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O que eles estão dizendo? IA também não consegue acompanhar a linguagem dos adolescentes

Pesquisa revela que, para os programas de inteligência artificial, as novas expressões dos jovens também são um mistério

Por Valéria França Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 19 set 2025, 16h52 - Publicado em 19 set 2025, 06h00

As palavras foram sempre ferramentas de silêncio entre gerações — não é de hoje, claro, que os mais jovens criam expressões de modo a esconder algo, ou tudo, dos adultos. É movimento natural, porque a língua é viva. Assim caminha a humanidade, agora com um dado que bagunça o coreto: a eclosão da inteligência artificial (IA), filha mais nova da era das redes sociais e da internet, que acelera os passos. Se já era difícil traduzir os humores da juventude, agora o quebra-cabeça ganhou novas peças.

As invenções idiomáticas começam cedo e, junto delas, as incompreensões. Dito de outro modo: a linguagem da chamada geração alfa, de meninas e meninos de 15 anos ou menos, muda tão velozmente que pais, professores e mesmo os robôs de IA são incapazes de acompanhar. Isso é demonstrado por um levantamento divulgado recentemente. Manisha Mehta, uma estudante de 14 anos de Cupertino, na Califórnia, realizou o trabalho em parceria com o professor Fausto Giunchiglia, da Universidade de Trento, na Itália. A dupla reuniu 100 expressões populares de redes sociais e plataformas de vídeo. Foi solicitado a 24 voluntários com idades entre 11 e 14 anos que explicassem o significado do que lhes foi apresentado. Os entrevistados tinham de dizer se compreendiam as frases, em que contexto estavam sendo usadas e se representavam riscos. Eles também pediram aos pais, moderadores profissionais e quatro modelos de IA — GPT-4, Claude, Gemini e Llama 3 — que fizessem o mesmo.

A diferença de entendimento das expressões entre o grupo de 11 a 14 anos e os demais foi abissal. Entre os voluntários da geração alfa, 98% entenderam o significado dos termos e 96% perceberam o contexto em que foram usados. Os modelos de IA, contudo, só reconheceram o uso prejudicial em cerca de quatro em cada dez casos — variando de 32,5% para Llama 3 a 42,3% para Claude. Os adultos também foram mal, identificando apenas um terço do vocabulário.

Há, enfim, um submundo de invencionices que escapam a seres humanos adultos e máquinas, em repertório parcialmente iluminado pela série Adolescência, da Netflix. Para entendê-lo, é preciso um glossário (veja abaixo), e olhe lá, porque dobrando a esquina os significados mudam. Você, pai ou mãe, sabe o que é skibidi sigma ou kys? Provavelmente não. Não chega a ser dramático, porque sempre é hora de aprender, e há um consolo: a IA também não sabe, por enquanto. “Precisamos nos aprofundar em pesquisas sociais e antropológicas associadas à IA”, disse Giunchiglia a VEJA.

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Mas há um precipício, que precisa ser afastado antes que seja tarde demais: esconde-se, por trás da linguajar cifrada, o risco de bullying. São senhas para provocações. Não saber o que está sendo dito é atalho para cair em um fosso inaceitável e preocupante. Foi sempre assim, insista-se, de criação em criação, mas as novas tecnologias levaram a fabricação de vocábulos a outro território, complexo e insidioso — o mundo de um esperanto incompreensível. “Os códigos secretos da criançada deixam as redes sociais ainda mais inseguras”, diz Anna Christina Bentes, professora de sociolinguística da Unicamp.

Contudo, não é o caso de prever o fim dos tempos — embora seja bom correr para saber o que os pequenos andam dizendo por aí. É tolice achar que tudo o que vem dos smartphones, a ágora onde tudo acontece, seja ruim, seja podre. Especialmente na construção da linguagem, há aspectos positivos do ponto de vista histórico, de desenvolvimento cultural. “Temos um ecossistema linguístico no qual as palavras disparam das margens para o mainstream em questão de dias”, afirma o americano Adam Aleksic, de apenas 24 anos, vasculhador dos intestinos das redes e que acaba de lançar o livro Algospeak: How Social Media Is Transforming the Future of Language (Algospeak: como as redes sociais estão transformando o futuro da linguagem). Um outro reputado estudioso do tema, David Crystal, se debruçou, no início dos anos 2000, sobre a explosão de termos nascidos com a popularização da internet. A conclusão: deu-se imenso incentivo à louvável e infindável onda de criatividade.

O ambiente digital não destrói a língua, mas gera novos estilos de comunicação. É uma espécie de “fala escrita”, um híbrido que não pode ser jogado ao lixo. Há, contudo, obstáculos, porque uma coisa é a vivacidade do idioma off-line, outra é o que vivemos plugados. “Resolver desentendimentos derivados de regionalismos, por exemplo, é mais fácil porque são expressões que não mudam, ao contrário dos símbolos entre adolescentes”, diz Diego Senise, professor de IA da Universidade São Paulo e CEO da Ilumeo, centrada na mineração de dados para marketing.

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Lembre-se, com o perdão da comparação, que houve espanto com o livre escrever de Ulisses, de James Joyce, de 1922. Embora não escondesse nenhum tipo de agressividade comportamental como a atual crueldade das perseguições eletrônicas na idade escolar, havia a surpresa do novo — e para os jovens não há outro caminho a não ser a novidade travestida quase sempre de desafio aos pais. É preciso atenção, mas não se pode brigar com a tecnologia. Entendido?

Publicado em VEJA de 19 de setembro de 2025, edição nº 2962

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