Artilharia pesada, mira ruim
Um diretor de talento inquestionável, um roteirista premiado e um elenco liderado por Ben Affleck: ainda assim Operação Fronteira deixa saldo incerto
Em uma estreia espetacular com Margin Call — O Dia Antes do Fim, há oito anos, o diretor J.C. Chandor esmiuçou com perspicácia notável aquela que ele descreveu a VEJA como “uma das mais complicadas emoções humanas”: a ganância. Ocupando as horas anteriores à explosão da crise de 2008, Margin Call abria como em um caleidoscópio a gama de impulsos que levara os jogadores de Wall Street até aquele ponto — da cobiça pura e simples a profundas e inarticuladas questões íntimas. A ganância rodeava também o protagonista de seu filme seguinte, o excelente O Ano Mais Violento, enquanto o desejo primordial de se agarrar à vida movia o único personagem de Até o Fim, um velejador solitário interpretado por Robert Redford. Todos esses temas convergem — ou desejam convergir — em Operação Fronteira (Triple Frontier, Estados Unidos, 2019), que estreia nesta quarta-feira na Netflix. O resultado, porém, não alcança a mesma estatura dos filmes anteriores de Chandor — o que não quer dizer que não fique acima da média geral, e bem acima da média das produções originais bancadas até aqui pela plataforma.
A Tríplice Fronteira do título original não é a do Brasil com a Argentina e o Paraguai, mas sim a do Brasil com o Peru e a Colômbia. Lá, no meio da selva, está escondido um chefe de cartel em quem os americanos adorariam pôr as mãos. Se necessário, por meios clandestinos, como aqueles em que Santiago (Oscar Isaac) se especializa. Nesses casos, Santiago recebe uma porcentagem do butim apreendido. Mas e se pudesse ficar com tudo? A princípio relutantes, seus ex-companheiros das Forças Especiais, vividos por Ben Affleck, Pedro Pascal, Charlie Hunnam e Garrett Hedlund, topam tomar de assalto a toca do traficante. Encontram muito mais dinheiro do que supunham. E exatamente aí as coisas começam a desandar em escala exponencial: soldados aposentados e mal pagos, eles se deixam intoxicar pela fortuna, e mais ainda pela sensação de estarem vivos de novo, de serem relevantes, de recobrarem o controle. Mas, apesar do roteiro do premiado Mark Boal, de Guerra ao Terror, o filme permite que esses aspectos fiquem sendo submergidos pela ação, até virar uma espécie de aventura de Stallone — ainda que com elenco muito prestigiado, e assinatura de luxo.
Publicado em VEJA de 13 de março de 2019, edição nº 2625
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