
São raros os intérpretes que, para além de representarem seu tempo, como símbolos incontornáveis, antecipam uma onda — foi o caso de Elvis Presley, no fim dos anos 1950, e dos Beatles, em meados dos anos 1960. Até mesmo Frank Sinatra, em uma de suas reencarnações, nos anos 1970, exageradamente meloso, pavimentou o que viria. Ainda mais escassos são os artistas capazes de inaugurar modismos mudando de estilo. A inglesa radicada nos Estados Unidos Olivia Newton-John foi dessa estirpe. Revelada ao mundo por meio das canções country, ela explodiria em 1978 de mãos dadas com o gênero rockabilly em Grease — Nos Tempos da Brilhantina, filme que muita gente finge não gostar. Em 1981, ano em que Ronald Reagan tomou posse na Casa Branca, ela deu uma outra pirueta com o som disco de Physical, ao misturar pitadas de sexo com humor — como prólogo do que Madonna inventaria algum tempo depois.
Mas aquela moça angelical, de cabelos esvoaçantes, fonte inspiradora de adolescentes de um tempo sem redes sociais, como poderia soar provocante? Essa era a graça intuitiva de Newton-John, que avançava as casas arrastando multidões — chegou a vender 100 milhões de discos. Seus movimentos renovadores pareciam prestar homenagem ao avô paterno, o alemão Max Born, Nobel de Física em 1954 pelos avanços na área de interpretação das ondas. Desde 1992, ela lutava contra um câncer de mama metastático, que tratou com a ajuda de medicamentos derivados da Cannabis. Morreu aos 73 anos, em Santa Ynez Valley, na Califórnia, em 8 de agosto. “Minha querida Olivia, você fez as nossas vidas muito melhores. Seu impacto foi incrível. Eu a amo muito. Nos veremos no futuro e estaremos juntos de novo. Seu, do momento em que a vi e para sempre!”, postou um emocionado John Travolta, que assinou como Danny, seu personagem em Grease.
A moda como geometria

O japonês Issey Miyake não inventou a simplicidade, tampouco a elegância — mas para quem vestiu ou apenas viu suas criações a sensação é de que foi ele quem criou esses dois atributos indispensáveis à vida. Miyake foi o “mais matemático dos grandes estilistas”, na delicada definição de Marcelo Viana, diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada do Rio de Janeiro. Atrelado à geometria e simetria, seus modelos eram invariavelmente plissados, afeitos a se adaptar a qualquer tipo de corpo. Desenhava origamis para vestir (e que não amassavam). “O trabalho do design é fazer algo que funcione na vida real”, dizia. O genioso Steve Jobs, que entendia de limpeza de traços, sempre econômicos, pediu a Miyake que esboçasse algo que ele pudesse exibir nas celebradas apresentações da Apple. E, então, o suéter de gola alta preta virou um tótem, chique como ele só. O costureiro morreu na sexta-feira 5, de câncer no fígado, aos 84 anos. Em 2009, ele revelou ter nascido em Hiroshima — e, aos 7 anos, presenciou a explosão da bomba atômica. A discrição o fez manter o segredo.
Publicado em VEJA de 17 de agosto de 2022, edição nº 2802