Carta ao Leitor: Mulheres em ação
Reportagem especial esmiúça um interessante fenômeno: a crescente adesão de meninas e moças da chamada geração Z a causas progressistas
As mudanças de comportamento da sociedade sempre foram tema de permanente atenção de VEJA ao longo de seus 55 anos de história — período suficiente para ver as placas tectônicas, rígidas e imutáveis, se movimentarem, empurradas pelo saudável vento da democracia. Entre as mulheres, especialmente, as transformações têm sido vigorosas e louváveis, aptas a romper com o mundo masculino, alimentado por preconceito e misoginia. Temas tidos como tabu, na antessala de lentas revoluções, foram capa da revista. Em 1979, a série Malu Mulher, da Globo, estrelada por Regina Duarte, iluminava o direito à vida sem marido, depois da separação e do divórcio, que apenas dois anos antes tinha sido legalizado. Em 1997, algumas celebridades — entre elas, as apresentadoras de televisão Hebe Camargo e Marília Gabriela — admitiram ter feito aborto. Foram criticadas, em alguns casos abandonadas pelos fãs, mas não cederam — em luta por um direito que, no Brasil, ainda hoje engatinha, no avesso da avassaladora vitória feminista na França, país que aprovou, há duas semanas, a possibilidade de interrupção da gravidez em sua Constituição. Em 2013, Daniela Mercury e a jornalista Malu Verçosa tiveram a coragem de celebrar sua união, uma “questão inadiável”, como anunciava a chamada principal.
Como um bonito passo da humanidade, em qualquer canto do mundo — até mesmo onde a opressão dá as cartas — os movimentos individuais e coletivos costumam se antecipar à construção das leis. Somente depois é que os políticos entram em cena, movidos por grupos mais avançados, freados pelos conservadores radicais. Em todas as situações, destaque-se, é sempre bom ver o que fazem as mulheres, por andarem à frente, na marra, valentes e inteligentes. Uma reportagem especial de VEJA desta semana, escrita pela repórter Duda Monteiro de Barros, esmiúça um interessante fenômeno, confirmado por pesquisa exclusiva do instituto Genial/Quaest: a crescente adesão de meninas e moças da chamada geração Z (nascidas de 1995 a 2008), que têm entre 16 e 29 anos, a causas progressistas, atreladas aos direitos irrefutáveis de viver sozinhas, de abortar, de manter uma união homoafetiva etc. Observar esse tipo de sacolejo — e mostrar que elas, independentemente da vontade deles, fazem suas escolhas — é um bom caminho de civilidade e igualdade. VEJA se orgulha de poder ajudar a erguer esse edifício. O jornalismo como rascunho da história, a passar diante de nossos olhos. Detalhe importante: não apenas no dia dedicado a elas.
Publicado em VEJA de 15 de março de 2024, edição nº 2884