Depois dos pijamas e moletons, os roupões entram no radar das celebridades
Eles chegam até aos tapetes vermelhos
A pandemia — que ainda não é página virada de nossa história, mas evidentemente arrefeceu, com vacina e ciência — mudou o cotidiano como o conhecíamos. Na moda, em especial, alinhavou novos hábitos, ao fazer da intimidade do lar um modo de vida. Não por acaso, os chinelões que iam do quarto para a sala de estar, da área de serviço para a cozinha, ganharam as ruas como se não houvesse amanhã. Fenômeno semelhante transformou moletons e pijamas em peças aceitáveis. Não demoraria, é natural, para que os roupões de banho também pedissem passagem, com pompa e circunstância, em fenômeno recente. Deu-se a explosão global da tendência quando a atriz francesa Isabelle Huppert, chique como mais ninguém, despontou no tapete vermelho do Festival de Cinema de Cannes quase como veio ao mundo. Ou seja: toda de branco felpudo, em um modelo Balenciaga. Houve espanto, cliques a não mais poder, e celebração. Era improvável que, vestida daquele jeito, ela parecesse elegante. Mas, sim — e, com o adendo do colo adornado por joias, brilhou intensamente.
O roupão de banho, é bom lembrar, embora soe óbvio, soma a displicência com um quê sexy, e daí o sucesso nas telas, eventualmente nos palcos e agora por aí, em corpo de celebridades. É preferencialmente feminino, sem dúvida, mas convém antes rememorar o charme incomparável de Sean Connery, todo de azulão, no primeiro filme da franquia de James Bond, 007 contra o Satânico Dr. No, de 1962, ao lado de Ursula Andress? Lembre-se, também com saudade, do penhoar a ornar Marilyn Monroe em fotos que ainda hoje provocam suspiros. Mas qual é, enfim, a dos quimonos de hoje para quem sai do chuveiro ou da banheira pronto para enfrentar os paparazzi? “É mais um sobretudo com cara de robe e que evoca um certo conforto”, resume o estilista Reinaldo Lourenço.
O bem-estar é fundamental, mas aludi-lo soa quase ingenuidade. Basta ver a quantidade de gente famosa que decidiu aparecer envolta dos ombros aos pés, e aquela fenda a provocar suspiros. Rihanna, que não perde oportunidade de agarrar uma oportunidade, despontou com a grife Jacquemus para o lançamento de sua marca de beleza, Fenty Hair, em Londres, como quem acabara de se enxaguar. Angelina Jolie escolheu tons escuros da marca Falconeri ao sair de um hotel a caminho do Festival de Cinema de Nova York. A modelo brasileira Camila Queiroz pôs Paris como pano de fundo, em segundo plano e suas pernas em primeiro, numa postagem que, é natural, viralizou. “As pessoas estão percebendo que não precisam sacrificar o conforto pela moda, e essa é apenas uma expressão mais atrevida dessa postura”, diz a jornalista americana especializada em estilo Hannah Jackson. Para ela, os roupões podem ser comparados aos chamados “vestidos envelope”, amarrados como um quimono, famosos pelas mãos da estilista belga Diane von Furstenberg.
Ressalve-se, a bem da verdade, que há um aspecto de ilusionismo. Os cortes remetem a cantos íntimos do lar, lembram os produtos de hotéis cinco estrelas, mas são vestidos longos, simples assim. Alguns custam mais de 40 000 dólares. “É sobretudo irreverência e ironia”, diz a consultora de moda Manu Carvalho. A mensagem de quem desfila soa como uma frase de Clarice Lispector (1920-1977): “Vou tomar um banho antes de sair e perfumar-me com um perfume que é segredo meu. Só digo uma coisa dele: é agreste e um pouco áspero, com doçura escondida”.
Publicado em VEJA de 22 de novembro de 2024, edição nº 2920