
Um grupo de amigas minhas do interior veio passar uns dias em São Paulo. Sem traquejo social, foram a um restaurante simpático ignorando que na capital o simples e despojado pode se confundir com o muito caro. Então, o garçom chegava com mariscos e perguntava: “Aceitam?”. Respondiam: “Ah, sim, muito obrigada”. No final, veio uma nota exorbitante. Uma ainda tentou argumentar: “Pensei que era oferecimento”. A resposta veio rápida: “É oferecimento, mas tem que pagar”. Na capital, as palavras adquirem rapidamente novos sentidos e traiçoeiras interpretações. Não é como estar na casa da vizinha que oferece um pedaço de bolo: “Aceita?”. Aqui tudo custa.
“Coma caviar sempre que puder. Mas esqueça o cartão de crédito. Só assim você não terá indigestão”
Certa época tentei fazer a ex-famosa dieta macrobiótica. É baseada no consumo puro e simples de arroz integral, no máximo um pedaço seco de alga. Depois, só é preciso aguardar a felicidade. Para algumas pessoas que eu conhecia, foi a chegada à UTI do hospital, em quase inanição. Como toda moda, tinha milhões de seguidores ao redor do mundo e gurus orientais que nos inspecionavam com olhar de sabedoria (muitas vezes suspeitei que eram míopes e que o olhar fixo não era de sabedoria, mas de falta de um bom oftalmologista). A dieta macrobiótica durou alguns meses, nos quais tive delírios e vi um cheeseburger voando na minha frente. Juro. Na época ferrenha do regime, fui a um restaurante macrobiótico. Ofereceram figo desidratado, que, segundo me afirmaram, cabia no programa. “Aceita?” Aceitei. E mais um e mais um e mais um, imaginando que fazia parte do cardápio. Não fazia, e quase deixei minhas calças no caixa. Macrobiótico, sim. Tonto, jamais! Paguei por isso. Em outras situações, caí na mesma armadilha, nem faz muito tempo. Em um restaurante simpático de São Paulo, escolhi um prato. O maître perguntou com ar inocente: “Aceita uma porção de caviar uruguaio adicionado ao prato?”. Eu conhecia o caviar russo. O uruguaio, imaginei que fosse mais em conta, nem que fosse pelo valor da passagem de vinda. Aceitei. Este é o problema: por mais escaldado que seja, a gente aceita! Bobo de novo, imaginei que fizesse parte do prato, no preço do cardápio. Na hora da conta, descobri que era um extra. Beeeemmm extra. Pior: os queijos da Serra da Mantiqueira, que eu também amei, eram extra. Pra falar a verdade, quase tudo era extra, só faltou cobrar pelo uso dos talheres. A alegria daquela refeição maravilhosa esvaiu-se praticamente para toda a mesa.
Devo confessar, menos pra mim: eu havia esquecido o cartão de crédito! Vamos confessar: existe momento melhor para esquecer o cartão? Todos os outros na mesa se fizeram de educados e cobriram minha parte, enquanto eu afirmava que um dia… um dia… eu cobriria o prejuízo.
Foi de onde tirei um ensinamento que hoje deixo a você, com a sabedoria de um Confúcio: coma caviar sempre que puder. E mais todas aquelas outras delícias. Se perguntarem: “Aceita?”. Diga que sim. Aceite, aceite.
Mas esqueça o cartão de crédito. Só assim chegará ao fim da noite sem uma indigestão.
Publicado em VEJA de 29 de agosto de 2025, edição nº 2959