Quem não votar pode decidir a eleição
Com Lula na margem de erro para vencer no primeiro turno, ausência dos eleitores terá peso decisivo
Poucos temas importantes para o resultado das eleições são tão mal estudados quanto a abstenção. Como o voto no Brasil é obrigatório, candidatos, cientistas políticos e jornalistas minimizam o efeito da decisão de milhões de eleitores em não votar. No primeiro turno de 2018, 20,3% deixaram de votar, o maior índice desde 1998. Se o índice se repetir em outubro mais de 31 milhões de eleitores deixarão de votar.
Com o ex-presidente Lula da Silva na margem de erro de vencer as eleições no primeiro turno (ele tem entre 46% na pesquisa PoderData a 52% de votos válidos no Ipec), a abstenção pode decidir o resultado. Se houver mais abstenção em áreas pró-Bolsonaro, o petista pode ganhar já em 2 de outubro. Se ocorrer o contrário, o segundo turno está garantido.
As pesquisas têm dificuldade para mensurar o eleitor que se abstém. Perguntar a alguém se não pretende votar é como perguntar se ela cometeu uma infração. Depois há o constrangimento natural de um eleitor dizer que não vai às urnas quando este é o principal assunto do país. O Ipec, por exemplo, não entrevista quem disser que não votou nas eleições de 2018.
O PoderData fez uma tentativa para desenhar o perfil desse eleitor ausente. Na última pesquisa, 91% dos entrevistados disseram que vão votar, 6% disseram que não tem certeza e 2% responderam que não irão. Essa abstenção, diz o PoderData, é levemente mais prejudicial a Lula. Compare os dados:
Dos 6% que dizem não ter certeza de que irão votar
29% poderiam votar em Lula
24% poderiam votar em Bolsonaro
Dos 2% que dizem que não vão votar
27% poderiam votar em Lula
16% poderiam votar em Bolsonaro
A estratificação dos ausentes potenciais na pesquisa PoderData mostra as seguintes singularidades:
– 11% entre menores de 24 anos e acima de 60 anos, ante 8% na média das outras faixas etárias. Provavelmente isto decorre do fato de os jovens abaixo de 18 anos e eleitores acima de 70 anos não serem obrigados a votar. Dos 156 milhões de eleitores registrados, 16,9 milhões tem menos de 18 anos ou mais de 70 anos, quando o voto é optativo.
– A porcentagem de certeza do voto na Região Sul é de 94%, ante 90% em média nas outras regiões. Esse dados combina com as informações de 2018. No último pleito, a abstenção no Sul foi de 15,9%, enquanto no Sudeste chegou a 23,8%; no Centro -Oeste 22,9%; no Nordeste, 20,3%; e no Norte 21,7%.
Quase 30 milhões de eleitores não compareceram às urnas no primeiro turno de 2018. O nível de abstenção, de 20,3%, foi o mais alto desde as eleições de 1998. Se somarmos a abstenção aos eleitores que votaram em branco ou nulo, o que a ciência política chama de alienação eleitoral, 40,25 milhões de eleitores não votaram em ninguém no primeiro turno de 2018. Isso é quase 10 milhões de pessoas a mais do que as que votaram em Fernando Haddad. No segundo turno de 2018, os alienados foram 42,71 milhões. Qualquer prognóstico para outubro precisa levar em conta o tamanho da alienação eleitoral.
Dados coletados juntos ao TSE pelos pesquisadores Emerson Cervi, da Universidade Federal do Paraná, e Felipe Borba, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, mostra que a abstenção foi maior no Sudeste que nas demais regiões. Compare:
Sudeste: 23,8%
Centro-Oeste: 22,9%
Nordeste: 21,7%
Norte 20,3%
Sul 15,9%
Média Brasil: 20,8%
A pesquisa descobriu ainda que a abstenção foi menor nas grandes cidades (18,1% nos municípios com mais de 200 mil eleitores) e nas muito pequenas (19% nas cidades com até 5 mil eleitores). Nas cidades onde houve o recadastramento por biometria, a média caiu de abstenção caiu para 19,2% ante 25,2% das cidades sem biometria.
Faltando pouco mais de uma semana para a eleição, as campanhas de Lula e Bolsonaro vão usar sua propaganda na TV para mobilizar os seus eleitores a irem votar. As pesquisas mostram que mais de 90% dos que dizem votar num dos dois garantem que que pretendem ir às urnas. Esse índice cai entre os que estão propensos a votar em Ciro Gomes e Simone Tebet e, especialmente, nulos e brancos. A eleição pode ser decidida neste grupo.
Na eleição de 2022, mais de 15 milhões dos 156 milhões de eleitores registrados podem faltar sem cometer infração por terem mais de 70 anos ou menos de 18 anos.