‘Lula é um exemplo de envelhecimento ativo, Bolsonaro não’
Alexandre da Silva, à frente da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, fala a VEJA sobre as duas décadas do Estatuto do Idoso
Aos 45 anos, longe de ser considerado idoso, mas com mais de duas décadas dedicadas a pesquisas sobre envelhecimento, Alexandre da Silva assumiu recentemente a Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, subordinada ao ministro Silvio Almeida, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Em conversa com a coluna, Alexandre fala sobre os 20 anos do Estatuto do Idoso, assinado no primeiro governo Lula (PT), em 2003, e das diferenças de visão de dois homens idosos no comando do país – saiu Bolsonaro (PL), aos 67 anos, e entrou Lula, aos 77. Pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em países em desenvolvimento, como o Brasil, idoso é todo indivíduo a partir de 60 anos. “Tem pessoas que envelhecem e só aprimoram a maldade”, diz.
Quais são os desafios que o senhor assume como secretário nacional dos direitos da pessoa idosa? O desafio inicial é fazer um bom diagnóstico da potencialidade dos programas urgentes e se é necessário aprimorar ou até criar outros, dentro das possibilidades legais. Outro desafio, talvez até maior do que os programas, é restabelecer o propósito da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos da Pessoa Idosa. Isso diz muito sobre quem a secretaria precisa assistir, acompanhar, proteger e defender. Faz diferença uma gestão que chega com um propósito democrático, de respeitar a especificidade e as identidade de um país tão plural.
Há idosos trabalhando com o senhor na secretaria? Sim, a Inês Rioto, por exemplo, tem 70 anos. Ela foi contratada para trabalhar em uma coordenação com os grupos de pessoas idosas em situação de vulnerabilidade. E ela sempre diz aqui: ‘Nada para nós, sem nós’. Ela traz isso de mantra para a gente.
Qual é a medida mais urgente da secretaria? O Ministério dos Direitos Humanos como um todo se preocupa com articulação. A gente quer mapear, o quanto antes, quem são esses grupos de pessoas idosas em situações de vulnerabilidade, a ponto de terem ameaçados ou até comprometidos seus direitos humanos.
O Estatuto do Idoso faz vinte anos em 2023. A seu ver, houve mais avanços ou retrocessos? Não consigo ver retrocesso. O estatuto é importante para a história do país, sabendo que foi (assinado) no primeiro governo Lula. Também devemos repensar pontos do estatuto que necessitam de aprimoramento. As coisas mudam e as pessoas evoluem. Infelizmente os problemas também mudam.
A violência contra o idoso continua alarmante no Brasil. De que forma a secretaria pode ajudar a combater essa realidade? Temos o Disque 100, canal de ouvidoria do ministério dos Direitos Humanos. Mas tem que lembrar, por exemplo, que pessoas idosas, muitas vezes, não têm acesso a telefone ou o telefone pode ser da pessoa que está violentando. Vamos estar no Youtube, no Facebook, no rádio, na televisão… A gente pretende não só aprimorar as vias pelas quais chegam as denúncias, mas também que pessoas idosas saibam o que é gesto de violência.
De que forma o presidente Lula sendo idoso, 77 anos, ajuda a mostrar para a sociedade como a velhice pode ser ativa? Interfere muito, e positivamente. Vejo o nosso presidente como um dos exemplos do envelhecimento ativo, na perspectiva não só da vitalidade física, mas do propósito de vida, da intenção que ele tem, do quanto consegue trazer a sua trajetória de vida, o quanto consegue se atualizar, buscar novos saberes, buscar novas práticas. Ele sofreu de alguns candidatos até o etarismo, falaram que ele não tinha mais competência ou saúde para o cargo.
Bolsonaro tem 67 anos, também se enquadra como idoso. Como avalia a representação da figura idosa no poder, neste caso? Como ele não teve o mínimo de empatia! Foi eleito no voto popular, e aí você ouve ‘eu não sou coveiro’, ‘é uma tossezinha’. Quando quem de fato morreu não foi um familiar dele. Infelizmente, as atitudes do ex-presidente comprovam que pessoas do mal também envelhecem. Tem pessoas que envelhecem e só aprimoram a maldade.
Como a pandemia de Covid-19 piorou o cenário dos idosos, seja pelo afastamento social ou por questões econômicas? Primeiro, a pandemia afetou mais alguns grupos em relação a outros. As pessoas idosas ficaram em situação de vulnerabilidade, não só pela idade, mas por condições de vida pregressa que as colocaram naquela situação. Velhice não é sinônimo de doença. O adoecimento também é culpa da sociedade. Na pandemia os fatores de risco foram exacerbados pela falta de políticas públicas em diversos campos. Houve esvaziamento de propósitos de vida, de poupança e de saúde.
Haverá algum evento pelos 20 anos do Estatuto do Idoso? Sim. A gente vai não só celebrar, mas também refletir sobre quais são os avanços, os aprimoramentos necessários, o que a gente fez enquanto sociedade pensando nos mais diversos aspectos políticos, econômicos e culturais. É o documento mais importante da pessoa idosa no país.