A segunda mão é um luxo: como a geração Z faz crescer o mercado de brechós
Negócio bilionário segue evoluindo em ritmo forte
Revolução é palavra desgastada, mas há sim uma revolução em andamento no mundo da moda: o mercado de brechós deixou de representar economia alternativa para se tornar símbolo de transformação cultural e ambiental, além de negócio lucrativo com ações na bolsa. Virou sinônimo de estilo de vida conectado à sustentabilidade e à consciência coletiva. A virada de chave tem a ver com a combinação de dois movimentos. O primeiro: a urgência ambiental, no combate a qualquer tipo de desperdício, sobretudo em um setor que é o segundo mais poluidor do mundo, atrás apenas do petróleo, responsável por gerar 92 milhões de toneladas de resíduo têxtil por ano. O segundo ponto: a roupa de segunda mão representa a possibilidade de se vestir de forma autêntica, como quer a geração Z, formada por jovens entre 15 e 28 anos.
Relatórios da Boston Consulting Group (BCG) e da Vestiaire Collective, plataforma de usados de grife, mostram que 32% do guarda-roupa da juventude é de segunda mão, um percentual que sobe para 40% no Brasil. Diferentemente das gerações anteriores, a Z tem outra relação com os bens materiais. Priorizam a experiência, a flexibilidade e o respeito à Terra, e nada do luxo pelo luxo. É um consumidor que preza muito mais a liberdade do que o status. “Essa geração tem um forte senso crítico”, diz Bruna Vasconi, de 45 anos, sócia-fundadora do Peça Rara, brechó que nasceu em Brasília e hoje tem 130 lojas espalhadas pelo Brasil. “Eles só compram roupas novas quando esgotam todas as possibilidades de encontrar a peça usada.” Esses jovens também vendem nos brechós, depois, parte das próprias compras para conseguir renda extra e reinvestir em uma viagem ou trocar de celular.
É por isso que o mercado nacional de roupas usadas cresce 25% ao ano, com uma velocidade três vezes maior do que o de peças novas. Para aproveitar os bons ventos, o setor investiu na modernização. As grandes redes possuem etiquetas inteligentes, controle de estoque, comércio eletrônico, além de vender roupas em perfeito estado. Nada disso lembra o antigo “mercado de pulgas”, reconhecido pelo cheiro de naftalina e pelo característico amontoado de peças, etiquetadas com preços escritos a mão. Há, é claro, o empurrão das redes sociais. O formato de plataforma como o Instagram e o Pinterest valoriza a curadoria, com apoio em fotos criativas e ofertas baratas e imediatas. Eis a estratégia, por exemplo, da Enjoei, uma das maiores redes de comércio eletrônico da chamada moda circular do país.
O preconceito com as roupas de segunda mão ainda existe, mas é bem menor do que no passado. A mais recente edição da São Paulo Fashion Week, em outubro, trouxe para as passarelas um desfile inteiro com peças recicladas. Há mais de uma década focado no mercado circular, o estilista Marcelo Sommer fechou parceria com o brechó Capricho à Toa. De lá, partiram roupas que serviram de base para novas modelagens, que receberam intervenções com tecidos sustentáveis e rastreáveis da Lenzing Ecovero e da Têxtil Carmem. “Antes de colocar os modelos na passarela, 40% da coleção já estava vendida”, diz Sommer, que faz uma coleção por ano. “O processo criativo é demorado, porque envolve pesquisa e desenvolvimento.” Mas, como são peças únicas, acabam atraindo um público que gosta de exclusividade.
Estima-se que o faturamento global de segunda mão movimente entre 320 e 360 bilhões de dólares até 2030. “Nos Estados Unidos, onde doar faz parte da cultura, o setor cresce duas vezes mais que o brasileiro”, diz Denise Pini, dona do Capricho à Toa, que está entre os mais antigos brechós do Brasil. Se houver dúvida na adesão à tendência, há quem faça contas: a produção de uma calça jeans consome pelo menos 5 000 litros de água. O argumento faz o preconceito de qualquer um ir pelo ralo. Como diz um clássico do cantor Belchior, é a velha roupa colorida — e ela nunca esteve tão em moda.
Publicado em VEJA de 7 de novembro de 2025, edição nº 2969

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