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Torre Mata Atlântica é candidata a novo cartão-postal de São Paulo

Parte da Cidade Matarazzo, trata-se do primeiro projeto do arquiteto francês Jean Nouvel no Brasil

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 11h55 - Publicado em 22 Maio 2022, 08h00

Conhecido por desafiar normas e padrões da arquitetura moderna, o francês Jean Nouvel, 76 anos, ganhou fama internacional com os projetos do Instituto do Mundo Árabe (1987) e da Fundação Cartier para Arte Contemporânea (1994), em Paris. Também são dele a alta Torre Agbar (2005), em Barcelona, e o Teatro Guthrie (2006), em Minneapolis. Premiado com o prestigioso Pritzker e com o Leão de Ouro da Bienal de Veneza, Nouvel passou perto de deixar sua marca no Brasil em 2003, com o controvertido Guggenheim Rio, a filial brasileira do museu americano de arte contemporânea. A ideia, contudo, não vingou. Atribuiu-se a desistência de erguer o edifício à Guerra do Iraque. Passados quase vinte anos, Nouvel não desperdiçou a segunda chance: é dele a assinatura da exuberante Torre Mata Atlântica, parte do hotel de luxo Rosewood São Paulo, no centro da capital paulista. A inauguração está prevista para junho.

O prédio faz parte do complexo Cidade Matarazzo, onde funcionaram durante quase todo o século XX o Hospital Umberto I, conhecido popularmente como Hospital Matarazzo, e a Maternidade Condessa Filomena Matarazzo. A construção tem 22 andares e 100 metros de altura. Nouvel a envolveu com mais de 200 árvores, algumas com até 14 metros de altura, criando uma grande floresta vertical em sintonia com a mata nativa da região, um resgate que mantém diálogo com o zelo pelo meio ambiente. A estrutura singular da obra e o verde das folhas se destacam na linha do horizonte. Não há dúvida: é candidata a se transformar em marco de uma metrópole de urbanismo caótico, em busca de novidades, carente de novos “cartões-postais” além dos já consagrados Edifício Copan, de Oscar Niemeyer (1907-2012), do Masp, de Lina Bo Bardi (1914-1992), e do Edifício Itália, de Franz Heep (1902-1978).

EM PARIS - Fundação Cartier: uma das assinaturas do premiado profissional -
EM PARIS - Fundação Cartier: uma das assinaturas do premiado profissional – (@FondationCartier/Facebook)

A Torre Mata Atlântica é capítulo relevante da ambiciosa ideia do empresário francês Alexandre Allard de entregar a São Paulo um conjunto que conterá, além do Rosewood, um centro cultural, um shopping com mais de setenta marcas exclusivas e 34 pontos de gastronomia. Tudo isso no terreno de 30 000 metros quadrados próximo à Avenida Paulista adquirido em 2011 pelo empresário. Outro francês, o designer Philippe Starck, ficou responsável pelos interiores. Starck selecionou 57 artistas brasileiros para produzir uma coleção de esculturas, pinturas, azulejos, desenhos, tecidos e tapetes.

Nouvel e Starck procuraram preservar a memória dos antigos edifícios ao mesmo tempo que resgataram elementos originários da região. “Construções do passado podem estabelecer uma relação e criar um diálogo com as árvores”, disse Nouvel a VEJA. “Assim, nós reforçamos a presença na natureza, em vez de ocultá-la ou calá-la.” Trata-se de alinhavar o que a arquitetura tem de mais extraordinário: contar a história dos humores de determinado tempo histórico. Ou, como disse o alemão Mies van der Rohe (1886-1969) em uma máxima celebrada: “A arquitetura é a vontade de uma época traduzida em espaço”.

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“A natureza é nossa amiga”

ÍCONE - Nouvel: não existe arquitetura sem história -
ÍCONE - Nouvel: não existe arquitetura sem história – (François Durand/Getty Images)

O arquiteto Jean Nouvel falou a VEJA durante uma passagem por São Paulo, no fim de abril. Ao lado do empresário Alexandre Allard e do designer Philippe Starck, ele participou da apresentação da Torre Mata Atlântica, parte do Rosewood São Paulo, sua primeira obra no Brasil.

Qual foi o primeiro pensamento quando lhe foi apresentado o projeto? Foi uma grande surpresa quando vi o local. Porque aqui era um lugar de encontro, de resgate da vida. Deveria ser um elemento de pertencimento à cidade e, por outro lado, um componente de um território antigo. Tudo isso soldado à paisagem. Assim, emergiria como um ponto de revelação e de contestação.

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Como trabalhou com essas árvores? Não esperava árvores tão grandes. Elas crescem muito rápido. As antigas precisam de tempo para se adaptar. Não se trata de um problema de paisagismo, de como incluir essa vegetação, de como fazer uma composição. A natureza é amiga.

A arquitetura brasileira tem uma tradição, com nomes como Oscar Niemeyer e Paulo Mendes da Rocha. Como isso o influenciou? Conheci o Niemeyer em Paris. Era um arquiteto universal. Claro, deixou sua marca no Brasil. A relação com a luz, a relação com a claridade. Tinha uma forma também de trabalhar com a leveza do traço. Isso funciona muito bem com a natureza e também com o contraste urbano. Essa é uma herança cultural bastante sensível.

Há uma evolução da arquitetura com o contexto histórico? Eu sempre lutei para isso. Sou um arquiteto contextualista. Não pode haver uma arquitetura sem contexto. Isso é objeto de muita discussão e muito debate nas últimas décadas. A arquitetura pertence ao lugar onde ela se cria. Não adianta fabricar catálogos para depois aplicar em qualquer lugar. É muito importante contextualizar.

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O que acha das políticas públicas em torno do planejamento urbano? Hoje, são burocratas que fazem o planejamento urbano e não têm uma visão do que é uma cidade e seus habitantes. Somos prisioneiros que vivem em celas. Sou pela proteção dos territórios naturais e contra o espalhamento imobiliário.

Publicado em VEJA de 25 de maio de 2022, edição nº 2790

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