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Disney produzirá filmes e séries no Brasil

Em entrevista a VEJA, Diego Lerner, presidente do grupo para a América Latina, dá detalhes sobre o lançamento da plataforma de streaming Disney+

Por Ernesto Neves Atualizado em 10 out 2020, 09h05 - Publicado em 8 out 2020, 17h02

Grande aposta da Disney para o mercado de streaming, o Disney+ chega ao Brasil no dia 17 de novembro. Mesmo diante da atual variedade de plataformas, a gigante americana garante que vai atrair assinantes ao disponibilizar exclusivamente suas produções, assim como de outras marcas pertencentes ao grupo, como Marvel, Pixar, Star Wars e National Geographic.

Em conversa com VEJA, Diego Lerner, presidente do grupo para a América Latina, conta que a Disney fará filmes e séries no Brasil, com atores e diretores locais. “O Brasil é um dos 10 mercados mais importantes do mundo”, afirma. Sobre um antigo sonho dos brasileiros, diz: não está descartado um parque temático na América Latina.

O Disney+ estreia no Brasil em 17 de novembro. Os brasileiros já têm à disposição uma série de plataformas de streaming como Globoplay, Netflix e Amazon Prime. Como vocês pretendem demarcar o território num mercado tão bem servido?

O Brasil é o principal mercado da América Latina e avança velozmente porque os brasileiros são ávidos pela oferta digital. Isso é visível no sucesso que as plataformas vêm tendo aqui. Mas, com muito respeito aos concorrentes, nossa proposta não é comparável. Existe uma distinção com relação às outras das marcas. Ninguém, por exemplo, usaria uma camisa estampada por essas outras plataformas. A Disney tem uma conexão emocional inigualável com o consumidor. Isso se soma ao conteúdo diferenciado. Só será possível ter acesso ao conteúdo Disney, Marvel, Pixar, Star Wars e National Geographic através do Disney+. E, de forma reduzida, no Disney Channel. Não haverá mais a opção de aluguel on-line. 

Vivemos um momento de crise. O preço do Disney+ será competitivo?

Cobraremos em moeda local, não em dólar. Vamos estar na faixa de menor preço do Netflix (atualmente R$ 21,90), porque queremos uma penetração massiva no Brasil. 

Vai ter conteúdo feito sob medida para brasileiros?

Claro que sim. Teremos conteúdos para brasileiros feitos por atores e diretores daqui. Haverá investimento em séries e filmes. O streaming permite que tenhamos essa diversificação. É uma experiência mais rica que a da TV, permitindo oferecer opções como clássicos, filmes em espanhol, filmes de arte. Aliás, tudo que estiver em exibição no Disney+ do resto do mundo ficará disponível no Brasil também. 

O investimento no streaming do Brasil é comparável ao de que outros países em que vocês estão entrando? 

O Brasil está entre os 10 principais mercados para a Disney. Logo, o investimento será proporcional ao seu tamanho e importância.  

O que você está dizendo é que há uma aposta nessas grifes. Há pesquisas que demonstrem essa preferência? 

Essa é a estratégia da Disney em toda sua vida. Sempre focamos no conteúdo e não na sua distribuição. Quando a companhia investiu na compra de Star Wars, Marvel e Pixar, fizemos porque eram produtos de muita força, com absoluta conexão com o público. 

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Porque a Disney considera o Brasil um de seus mais importantes mercados? 

Primeiro porque o brasileiro tem uma alta adesão à tecnologia. O entusiasmo de vocês é impressionante. Segundo porque há uma clara diminuição da indústria de TV paga no mercado nacional, como consequência da migração de consumidores para as ofertas digitais. 

Por ano, quase 1 milhão de brasileiros visitam os parques da Flórida. Essa relação de encantamento ajuda no lançamento do Disney+?

Nos países mais desenvolvidos, a Disney é uma marca de entretenimento familiar infantil. Mas, na América Latina, e particularmente no Brasil, ocorre um fenômeno interessante. Aqui, a Disney é percebida como uma utopia, um mundo ideal. É uma válvula de escape à loucura em que vivemos, com economia em crise, violência urbana. Ou seja, a complicada situação socioeconômica da América Latina dá à Disney um peso extra.

A pandemia deu um empurrão no streaming?

Claro, mas é uma situação temporária. Acho que estamos aprendendo sobre o consumo das famílias como nunca antes. E há lições que vão ficar, mesmo quando houver uma vacina. Com o aperto na economia, o brasileiro está seletivo nos gastos em entretenimento. A TV a cabo, por exemplo, vem sofrendo muito. Você paga caro por um serviço que oferece mais de 100 canais. E na verdade assiste a no máximo 10. Esse tipo de produto será cada vez mais questionado. Isso deve desencadear uma competição saudável na indústria. 

Existe algum serviço que vocês consideram o principal concorrente da Disney+?

Não estou desmerecendo os outros concorrentes, mas não posso colocar nossos produtos no mesmo nível. Netflix e Amazon Prime criaram um hábito de consumo digital com personalidades próprias. Mas, se você vai ao Netflix, procura por filmes e séries, não pela marca em si. É diferente do nosso caso. 

O investimento no streaming pode afetar outros negócios da Disney, como o cinema e a TV a cabo. Bob Iger, ex-presidente do grupo, contou que precisou enfrentar resistências internas a essas mudanças. Onde reside a convicção que o streaming vai funcionar?

Não é uma intenção da companhia eliminar outras experiências, mas sim criar uma nova.  Ninguém pode questionar a realidade que estamos vivendo: há uma convergência digital que veio para ficar. Quando Bob Iger decidiu criar uma plataforma para concentrar todo o nosso conteúdo, isso foi bem aceito internamente. Porque temos a convicção do nosso valor de marca. Não é por acaso que tenhamos chegado a 60 milhões de inscritos no Disney+ em apenas 11 meses. 

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A atriz Yifei Liu no filme ‘Mulan’ (//Divulgação)

O lançamento de ‘Mulan’ diretamente no streaming irritou os cinemas. 

Nossos filmes vão estar disponíveis no cinema e no Disney+. Serão duas janelas para ver nossas produções. Cremos que a atitude de ir ao cinema vai continuar, é uma vivência social. Há quem prefira ir ao cinema pela experiência, há a tela gigante. E há quem deseje ficar em casa. Há público para tudo. A Disney não quer matar o cinema. Mas há uma situação de convergência tecnológica e precisamos ser pragmáticos. Creio que as duas formas de consumo vão conviver daqui para frente. 

Mas não dá para negar que o streaming compete com o cinema.

Assim como aconteceu quando foi lançado o DVD. A pessoa podia esperar ser lançado nas locadoras e alugar. Não houve, porém, a canibalização como se esperava. Você não pode proteger uma indústria somente por decisão individual. Especialmente numa região como a América Latina, onde o consumidor é mais criterioso na hora de gastar seu dinheiro. Acho que o cinema mundial será transformado. Talvez fique mais segmentado e haja mudança na quantidade de dias em que o filme fica em cartaz. 

No exterior, os assinantes do Disney+ pagaram uma taxa extra para assistir ao filme ‘Mulan’. Como será no Brasil?

Mulan estreia no Brasil dia 4 de dezembro e não haverá qualquer taxa extra aqui.

‘Mulan’ recebeu críticas por ter sido gravado na província de Xinjiang, na China. Foi um erro rodar um filme numa região em que há supressão de etnias? Procede a notícia que autoridades chinesas foram consultadas em relação a trama e elenco?

A Disney nunca irá editorializar uma produção, dando espaço para a intromissão de governos. Não entramos na política de nenhum país. Fazemos contos sobre valores, não sobre política ou situações controvertidas. ‘Mulan’ foi praticamente toda produzida na Nova Zelândia. Para recriar certos ambientes, também se filmou em cerca de 20 povoados chineses. Quando você filma na China, precisa de autorização das autoridades locais. Isso foi tudo o que aconteceu. Agradecemos à China assim como à Nova Zelândia

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Seguindo no assunto política, a Disney se posiciona a favor de bandeiras progressistas. Como a empresa lida com a onda conservadora? 

Não nos definimos como progressistas ou conservadores. Exibimos valores poderosos, que precisam estar presentes em todas as nossas atividades. Na maneira como nos expressamos publicamente, na diversidade, na inclusão de todas as minorias. É uma atitude aberta à realidade do mundo em que vivemos. 

Quando vocês entram num país como o Brasil, que neste momento está num viés mais conservador, isso de alguma forma faz vocês repensarem planos? Ou é uma decisão puramente econômica?

Sempre que a Disney precisou negociar seus princípios preferiu ficar fora daquele mercado. Aliás, posso dizer que isso nunca aconteceu em nenhum país da América Latina. 

Na última semana, o grupo anunciou a demissão de 28.000 pessoas. Há previsão de mais cortes? 

É um momento muito difícil, de crise mundial. A empresa tem 50% dos seus negócios completamente paralisados, incluindo cinemas, parques, shows. Estamos tentando enfrentar a situação com muita sensibilidade. Na América Latina, por exemplo, não vamos fazer nenhum corte de emprego. Vamos reduzir custos sem demissões.

Uma grande curiosidade dos brasileiros é saber se existe algum plano de construir parques por aqui. É um sonho possível? 

Dentro da empresa sempre se fala sobre essa a oportunidade de construir um parque temático em algum lugar da América Latina. Por enquanto, posso dizer que não há planos concretos. 

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Mas é uma conversa que não terminou?

É uma conversa que continua na mesa de discussões.

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