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Fotógrafo do ano denuncia: ‘ando de roupa branca e gritam que é macumba’

Gui Christ ganhou prêmio na categoria Retratos pelo Sony World Photography Awards 2025, com o projeto 'M'kumba', que combate intolerância religiosa

Por Mafê Firpo Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 27 abr 2025, 16h00

Eleito o melhor fotográfo retratista do ano pelo Sony World Photography Awards 2025, um dos maiores prêmios de fotografia, Gui Christ, 45 anos, ganhou o título com projeto M’kumba – um retrato da Umbanda e Candomblé no Brasil. Gui já vem há tempos percorrendo a representação da religião – começou a profissão, inclusive, fotografando terreiro na Baixada Fluminense. De lá pra cá se aventurou em diferentes áreas, ganhou prêmios mundo afora e foi considerado o melhor fotógrafo documentarista pela European Photography, mas só em 2020 começou seu projeto de representação da vida dentro dos terreiros. Em conversa com a coluna GENTE, Gui conta que antes trabalhava mostrando a violência religiosa contra religiões de matriz-africana. Grande parte da intolerância, para ele, vem do extremismo das comunidades cristãs.

Quando começou a fotografar? Sou formado em Belas Artes e Design. Na época, estava começando a fotografar e nem pensava em ser fotógrafo profissional. Morava no Rio e um dia estava na Baixada Fluminense fotografando com um grupo, quando entramos em um terreiro. Não entrei de primeira, porque tinha medo, minha família tem história de que minha bisavó tinha um terreiro e foi amaldiçoada, cresci ouvindo muita coisa ruim. Mas entrei e descobri que não era nada daquilo que imaginava e fotografei esse dia. 

Como a religião te incentivou a fotografar? Comecei a ter uns sonhos malucos depois desse dia. Voltei no terreiro e o pai de santo falou para ir lá um dia com a câmera e foi acontecendo naturalmente. Não sei se virei macumbeiro por causa da fotografia ou se virei fotógrafo por causa da macumba. Num dos sonhos, Ubaluaê, orixá das doenças e da cura, me disse para fotografar sua comunidade, mostrar como os terreiros faziam para resistir a pandemia. Macumbeiro recebe mensagens de maneira diferente (risos).

Foi alvo de ataques preconceituosos enquanto trabalhava? Antes da pandemia, em 2019, sofri tentativa de violência religiosa. Estava andando na rua aqui em São Paulo com roupa branca indo para um terreiro . Por acaso, estava passando perto de uma igreja. De repente, um carro saiu da garagem da igreja e tentou me pegar na calçada. Tive que pular e me esquivar, aí entendi que fui vítima de violência, de racismo religioso 

Assim fez seu trabalho ser denúncia contra a intolerância religiosa? Comecei a mostrar a violência. Mas foi na pandemia que tive o sonho com a divindade falando para mostrar a nossa comunidade. Estava focando em violência, sempre mostrando o sacerdote, o pai de santo no lugar de vitimização. Mostrava minha comunidade de uma maneira muito pesada. Era realidade, mas a religião não é só violência física.

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Por que a intolerância ainda é tão presente? Ao longo de 400 anos de história estamos resistindo ao preconceito e à intolerância religiosa. A intolerância religiosa não é recente. O governo Federal ainda não tem uma ferramenta eficiente que a gente consiga contabilizar, porque também tem muita gente que não denuncia, como eu não denunciei. A gente nunca sabe o número real. Tudo isso começou no Brasil-colônia. O tempo inteiro a gente anda na rua com roupa branca e gritam que é macumba. O Brasil é um país laico, mas toda a repartição pública tem um crucifixo. Agora, se boto uma imagem do Zé Pilintra, é um escândalo. 

Como acompanha as ações da bancada evangélica no Congresso? É perigoso. Não posso generalizar, nem todo neopentecostal, nem todo protestante, católico é intolerante. Mas há projetos políticos de poder, muitas vezes, que se relacionam com a extrema-direita e que pregam o ódio a tudo que é diferente. Não é só em relação às religiões africanas. Nem todo extremista de direita é intolerante na questão religiosa, mas grande parte sim. Vamos ter esses grupos religiosos atacando e ao mesmo tempo defendendo ‘Deus, Pátria e Liberdade’; sendo que o Deus dele é o Deus cristão, onde os deuses africanos seriam ignorados ou suprimidos.

Pode dar exemplo da intolerância velada no dia a dia? Teve uma igreja em São Paulo que criou a maior bateria de samba gospel do mundo. Isso é uma apropriação cultural, é epistemicídio. Eles primeiro atacam, condenam, falam que é coisa do demônio e depois se apropriam. Por exemplo, ao invés do acarajé na Bahia, já tem o bolinho do senhor. A balinha de Cosme e Damião é substituída pela balinha ungida, para que não ninguém pegue bala dos macumbeiro.  

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E o prêmio? Como foi recebê-lo e como pode ser um instrumento eficaz de sua luta? Nunca imaginei na minha vida ser eleito melhor retratista do mundo. Mas essa vitória não é minha exclusivamente, é dos milhões de escravizados que vieram para o Brasil, dos descendentes que por séculos lutaram para que as tradições, a memória dos seus antepassados e as religiosidades fossem preservadas para que chegassem até a mim. O grande vencedor desse prêmio é Ogum, a divindade que eu cultuo. A comunidade de religiosidade africana se viu valorizada, houve essa representatividade, essa identificação, tive um apoio enorme.

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