Vivienne Westwood: um jeito punk (e ainda muito atual) de se vestir
Os modelos já não provocam tanto barulho como nos anos 1970, mas seguem influentes, três anos depois da morte da estilista

“Nós somos as flores na lixeira”, cantava o Sex Pistols em meados dos anos 1970, na Inglaterra que, incomodada, descobria o movimento punk. A combinação de guitarras cruas com a rebeldia de ir contra tudo e todos, a partir de Londres, era apenas a trilha sonora de um movimento muito mais amplo, um basta à sociedade de consumo, ao status quo político, àquilo tudo que soava envelhecido. Era preciso vestir aquela turma do avesso. Coube à estilista Vivienne Westwood cortar e costurar a moda do anarquismo. De mãos dadas com o companheiro Malcolm McLaren, produtor do Pistols, ela abusou de calças rasgadas, espartilhos, alfinetes, jaquetas de couro e cabelos espetados e coloridos. Sua primeira loja, chamada Let It Rock e depois renomeada como SEX, virou o epicentro da onda imparável. Vestir-se, para a estilista, não era só estética, era ideologia.
É extraordinário perceber que ainda hoje, passados três anos da morte de Vivienne, em 2022, ela ainda ecoe e exerça influência. Ninguém mais se assusta com o punk, convém sublinhar, mas preservá-lo nos armários e nas ruas tem um quê de protesto, sim. Lá atrás, ela cutucou os pilares ao tingir seus modelos de denúncias contra a opressão de gênero, a desigualdade social e os riscos do descuido com o clima, ao sugerir o reaproveitamento de materiais. O que dizer, agora? God save the queen, a rainha Vivienne. Uma extraordinária exposição do trabalho dela associada ao de Rei Kawakubo abrirá as portas na Austrália, sinônimo de celebração de duas desbravadoras do lugar-comum. Nas passarelas, a grife que leva seu nome e é comandada pelo derradeiro marido da veneranda dama, Andreas Kronthaler, tem sido uma das mais festejadas.

A coleção de inverno 2025, por exemplo, trouxe peças inspiradas nos clássicos da grife, como balonês, corsets e alfaiataria desconstruída, promovendo equilíbrio entre herança e inovação. Personalidades como as atrizes Anne Hathaway e Elle Fanning e a cantora Dua Lipa, quando têm algo a dizer, vão de Vivienne — e elas parecem ter sempre algo a dizer, se destacando pelo que vestem, na contramão. “Vivienne quebrou as regras da moda”, diz a consultora de estilo Gloria Kalil.
E como convém a toda postura genuinamente punk, há que haver ironia em excesso. É o caso do recente sucesso dos vestidos de noiva by Vivienne Westwood, que à primeira vista parecem mais do mesmo, só que não. Podem ser brancos, como manda o figurino, mas exalam sensualidade inesperada. São filhos da mítica peça nubial da personagem Carrie Bradshaw, de Sarah Jessica Parker, em Sex and the City, de busto pontudo e cintura marcada. Nada, portanto, de tules etéreos; eles são substituídos por cortes que moldam o corpo. Tem atitude mais punk? Talvez sim, mas nubentes como a cantora americana Demi Lovato e as atrizes brasileiras Giovanna Lancellotti e Isis Valverde, que subiram recentemente ao altar, por não quererem despontar como pombinhas, apelaram para “Viv”, como a chamavam os amigos.

Convém seguir uma célebre máxima dela, que serve para pôr uma roupa e serve para tudo na vida: “As pessoas mais sensuais são as que pensam. Ninguém se interessa por alguém que é só vaidoso, que só fale da última moda — não existe última moda. É tudo bobagem”. Bobagem, em termos, porque nos últimos anos a marca Vivienne Westwood só cresce em vendas, a uma taxa de 28% ao ano. Não se trata apenas, convenhamos, de flores na lixeira, definitivamente não.
Publicado em VEJA de 11 de julho de 2025, edição nº 2952