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‘Brasília fala do coração’: a tocante exposição sobre Le Corbusier e o Brasil

Mostra em Paris conta como um dos grandes arquitetos do século XX marcou a mente criativa de modernistas e contemporâneos

Por Monica Weinberg, de Paris
Atualizado em 3 jun 2025, 17h49 - Publicado em 3 jun 2025, 10h50

Era 1936, e Le Corbusier (1887-1965), o arquiteto franco-suíço, andava à caça de um projeto que o permitisse tirar da prancheta os pilares modernistas que ele próprio concebeu. Foi aí que seu caminho cruzou com o de brasileiros que viriam a beber de sua fonte e, depois, alterar a paisagem do país de forma decisiva. À época, um jovem Lucio Costa havia sido encarregado de colocar de pé um prédio no Rio de Janeiro que se converteria no ministério da Educação e da Saúde na era Vargas, e resolveu convidar Corbu, como era chamado, para colocar ali todo o seu furor inovador, numa empreitada à qual se juntariam Oscar Niemeyer e Affonso Reidy, entre outros.

Pão de Açúcar_Le Corbusier
Le Corbusier com o Pão de Açúcar ao fundo: o mestre das linhas retas que tanto influenciou os brasileiros (Divulgação/Divulgação)
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O visitante da Maison La Roche, casa do punho do próprio Corbusier em Paris, mergulha nesta história com a ajuda de maquetes que mostram o que ele havia pensado para o o Edifício Capanema – uma construção bem mais baixa, de frente para a Baía de Guanabara – e o resultado final, após muitos ajustes à realidade, feitos pelos brasileiros e plantado no Centro.

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Está aí o começo de um percurso muito maior da exposição O Brasil depois de Le Corbusier, que se expande pelas paredes da casa meio escondida em um abastado canto da cidade, com artistas contemporâneos brasileiros que, cada qual a seu jeito, depreenderam algo das criações do arquiteto de gênio forte. Faz parte do circuito que se espalha agora pela cena parisiense sob o impulso do ano Brasil-França, cujo braço francês estreia em solo brasileiro em agosto.

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Maquetes do Edifício Capanema: o projeto de Corbusier acabou sendo adaptados por Costa e Nimeyer (à esq., a versão final) (Thomas Lannes/Divulgação)
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A exibição – a quarta edição da plataforma Aberto, que entrelaça arquitetura, design e arte em casas icônicas, todas até então no Brasil – já surpreende na entrada, onde um dos curadores, Filipe Assis, explica estarmos diante do primeiro projeto erguido por Le Corbusier a unir os cinco pontos definidores do que virou sua arquitetura. “Aqui ele fez os pilotis, a planta e a fachada livres, as longas janelas em fita e o terraço jardim no topo”, explica Filipe sobre o exemplar de linhas retas que destoa de tudo o mais que se vê em volta e abriga a fundação com o vasto acervo sobre a obra de Corbu.

TEM CONTEMPORÂNEO NA ÁREA   

Na estrutura de pé direito triplo e uma assimetria que faz o visitante não saber ao certo em que andar está, avistam-se obras variadas que, em alguma medida, visitaram o legado de Le Corbusier e dele fizeram uma leitura. Até no que foi a antiga cozinha há quadro para apreciar. Tendo sido projetada para um morador que muito valorizava as artes, o banqueiro suíço Raul La Roche, a casa oferece espaço de sobra para abrigar telas, esculturas e até uma marquesa de Niemeyer.

Logo de saída, avista-se Hotel Holiday, a tela de Luiz Zerbini que retrata um prédio em Recife guiado pela mesma bússola corbusiana – tentar fazer da arquitetura uma manivela para equacionar a questão das habitações sociais. Há ainda um festival de nobres nomes: Cicero Dias, Lygia Clark, Amilcar de Castro, Marilia Martins.

A colagem de Beatriz Milhazes repousa de um lado e a do mestre Corbu do outro. Numa sala mais adiante, banhados por luz intensa que transborda pela amplitude da janela, estão um quadro de Hélio Oiticica e uma escultura de Lygia Pape – ambos explorando os ângulos retos, de novo eles.

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Exposição que trata da relação do arquieteto Le Corbusier com o Brasil, na Maison La Roche, em Paris
Exposição: contemporâneos brasileiros também beberam da fonte do franco-suíço (Frederic Betsch/Divulgação)

“BRASÍLIA É MAGNÍFICA”

Por três vezes, Le Corbusier viajou ao Brasil e em todas elas fez circular ideias e um jeito de pensar as cidades. Em 1929, engatou em um circuito de conferências e traçou propostas para centros urbanos diversos, como o Rio de Janeiro, para onde imaginou um viaduto habitável rasgando a Zona Sul, com autopistas no topo, calçadas, praças e jardins verticais, tudo em doze níveis sobre pilotis. Fez muita gente torcer o nariz e, como se sabe, não vingou. Sobrou o desenho, exibido na Maison La Roche, uma prova do impulso de Corbusier de imprimir o seu olhar sobre o funcionamento das coisas. Nem sempre agradou.

O Capanema, divisor de águas na arquitetura moderna, que dali desaguou em Brasília, também trouxe o franco-suíço aos trópicos. Os laços com Lucio Costa e Niemeyer se estreitaram aí, mas chegou uma hora que Corbusier precisou voltar à França, deixando toda a adaptação do projeto nas mãos da turma brasileira.

O número de andares aumentou e os pilotis cresceram, virando algo diferente – metamorfose à qual as maquetes na exposição fazem jus. Com tudo já pronto, houve alguma aspereza em torno da autoria, o que Lucio Costa resolveu dizendo: “Corbusier é a raiz e o tronco do projeto”.

Autor deLucio Costa e Le Corbusier: Correspondência,o arquiteto e antropólogo Lauro Cavalcanti, curador convidado da mostra, resume a intensidade corbusiana: “Ele era do tipo que você pedia para projetar sua casa e ele fazia um plano para o quarteirão inteiro”, diz.

Da derradeira visita ao Brasil, Corbusier deixou uma carta em que eterniza as impressões que o país lhe deixou. Datada de 29 de dezembro de 1962, escreve: “O Brasil é um dos mais generosos e hospitaleiros lugares”. E segue refletindo sobre Brasília, que visitou: “É magnífica por sua inovação, sua coragem e seu otimismo. É o trabalho de dois companheiros de luta, Lucio Costa e Oscar Niemeyer.”

Sem arestas, só elogios, Corbu assim encerra: “Me permitam, amigos no Brasil, agradecê-los.”

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