Abertura de empresas por menores de 18 anos dispara em 2022
Fenômeno indica tanto o interesse pelo empreendedorismo como a necessidade de inserção no mercado de trabalho
Steve Jobs tinha 21 anos quando fundou a Apple ao lado de seu eterno parceiro Steve Wozniak, este um “veterano” de 26 anos com boa experiência no mundo da eletrônica. Bill Gates gestou a Microsoft na garagem de casa quando mal havia chegado aos 20. Com 22, seu sócio, Paul Allen, era só um pouco mais velho (leia mais na pág. 70). Mark Zuckerberg é outro gênio corporativo precoce: o Facebook começou a nascer quando ele completara apenas e tão somente 19. A história ensina, portanto, que a juventude é um ingrediente poderoso para o empreendedorismo. No Brasil, um fenômeno recente mostra que os jovens desejam cada vez mais trilhar o próprio caminho. De acordo com levantamento da plataforma de análise de dados Datahub, o número de microempresas individuais (MEIs) que pertencem a pessoas com menos de 18 anos disparou 227% no primeiro semestre de 2022, em relação ao mesmo período do ano passado. Ou seja: os muito jovens nunca tiveram tanta disposição para abrir um negócio e seguir a rota do mundo empresarial.
Em geral, eles se motivam pelas vantagens oferecidas pela nova era da digitalização — que permite, por exemplo, abrir uma loja on-line na sala de casa — para se aventurar como empresários, muitas vezes antes mesmo de ter alguma vivência no mercado de trabalho formal. A pandemia, sempre ela, teve papel importante na aceleração do movimento. “Ela trouxe uma mudança na geografia dos pequenos empresários e proporcionou que novas atividades surgissem no mercado brasileiro”, afirma André Leão, diretor de produtos da Datahub.
Houve aumento expressivo do número de microempresas individuais abertas nas regiões Norte e Nordeste, o que mostra que o empreendedorismo se espalha por todo o país. Outro ponto interessante capturado pelo estudo: a categoria de vestuário é uma das que tiveram maior crescimento, indicando justamente a facilidade com que é possível vender roupas pela internet e ter o WhatsApp como plataforma de comercialização.
Embora existam óbvias limitações, como o faturamento máximo de 81 000 reais mensais e a possibilidade de ter apenas um funcionário, o formato MEI pode ser visto como uma porta de entrada decisiva para o empreendedorismo. Por ser seguro e ter custo baixo com impostos, é um modelo eficaz para testar oportunidades de mercado. No momento de escalar o negócio, há uma grande rede de informações disponível no Brasil. “O Sebrae tem participação importantíssima no suporte e na educação empreendedora, indispensável quando a empresa cresce e passa a participar de um mercado mais exigente”, afirma Antonio André Neto, coordenador do MBA de gestão estratégica e econômica de negócios da Fundação Getulio Vargas (FGV).
É preciso pontuar, contudo, que o cenário nem sempre é de pujança. Algumas vezes, o que move o empreendedor é mesmo a necessidade de sobrevivência. “O mercado não está absorvendo jovens da forma tradicional, com registros CLT”, afirma André Leão. Em outras palavras: na falta de oportunidades, eles partem para o que der e vier, e abrir uma empresa pode ser o melhor — e talvez único — caminho para ter alguma fonte de renda, para escapar da pobreza. Nessa balança, deve-se apontar um fator primordial para atrair futuros empresários: a glamorização do empreendedorismo, movida principalmente pela expectativa dos jovens em fundar empresas revolucionárias quando ainda estiverem na flor da idade — e, quem sabe, se tornarem novos Jobs, Gates e Zuckerbergs.
Publicado em VEJA de 9 de novembro de 2022, edição nº 2814