Homens ‘tomam’ o posto e se tornam reis e musos do carnaval
A tendência de escolas de samba em darem destaque a sambistas masculinos

Clara Nunes cantava: “Quem samba na beira do mar é sereia”. Mas nada dizia sobre quem samba na Avenida. Zeca Pagodinho, em outra canção, versa assim: “Meu amor tá perguntando se o samba é pras moças”. A julgar pela tendência atual das escolas de samba, não, Zeca, o samba é cada vez mais democrático quanto a gênero. A ponto de abrir espaço para homens ocuparem lugares historicamente destinados a elas – os almejados postos de musas e rainhas de bateria.
No carnaval de 2023, vários homens tomaram para si os espaços antes de mulheres quase sempre seminuas. “Isso é bom, mostra que a gente também consegue trazer a força masculina para o samba”, festeja Jorge Amarelloh, 28 anos, coreógrafo e rei de bateria da Em Cima Da Hora, que desfila no sábado, 18. Rei de bateria da Acadêmicos de Niterói pelo segundo ano, Juarez Alves, 37, comemora a tendência. “Da mesma forma que existia resistência sobre as mulheres ritmistas, e hoje isso avançou, é o que acontece com os homens musos. Carnaval não tem que ser dividido por sexo”, sentencia ele, também maquiador e acadêmico de Medicina.
Há casos em que o enredo escolhido sugere maior abertura para os padrões machistas do mundo do samba. É o caso da Lins Imperial, com Madame Satã: Resistir Para Existir. Para homenagear a famosa drag da boemia carioca, a escola abriu espaço para musos, como Wallace Guedes, 36. “Tem muito passista bom, que deveria estar na frente de uma bateria. Homem também merece! Nosso carnaval não é composto de peito e bunda, a gente está falando de samba”, defende o muso, ansioso pelo desfile de sexta-feira, 17.
Na mesma escola, Felipe Moris, 30, que usa o nome artístico Gato de Salto, também debuta no posto. O professor de dança diz que as barreiras de gênero estão longe de serem derrubadas. “Em qualquer vídeo meu do Instagram, há comentários preconceituosos. Vivemos em uma sociedade muito machista. Tudo que é ligeiramente feminino é tachado como fraco”, lamenta. Rodrigo Para Assu Rodrigues, 27, muso da Unidos da Ponte, é outro que cita os “percalços” do cargo. “A gente tem que provar muito mais que pode estar ali, porque em geral só querem ver mulher em destaque”, diz ele, pronto para “deixar a tristeza pra lá” e brilhar no sábado, 18.



