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‘Abaporu’ era entrega de Tarsila para o Oswald, diz sobrinha-neta

Tela, que se chamou 'Nu' antes de ser rebatizada pelo escritor, foi presente da artista para o então marido

Por Ana Weiss
5 abr 2019, 21h00

Curadores costumam se queixar muito da participação de herdeiros na organização de legados na arte. Isso não parece acontecer com Tarsilinha do Amaral, sobrinha-neta da pintora de quem herdou também o nome, e responsável pela administração do legado da artista-símbolo do Modernismo. A exposição Tarsila Popular, em cartaz no Museu de Arte Moderna de São Paulo (Masp), reúne 120 obras de fases diferentes da artista. Uma articulação hercúlea entre instituições do mundo inteiro, o museu paulista e os outros mais de quarenta herdeiros que têm direito ao legado da criadora do Abaporu.

À frente de um espólio avaliado como o mais valioso do país, há vinte anos Tarsilinha participa da montagem de exposições, acompanha de perto as ações de royalties que ajudam a financiar as (muitas) cessões de imagens para livros didáticos e outros materiais educacionais. No intervalo, vasculha pelos grandes armários das fazendas da família Amaral atrás de relíquias, como a foto de uma funcionária da fazenda que inspirou a criação de A Negra. Das gavetas e conversas de parentes mais velhos, reuniu evidências que levaram-na a acreditar que o Abaporu é, na realidade, um autorretrato feito pela tia-avó fez para presentear o marido, o escritor Oswald de Andrade, que escreveu o Manifesto Antropofágico em cima da tela pertencente, hoje, ao Museu de Arte Latinoamericana de Buenos Aires, o Malba – mas que voltou ao Brasil para a mostra do Masp.

A seguir, a entrevista concedida pela herdeira a VEJA:

A crítica concorda com a sua tese sobre a origem do Abaporu? Nas escolas se ensina que a figura é a criatura do folclore que Tarsila evocou para resumir o ideário antropofágico. A Aracy Amaral (uma das mais importantes críticas da obra da artista) discordou por muito tempo, mas agora ela começa a considerar a minha tese. Tarsila pintou o quadro no auge da paixão por Oswald. O cabelo é exatamente o dela na época e a perspectiva é de alguém que se retrata nu em frente a um espelho inclinado, que era exatamente o que ela tinha em seu ateliê. Quando ele foi exposto pela primeira vez ainda não se chamava Abaporu – esse nome foi dado depois pelo Oswald e pelo (também escritor modernista) Raul Bopp. Tarsila chamou a obra de Nu, inclusive é esse o nome que consta no registro de sua primeira exposição. Era uma fase muito sensual da produção dela.

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Houve alguma informação nova, para que a possibilidade passasse a ser considerada pela crítica e incorporada à história da arte? Sim. Repare no pé da figura da tela. O segundo dedo é desproporcionalmente grande, muito maior que o primeiro. Olhei muitas, mas muitas fotografias com a Tarsila para tentar saber como eram seus pés, mas ela vivia de sapatos fechados, quase desisti. No entanto, minha irmã, que chegou a conviver com ela até a adolescência (eu não tinha 8 anos quando ela morreu), me contou que lembra exatamente desse segundo dedo grande da nossa tia-avó. Hoje eu não tenho mais dúvidas sobre a ideia original do quadro. Era uma espécie de entrega: dela mesma, para o Oswald, que foi o grande amor da vida dela. Tanto é que quando eles se separaram ela fez questão de ter a tela de volta. Ela deu um De Chirico (pintor surrealista já reconhecido na época) para ele em troca do Abaporu.

Você reconhece que existe uma supervalorização do Abaporu em relação a outras obras da artista? Sim, acho que a obra ganhou esse contorno icônico justamente por causa da sua história. Porque, se formos avaliar, a Antropofagia tem A Negra e o Abaporu dentro dele, e não tem metade dos holofotes do Abaporu sozinho.

A venda em 1995 para o Malba incomodou muita gente pelo fato de uma obra-símbolo de brasilidade passar a pertencer a uma instituição argentina. Você acha que essa competição com o país-rival contribuiu com a imensa popularidade que a tela tem hoje? Ah, sim. Certamente tem isso também. Mas o Malba cuida maravilhosamente da obra da Tarsila. Eles fazem publicações lindíssimas. Emprestam a obra sem colocar obstáculo nenhum. Era o desejo da minha tia ver as suas obras em museus internacionais. Alguns marchands avaliaram na época que a venda do Abaporu mudou o patamar da arte brasileira no mercado internacional. E veio para o Brasil outras vezes depois da venda: voltou para os jogos olímpicos de 2016, antes, esteve em Brasília, em 2011, e agora está aqui em São Paulo.

Por que o segredo em torno do valor pago pelo Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) pela tela A Lua? A especulação de que a instituição teria pago 20 milhões de dólares pela obra faz sentido a partir das negociações que você acompanhou? Vocês tentaram trazer a obra recém-comprada para a mostra? Por tudo que aconteceu a partir da retrospectiva da Tarsila no MoMA era natural que uma Tarsila quebrasse o recorde de venda de obra brasileira. Não sei realmente do valor, mas apostaria que foi bem mais alto do que se especula. Provavelmente a família pediu sigilo (a tela pertencia à coleção Feffer, família fundadora da fábrica de papel Suzano). Tentamos trazê-la, sim, mas ela acabou de entrar para o processo de restauração, infelizmente não foi possível, desta vez. 

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