House of Cards renovada para uma última temporada com oito episódios, tendo Robin Wright como protagonista – Claire Underwood, afinal, teria seu tão sonhado voo solo. E os primeiros episódios da nova temporada, que chegou ao serviço de streaming nesta sexta-feira, permitem dizer: ainda há salvação.
O início da temporada – a Netflix disponibilizou antecipadamente os cinco primeiros episódios à imprensa – demora um tanto a engatar, principalmente porque precisa lidar com a ausência de Frank Underwood (Spacey). O roteiro parte da trama que finaliza a quinta fase, que mostra o político renunciando e Claire, sua vice, assumindo a Presidência. O que se desenhava ali para o ano seguinte era um possível embate entre Frank e Claire, o que não aconteceu por causa do escândalo da vida real. Com a demissão de Spacey, a solução encontrada pela equipe da série para explicar o sumiço repentino do personagem, como mostrado no trailer, foi a morte. A presença de Frank, porém, ainda é forte: o tempo todo fala-se dele, principalmente porque antes de morrer ele fez acordos e promessas que agora serão cobradas de Claire, e de como ele poderia ter morrido – é um mistério, e sua mulher jura acreditar que ele foi assassinado. Ele não está, mas está ali.
Para ocupar o lugar deixado por Frank como força opositora a Claire, surge uma poderosa família americana cujos negócios se estendem pelos mais diversos setores e que passa a cobrar que a presidente honre os compromissos firmados com eles pelo seu marido. Os irmãos Bill (Greg Kinear) e Annette Shephard (Diane Lane), além do filho dela, Duncan (Cody Fern), trazem um ar de renovação ao seriado – e os momentos em que as duas mulheres aparecem juntas, meio amigas, meio rivais, são alguns dos melhores. Já a insistência em tramas com velhos conhecidos, como Doug Stamper (Michael Kelly) e Seth Grayson (Derek Cecil), desvaloriza a série: são personagens que não têm muita função depois da morte de Frank.
Em especial nos três primeiros episódios da nova leva, Claire tenta se livrar do fantasma de Frank – enquanto House of Cards se esforça para exorcizar o espírito modorrento que a tomou na quinta temporada. Quando consegue, volta a oferecer um vislumbre do que eram os bons tempos da trama, quando o casal Underwood era puro entretenimento ao fazer as coisas mais absurdas para se manter no poder. Robin Wright, que sempre entregou uma performance exemplar, supera as expectativas, apresentado uma Claire cada vez mais assustadora – e divertida de se ver.
House of Cards marcou a história da televisão, abrindo o caminho para produções de qualidade no streaming e consolidando a ideia de maratona. Por um tempo, foi uma das produções mais relevantes da TV, até que se atrapalhou em seu próprio enredo e, quando enfrentou a crise Kevin Spacey, perigou ser cancelada de vez, sem a oportunidade de encerrar a história como planejado. Agora que ganhou essa sexta temporada, dá indícios de que se esforçou para oferecer um final digno para os fãs.