Bárbara Paz: “Dirigir é ser um maestro”
Enquanto finaliza um documentário sobre as enchentes no Rio Grande do Sul, onde nasceu, a atriz e diretora se prepara para integrar o júri do Festival de Veneza
Você vai integrar no fim do mês o júri do Festival de Veneza. Qual sua relação com a mostra? É uma grande honra. Foi o primeiro festival do qual participei, para estrear meu também primeiro longa-metragem, Babenco, e ali se abriram para mim as portas do mundo da direção. Também apresentei lá o meu curta Ato, sobre a solidão. Aproveitei e fiz uma performance, cruzando o tapete vermelho com uma máscara acoplada a uma planta, respirando a floresta.
Você também presidirá a comissão que vai escolher o filme brasileiro candidato ao Oscar. Acha que o cinema daqui tem chance? O cinema brasileiro está fazendo filmes belíssimos, mas escolher o que vai competir não significa selecionar o melhor. A decisão envolve outros fatores e um dos mais cruciais é ser visto em todos os lugares do mundo. Ele precisa ter uma boa distribuição internacional.
Como está a produção de seu documentário sobre as enchentes no Rio Grande do Sul? Qual o diferencial dele? De fato, muita gente está fazendo seu filme, e quanto mais, melhor. Mas eu fiz um documento humano, mais intimista, sem tanto sensacionalismo. Senti que as vítimas estavam precisando de um abraço. No meio da tragédia, uma conversa íntima dá um acalento. Quando vai sair, não sei. Queria que fosse logo, mas ainda estou buscando parceiros e dinheiro para terminar.
O que a motivou a fazer a mudança de atriz para diretora? Uma coisa complementa a outra. Dirigir é ser um maestro — você vai reger a história, é o que você quer contar. Ser atriz é descansar de mim. A atriz caminha paralelamente, está descansando agora para eu poder contar outras histórias. A gente vive em um país em que essa transição é difícil. Estou fazendo meus trabalhos autorais, mas também quero ser convidada para fazer trabalhos de outras pessoas e ser remunerada pela minha direção e pelo meu olhar.
No ano passado você organizou uma exposição em que expôs as cicatrizes de um acidente ocorrido em 1992. O que a levou a reabrir essa ferida? Pela primeira vez, depois de tantos anos, consigo ver beleza nas minhas cicatrizes e transformei essa dor em uma costura linda. Carrego também muitas cicatrizes internas. Sou um vaso quebrado, muito remendado e com várias vidas dentro de uma.
Publicado em VEJA de 16 de agosto de 2024, edição nº 2906