A Terceira Temporada de In Treatment
A série chegou à sua terceira temporada com a missão de manter o mesmo nível oferecido nas duas primeiras. Sendo uma versão americana de uma produção israelense, “In Treatment” adaptou os roteiros das duas únicas temporadas produzidas para a série original. A produção mudou de mãos. Warren Leight deixou o comando para assumir a série […]

A série chegou à sua terceira temporada com a missão de manter o mesmo nível oferecido nas duas primeiras. Sendo uma versão americana de uma produção israelense, “In Treatment” adaptou os roteiros das duas únicas temporadas produzidas para a série original.
A produção mudou de mãos. Warren Leight deixou o comando para assumir a série “Lights Out”, do FX. Em seu lugar, entraram Anya Epstein, de “Tell Me You Love Me”, e Dan Futterman, do filme “Capote”.
Exibido nos EUA entre outubro e dezembro de 2010, o terceiro ano de “In Treatment” está previsto para estrear na HBO Brasil no dia 21 de fevereiro. Ao todo, a temporada teve 28 episódios.
Ao contrário das temporadas anteriores, nas quais Paul atendia quatro pacientes e depois buscava ajuda com sua própria terapeuta, a terceira temporada contou com apenas três pacientes:
Sunil (Irfan Khan), um professor de matemática aposentado que sofre com a ausência da esposa, morta há seis meses. Acompanhado de seu filho, Arun (Samrat Chakrabarti), e de sua nora, Julia (Sonya Walger, de “Lost” e “FlashForward”), Sunil, relutantemente, busca a ajuda de Paul. Recém chegado da Índia, ele fala sobre a perda da esposa, a mudança de cultura e os problemas que enfrenta por morar com o filho e com a nora, que ele ainda não aceitou.
Frances (Debra Winger) é uma conhecida atriz de teatro e cinema. Há 18 anos atrás, Paul tratou de sua irmã e por isso ela busca ajuda do terapeuta. Frances passa por um momento difícil de sua vida e carreira. Ela se prepara para estrelar uma nova peça. Mas, durante os ensaios, tem problemas para lembrar-se de suas falas. O fato está intimamente ligado aos problemas de saúde de sua irmã, que está em fase terminal de câncer de mama. Preocupado com as consequências que o fato possa ter em sua saúde, Paul força Frances a enfrentar a situação.
Jesse (Dane DeHaan), um jovem estudante de 16 anos que foi pego traficando receitas médicas para o uso de drogas pesadas. Filho adotivo, Jesse sofre com o fato de ser gay e manter uma relação com um parceiro promíscuo. Quando sua mãe biológica tenta contatá-lo, Jesse mergulha mais fundo em seus conflitos pessoais.
Para substituir a Dra. Gina, os roteiristas apresentaram uma nova terapeuta, Dra. Adele (Amy Ryan). Paul a procura para que ela lhe receite comprimidos para dormir. Mas esta o surpreende com sua determinação em fazê-lo enfrentar seus temores mais profundos em relação a sua saúde, divórcio, pacientes e a forma como se relacionava com Gina.
Análise
(Cuidado com Spoilers!)
Paul e Frances
O roteiro da terceira temporada não apresenta personagens com o mesmo nível de qualidade oferecido nas duas primeiras, com exceção de Sunil e Adele. Mas a série traz um ótimo roteiro com uma proposta de desfecho que faz jus aos trabalhos desenvolvidos nos episódios anteriores.
Havia uma razão para que nesta temporada existissem apenas três pacientes. O quarto, e o mais importante, era Paul Weston (Gabriel Byrne). A meu ver, a série não é uma produção sobre pacientes que procuram um terapeuta, relatando seus problemas e buscando uma forma de lidar com eles. Mas sobre um terapeuta com diversos problemas pessoais, que passa por um processo de desconstrução enquanto tenta manter seu equilíbrio com as sessões que tem com seus pacientes.
Recebendo-os em um ambiente fechado, recluso e escuro, Paul se apresenta como uma pessoa íntegra, interessada em ajudá-las da melhor forma possível, buscando conciliar os conflitos que surgem ao longo do tratamento com a maneira com a qual o paciente deve olhar para si e seus problemas.
Mas Paul Weston tem seus próprios demônios, acumulados ao longo de muitos anos. Desde a primeira temporada esses problemas, nunca enfrentados e, portanto, nunca resolvidos, gradualmente começam a dominar sua vida, interferindo em seu trabalho até chegar ao ponto de começar a perturbar sua mente.
A proporção aumenta conforme as temporadas avançam. Ele se envolve emocionalmente com uma de suas pacientes, perde a esposa, a morte do pai o leva a pensar em sua própria longevidade, adotando uma postura obsessiva em relação a sua saúde. Seu sono acaba sendo afetado e seu autocontrole está chegando ao fim.
Com a segunda temporada, perde a terapeuta que servia para ele como uma forma de aliviar esses problemas. Atendendo Paul em um ambiente caseiro, maternal, Gina permitia que ele a dominasse, controlando a forma como ela o tratava e o que ela podia ou não dizer para ele. Agora, Paul busca por uma nova profissional que possa lhe servir da mesma forma. Mas, na terceira temporada, ele encontra a Dra. Adele.
É comum as pessoas buscarem o controle, seja de suas vidas, de seus trabalhos, de uma relação ou de uma situação. O nível e a forma como essa busca se processa são diferentes de pessoa a pessoa. A série trabalha habilmente essa luta ao mostrar pessoas que tentam manter o controle e a forma como reagem quando percebem perdê-lo.
Paul, que precisa manter o controle de sua vida, das situações em que se envolve e da sua própria mente, não consegue mais manter o domínio. Ao encontrar a Dra. Adele, ele descobre que se tornou um paciente e não um amigo visitando uma colega com quem troca ideias.
Acompanhar as sessões de terapia entre Paul e Adele foi como ver ‘dois gladiadores em uma arena’. Adele recebe seus pacientes em um ambiente simples, despojado, mas incrivelmente iluminado. Ao encontrá-la pela primeira vez, a mente de Paul se perturba. Ele reage de forma grosseira e preconceituosa, provocando-a para um enfrentamento. Mas Adele não entra no jogo de Paul.
Como um animal selvagem preso pelo pescoço, a mente de Paul esperneia, ataca, tenta encontrar o ponto vulnerável de seu adversário. Sem obter resultados que o favoreçam, ele passa a apelar: ora para sua compaixão, ora para sua racionalidade. Quando nada funciona, puxa sua última cartada: ele se declara à Adele.
Mas ela conhece os truques da mente, não se deixa seduzir ou se envolver, muito embora, em alguns momentos, parece que ela irá ceder. Finalmente Paul se vê desarmado e forçado a olhar para dentro de si de uma forma que talvez nunca tenha feito antes.
Sentindo-se traído por seus pacientes e até por sua terapeuta, ele desiste de tudo. A partir daí, não sabemos o que fará. Sua relação com seus pacientes era uma forma de lidar com seus próprios problemas, sem de fato enfrentá-los. Agora que percebe ter perdido o controle e a conexão que acreditava ser capaz de ter com eles, Paul duvida de sua capacidade de exercer sua profissão.
Mas eles, e sua terapeuta, fizeram com que Paul parasse de fugir, forçando-o a olhar para dentro de si mesmo; a sentir e entender seus conflitos. Embora esse processo de autoconhecimento esteja apenas começando, tudo indica que este seja o final de “In Treatment”.
Interessante notar a última cena em que vemos Paul, caminhando entre a multidão, se misturando em meio a dezenas de outras pessoas, muitas delas iguais a ele. Esta é uma cena comum para o final de vários filmes. Mas o que me veio à mente foi “Os Três Dias do Condor”, no qual o personagem de Robert Redford caminha pela multidão acreditando que resolveu seus problemas e que terá de volta o controle de sua vida. Mas, na última imagem que temos do personagem, ele olha para trás, revelando dúvidas e insegurança quanto ao futuro. Paul não olhou para trás.
★★★½
Fernanda Furquim: @Fer_Furquim