Lula busca um Centrão do B
Com maioria do Senado e boa vontade no STF, Planalto tenta ampliar aliança para acordos pontuais na Câmara
A quase derrota do governo na burocrática medida provisória de reorganização ministerial empurrou os presidentes Lula da Silva e Arthur Lira para um choque de realidade. Nem Lula tem mais as facilidades de ter uma coalização governista sólida à base de indicação de ministros, como foi entre 2003-10, nem Lira terá o poder de decidir como quiser a liberação de emendas, como ocorreu entre 2021 e 22, no governo Bolsonaro. A reacomodação deve adiar um conflito aberto entre os dois. Por enquanto.
Lula quer contornar o poder de Lira criando um “Centrão do B”, negociando cargos e emendas com outros líderes para votações pontuais na Câmara. O presidente disse repetidas vezes ao ministro nesta semana que Lira “boicota” o governo e que nenhum acordo conseguiria saciar a ambição do presidente da Câmara.
Ao mesmo tempo que vai procurar interlocutores alternativos a Lira na Câmara, Lula quer consolidar seu acordo com o Senado. Se tiver o presidente Rodrigo Pacheco como novo melhor amigo, Lula acredita que aborta a possibilidade de pautas-bomba na Câmara. Como tem notória simpatia no Supremo Tribunal Federal, Lula ganharia a partir de eventual acordo no Senado a possibilidade de forçar Lira contra a parede.
Em reação, Lira instiga o líder do PT, José Guimarães, a tomar o lugar de Alexandre Padilha, acusa o ministro da Justiça, Flávio Dino, de jogar a Polícia Federal contra ele e ameaça não colocar para votar a agenda do governo. Em duas semanas, por exemplo, perdem a validade as medidas provisórias que recriam o programa habitacional Minha Casa Minha Vida e o de saúde Mais Médicos.
O plano de Lula pode dar certo, mas para isso precisa de um empenho do presidente e de uma delegação de poder aos ministros Padilha e Rui Costa que ainda não se viu nesses cinco meses de governo. Lula seguidamente mostra pouca paciência para o ramerrame das conversas políticas. Na quarta-feira dia 30, o dia decisivo da MP dos Ministérios, ele primeiro se encontrou por duas horas e meia com o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, falou por telefone com o papa Francisco, autorizou o ministro das Relações Exteriores a marcar uma visita a Paris na última semana de junho e, só depois, foi se dedicar a resolver o imbróglio da votação na Câmara.
Pelo cronograma de Lula, ao longo de junho a Casa Civil e o Ministério das Relações Institucionais vão acelerar a liberação (e não só o empenho) das emendas e distribuir os 250 cargos de segundo escalão abertos nos ministérios. Lula acredita que até o recesso de julho será possível para a ministra Daniela do Waguinho deixar o União Brasil, ir para o Republicanos e permanecer no governo como representante desse partido. Além disso, acha que até lá Elmar Nascimento vai fazer com que o União Brasil referende o seu representante no governo. Para o PP pode ser aberto um ministério ou estatais.
Ministérios dão prestígio, mas desde o primeiro governo Dilma Rousseff não asseguram votos na Câmara. É óbvio que os partidos querem cargos no governo. O Republicanos, por exemplo, já deu seu preço para esquecer o passado bolsonarista e apoiar Lula: um ministério, uma vice-presidência da Caixa e a direção dos Correios. Mas a prática mostra que não há uma correlação direta. PSD, MDB e União têm nove ministérios. Numa conta otimista, o governo tem hoje apoio de 90 dos 155 deputados das três legendas. Na pessimista, 60.
O que importa na hora de contar votos é (1) quem define quais deputados vão receber (2) quanto de emendas. Existem no orçamento deste ano R$ 9,8 bilhões das antigas emendas do orçamento secreto para serem compartilhadas entre os deputados federais, mas até agora o governo Lula não mostrou nem habilidade nem rapidez na distribuição. É otimismo achar que a partir deste mês de junho será diferente.
Na quinta-feira de manhã, horas depois da aprovação da MP dos Ministérios, Lula comparou sua articulação política ao seu time, o Corinthians, que na noite anterior se classificara na Copa do Brasil. A graça guarda uma verdade. Assim como o governo, o Corinthians vinha de oito partidas sem ganhar, com a torcida reclamando do técnico, a vitória suada apareceu de um gol inesperado e a classificação só foi confirmada depois da disputa por pênaltis. Foi um sufoco. Classificado na Copa do Brasil, o Corinthians parece ter entrado numa nova fase, mas já no domingo perdeu de novo e segue a um ponto da zona do rebaixamento no Campeonato Brasileiro.