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As armas químicas de cebolas e alhos

O que o alho e a cebola têm em comum com a pólvora? Muito. Eles são incendiários. Podem fazer mal e deliciar. O enxofre é o centro de seus poderes. E alhos e cebolas ajudaram a inspirar o trabalho de um químico que acaba de publicar um tratado saudando a mal-cheirosa, ainda que indispensável, família […]

Por The New York Times
9 jun 2010, 22h16
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  • O que o alho e a cebola têm em comum com a pólvora? Muito. Eles são incendiários. Podem fazer mal e deliciar. O enxofre é o centro de seus poderes. E alhos e cebolas ajudaram a inspirar o trabalho de um químico que acaba de publicar um tratado saudando a mal-cheirosa, ainda que indispensável, família allium.

    Eric Block foi fisgado pela química em meio a pirotecnias no porão e na garagem enquanto crescia em Forest Hills, no Queens, em Nova York. Na escola ele se tornou um nerd enquanto seus colegas Paul Simon e Art Grafunkel eram a epítome do cool. Ele descobriu o chamado da química do allium em seu Ph.D e, por mais de quatro décadas, trabalhou em muitos de seus detalhes na State University de Albany.

    O livro de Block, Garlic and Other Alliums: The Lore and the Science (em tradução livre, algo como Alho e Outros Allium: A Sabedoria e a Ciência), foi publicado este ano pela Royal Society de Química. Embora os detalhes químicos sejam de difícil compreensão para quem não é especialista, o livro foge do padrão técnico ao adotar um estilo de texto claro e divertido, com uma grande quantidade de referências culturais e belíssimas reproduções de imagens, entre elas trechos de tabletes cuneiformes sumérios, fotos de “Drácula”, cabeças ornamentais da flor de allium que lembram fogos de artifício, os domos de cebola das igrejas russas e o topo em forma de alho dos prédios de Gaudí em Barcelona.

    Sistema de defesa – Block também avaliou cuidadosamente as várias evidências da eficácia dos allium, do folclore à moderna medicina, e explica a química e como tratar o bafo de alho � sim, ele pode emanar das profundezas depois de um dia ou mais, e segundo Block, kiwi, berinjela, cogumelos ou salsinha podem ajudar a eliminar esse odor.

    Mais útil para a culinária, ele distribuiu os diferentes sabores de allium e como eles evoluíram na tábua de corte e no forno. E dá uma prévia intrigante dos novos allium que aparecem no horizonte.

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    “Ainda é assombroso para mim o que acontece quando você corta ou morde uma cebola ou um dente de alho”, diz Block. “Estas plantas são originárias de uma vizinhança difícil na Ásia Central, no norte do Afeganistão, e desenvolveram algumas armas químicas sérias para se defender.”

    O seu sistema de defesa, baseado no enxofre, dá aos allium seus sabores distintos. As plantas o liberam em seus tecidos quando são atacadas por mordidas, esmagadas ou cortadas. Os produtos químicos são altamente irritantes e desencorajam a maioria das criaturas de voltar para uma segunda tentativa. Eles matam micróbios, repelem insetos e danificam as células vermelhas de cães e gatos. Jamais alimente um pet com cebola ou alho.

    Allicin – Qualquer cozinheiro sabe que cortar allium libera químicos que ardem. O alho pode entrar nos olhos e boca mesmo se um dente for esfregado com o pé. Seu ingrediente ativo passa através da pele e pelo sangue. O contato prolongado com o alho pode criar bolhas e queimaduras na pele, como algumas fotos pouco agradáveis do livro documentam.

    Block explica que os allium possuem estoques químicos de enxofre diferentes para criar suas armas e, por isso, têm tamanha variedade de sabores. Os estoques em si são inertes, mas quando as camadas da planta são danificadas, enzimas nessas camadas rapidamente convertem os compostos de enxofre em moléculas reativas, e ardidas.

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    Os dentes de alho produzem um químico chamado allicin, responsável por seu forte aroma. É uma molécula relativamente grande e age principalmente ao contato direto à mordida, a versão do mundo das plantas para o combate corpo-a-corpo. O allium de folhas planas, conhecido como cebolinha, produz uma quantidade pequena de allicin. Mais que uma arma diferente, tem um aroma mais suave.

    Cebolas, chalotas (cebolinhas francesas) e cebollete compartilham um estoque químico especial e uma segunda enzima defensiva. Produzem uma molécula de enxofre pequena e leve o suficiente para lançar-se a partir do tecido danificado, voar pelo ar e atacar nossos olhos e narizes. Essa arma de longa distância é chamada de fator lacrimógeno porque enche os olhos de água.

    “O fator lacrimógeno é extremamente potente”, diz Block. “Apenas uma pequena quantidade que chega perto de seu rosto quando você corta cebolas é suficiente para fazê-lo chorar. Quando eu cheirei o composto puro, a dor foi insuportável, como se recebesse um soco no olho.”

    A mesma reação que faz os compostos de enxofre dos allium armas tão potentes também lhes dão vida curta. Eles começam a reagir imediatamente com outras moléculas nos tecidos da planta e pouco a pouco geram um sabor que é menos picante, mas também menos fresco, mais sulfuroso. O calor da cocção aumenta a velocidade destas e de outras reações, elimina em grande medida o sabor picante e permite aflorar a doçura do allium, misturada com aromas sulfurosos. O calor também destrói as enzimas dos tecidos, o que os torna ainda menos picantes.

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    Culinária – Esta química básica conduz a algumas linhas gerais para a culinária. Se você vai usar cebolas, alho ou cebolinha em um molho ou tempero, por exemplo, deve cortá-las apenas minutos antes de servir. Se já estiverem cortadas, pode enxaguar os pedacinhos picados para que a água remova as partes envelhecidas dos compostos de enxofre que surgem na superfície do corte. Assim, poderá saborear só as partes frescas.

    Se estiver cozinhando alho, cebola ou um de seus parentes, faça isso com os bulbos inteiros ou picados grosseiramente. Isso vai moderar seu sabor. Esmagá-los ou raspá-los, ao contrário, intensifica o sabor.

    Raspar também pode alterar o sabor com que os allium contribuem para os pratos. Eles são ingredientes valorizados, em parte, porque sua química de enxofre reforça o sabor das carnes. No ano passado, um estudo alemão sobre carne guisada descobriu que, de longe, quem mais contribuía para o aroma global do molho era um incomum composto de enxofre, que não vinha da carne, mas da cebola e do alho-poró. O composto só aparecia depois que os vegetais eram cortados.

    Dessa forma, se você conta com allium para dar profundidade a guisados ou assados, corte-os finamente ou faça um purê. O calor vai eliminar a ardência e desenvolver o aroma.

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    Novas variedades – O livro de Block pode ser a última palavra sobre os allium hoje, mas como ele mesmo deixa claro, existem novos sabores adiante.

    Pesquisadores da Nova Zelândia e do Japão desenvolveram recentemente uma cebola experimental que elimina a enzima do fator lacrimógeno. Livre do choro, mas não do sabor. Ao contrário das cebolas mais suaves, esta variedade ainda guarda sua carga de materiais sulfúricos. Isso aumenta os níveis de traços de compostos que Block descobriu e batizou de “zwiebelanes”. Ele os descreve como “tendo um maravilhoso aroma de cebola, fresco, doce”. A cebola sem lágrimas promete ser intensa, de uma maneira nova.

    Block e alguns de seus colegas também começaram a estudar centenas de espécies de allium que ainda crescem no centro e no sudoeste da Ásia, alguns dos quais colhidos localmente e comidos em profusão � e com defesas químicas muito diferentes. “Quero ver que outras surpresas a natureza guardou para nós”, diz Block. Mas a exploração de sabores começa em casa. “Há muita coisa acontecendo embaixo de seu nariz quando você corta ou cozinha”, diz ele. “Use seu nariz, siga as mudanças e você vai descobrir coisas novas e deliciosas.”

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