George Steiner: a literatura perde um gigante
Crítico literário morreu na segunda-feira 3, aos 90 anos, em Cambridge, na Inglaterra

É difícil imaginar, hoje, que um crítico literário seja capaz de lotar eventos com suas conferências, manter longas listas de espera para seus cursos e ser o tempo todo convidado para escrever em jornais e revistas, além de falar no rádio e na televisão — muito menos que possa atrair tanto interesse discorrendo sobre temas eruditos como a tragédia grega ou as marcas do Holocausto na cultura. Para inveja dos rivais que nunca conseguiram furar a bolha da academia, George Steiner foi exatamente esse tipo de crítico durante mais de seis décadas de enorme sucesso. Era fluente em muitos idiomas (francês, alemão, inglês e italiano mais grego e latim), o que foi facilitado por sua criação familiar: ele nasceu em Paris, filho de judeus de origem alemã, e a família sobreviveu ao genocídio nazista emigrando para os Estados Unidos. Steiner conhecia as literaturas de todas essas línguas como poucos e foi um ardoroso defensor dos grandes clássicos em tempos de triunfo da correção política e da vulgarização comercial.
Para Steiner, a crítica literária era a tarefa de um “mensageiro apaixonado”: o amor pela obra literária deve fazer com que o crítico queira levar a mensagem dos grandes livros para os leitores. Seu trabalho deve ser realizado com paixão. Sua inteligência está a serviço de fazer o leitor se envolver com os livros, “habitar a obra de arte”, como o crítico a habita. Para isso, o crítico deve iluminar, esclarecer a respeito de cada obra analisada. História e filosofia, religião e gramática — todos os saberes estão a serviço dessa sagrada missão. Steiner fez isso não apenas em prestigiosas universidades, como Cambridge, Oxford e Harvard, mas também nas páginas de revistas como a New Yorker, na qual escreveu por trinta anos. Sua obra de mais de cinquenta títulos inclui trabalhos incontornáveis como A Morte da Tragédia e o cativante Lições dos Mestres. Steiner foi o último grande crítico literário no sentido clássico do termo. Ele morreu na segunda-feira 3, aos 90 anos, em Cambridge, na Inglaterra.
Publicado em VEJA de 12 de fevereiro de 2020, edição nº 2673