Dialeto caipira do interior paulista está caindo em desuso, diz pesquisa
Estudo também aponta que o português falado nessa região e o galego da Península Ibérica têm muitas semelhanças
Pesquisa da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) mostra que o dialeto caipira, próprio de moradores de cidades do interior paulista, localizadas próximas ao Rio Tietê, está caindo em desuso principalmente entre a população mais jovem e as mulheres. Palavras e expressões como “viuvinha” (terçol), “goela” (garganta), “lombo” (costas) “anca” ou “quartos” (quadril), “pestana” (sobrancelha), “capela do olho” (pálpebra), “curanchim” (cóccix) são usadas em maior parte pelos mais idosos.
Em entrevista ao Jornal da USP, a autora da pesquisa, Lívia Carolina Baenas Barizon, explicou que o Rio Anhembi, atual Rio Tietê, foi fundamental para a difusão da língua portuguesa e o dialeto caipira durante o início do século XVIII. “O dialeto caipira teria surgido nos núcleos familiares das cidades paulistas (…) e levado pelas monções para dentro do território paulista. Em sua caminhada rumo ao Mato Grosso (o Rio Tietê deságua no Rio Paraná, na fronteira com o Mato Grosso) para desbravar terras e retirar ouro, os bandeirantes saíam da capital paulista e seguiam a rota do Rio Tietê”, disse ela.
O predomínio do dialeto caipira entre os mais idosos, de acordo com a pesquisadora, poderia estar associado à menor influencia das mídias digitais nessa faixa etária. Entre os mais jovens, foi constatado um porcentual de 58% de frequência relativa à tendência ao desuso e 42% de tendência à manutenção. “Os jovens tendem a usar lexias mais próximas à realidade deles por terem maior escolaridade, pelo avanço tecnológico, pela influência das redes sociais, dentre outras inovações”, explicou ela. As mulheres também lideraram a tendência ao desuso (45%) e tendência à manutenção (23%). Já os homens apresentaram 18% de frequência de tendência ao desuso e 8% de tendência à manutenção.
O estudo também aponta que o português falado nessa região e o galego (proveniente da região ocidental da Península Ibérica – Portugal e Galiza) têm muitas semelhanças lexicais. Cerca de 82,4% das palavras do vocabulário desses paulistas têm correspondência com as do galego.
O galego e o português têm semelhanças lexicais devido às questões sócio-históricas, segundo a pesquisadora. Alguns linguistas já propuseram estudos comparativos como meio de comprovar o parentesco entre ambas as línguas, provenientes da mesma “mãe”, o galego-português, falado na região da Península Ibérica (onde hoje é Portugal e Galiza) até meados do século XII. E este último é proveniente do romance, uma dialetação do latim vulgar.
A tese O léxico caipira: tesouro da língua às margens do Anhembi teve a orientação do professor Manoel Mourivaldo Santiago Almeida, do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da FFLCH, e co-orientação da professora Maria do Socorro Vieira Coelho, da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).