Bolsonaro é o capitão do Titanic da Covid-19
Proposta de empresas de comprar vacinas para funcionários mostra falência do plano do Ministério da Saúde
A gestão de Bolsonaro no combate à Covid-19 se assemelha à do capitão do Titanic, o navio transatlântico cujo naufrágio em 1912 se tornou o símbolo da arrogância que leva ao desastre. Assim como o Sistema Único de Saúde (SUS) criado pela Constituição de 1988, o Titanic era considerado “inafundável” ao ser lançado ao mar. Depois de ignorar os alertas de outros navios sobre a presença de um iceberg na rota, o Titanic afundou ceifando mais de 1.500 vidas. Depois de ignorar os alertas sobre os riscos do coronavírus e não preparar um plano de vacinação, a gestão Bolsonaro já acumula mais de 217 mil mortes por Covid-19.
Uma notícia apurada pela repórter Julia Chaib, publicada na Folha de S. Paulo, reforça as semelhanças entre a negligência, imperícia e irrealismo de Jair Bolsonaro e as do capitão do Titanic, Edward Smith. De acordo com o jornal, um grupo das maiores empresas brasileiras negocia diretamente com a fármaco AstraZeneca a compra de 33 milhões de doses de vacinas contra Covid-19. As empresas pretendem doar metade dos lotes para vacinação pública, reservando a outra metade para seus funcionários.
Seria uma repetição do sistema do Titanic, no qual os passageiros da primeira classe foram avisando antes e tiveram acesso privilegiado aos botes salva-vidas. Aliás, assim como no Brasil o governo Bolsonaro ainda não apresentou planos para oferecer vacinas para todos, também a dona do Titanic, a operadora White Star Line, não incluiu botes para todos. Por isso, a tragédia do Titanic também é uma história de classes. Dos 179 homens que viajavam na primeira classe, um terço sobreviveu ao naufrágio. Já entre os passageiros da segunda classe, só 8% foram resgatados. Das 144 mulheres da primeira classe, 140 saíram vivas (97%). Das 165 mulheres embarcadas na terceira classe do Titanic, apenas 46% foram salvas.
O acordo proposto pelas empresas é a decretação do cada um por si de um país em naufrágio. Ele desvirtua a solidariedade geracional do sistema público de saúde, contraria as indicações científicas de preferência por grupos de risco e escancara o quem pode mais, chora menos. É a mesma lógica que as grandes redes de laboratórios pretendiam impor ao trazer vacinas da Índia para revendê-las no Brasil, lucrando com a incompetência do Ministério da Saúde.
Como a fábrica belga da AstraZeneca está com problemas, é improvável que o acordo dê resultados. A fármaco deve demorar meses para entregar as doses já pagas pela União Europeia, e obviamente a tentativa das empresas brasileiras de furar a fila terá de esperar. Mas o fato de que alguns dos maiores executivos se reuniram para pensar e propor algo semelhante é revelador da falência do governo em garantir um mínimo de proteção à população.