‘Hatfields & McCoys’, a produção de maior audiência da TV a cabo
Ninguém acreditava que uma minissérie sobre o famoso duelo entre duas famílias sulistas americanas do século XIX pudesse interessar o público da TV a cabo de hoje, pelo menos é o que diz o co-produtor Leslie Greif (Walker Texas Ranger) em entrevista ao New York Post. Originalmente criada há 30 anos, época em que Shogun, […]

Ninguém acreditava que uma minissérie sobre o famoso duelo entre duas famílias sulistas americanas do século XIX pudesse interessar o público da TV a cabo de hoje, pelo menos é o que diz o co-produtor Leslie Greif (Walker Texas Ranger) em entrevista ao New York Post.
Originalmente criada há 30 anos, época em que Shogun, Pássaros Feridos e Raízes faziam grande sucesso na TV aberta, a minissérie Hatfields & McCoys foi oferecida a diversos canais da rede aberta ao longo da década de 1980.
Na década seguinte, quando a produção original da TV a cabo ainda estava engatinhando, Greif, que nunca desistiu do projeto, incluiu em sua peregrinação alguns canais como a HBO, o Showtime, a TNT, o Starz, o FX, o USA e até mesmo o TBS, que só produz comédia. Todos eles rejeitaram a proposta de produzir a minissérie, mesmo tendo, no início, Burt Lancaster no elenco. O ator, que faleceu em 1994, interpretaria o personagem que ficou com Kevin Costner.
Entre as respostas que Greif ouvia estavam desculpas como ‘ninguém mais quer ver um faroeste’, ‘nunca fará carreira no exterior para compensar os gastos’, ‘os personagens são muito velhos e a história é muito voltada para o público masculino’, ‘não existe um modelo financeiro para isso’, e até mesmo ‘as minisséries não tem mais espaço na TV’. Esta última desculpa ele deve ter ouvido muito na década de 1990, visto que, com a chegada da TV a cabo que explorou mais as séries com histórias contínuas, as minisséries desapareceram da rede aberta.
Agora, com Hatfields & McCoys dando para o canal History o recorde de maior audiência americana de uma produção ficcional da TV a cabo dos últimos anos, esses canais devem estar ‘batendo com a cabeça na parede’ pela decisão que tomaram.
Seis episódios foram produzidos e exibidos ao longo de três noites consecutivas. Em sua primeira noite, Hatfields & McCoys registrou a audiência recorde de 13.9 milhões de telespectadores ao vivo, com 4.8 milhões entre o público alvo (18-49 anos). Com as reprises na mesma noite, a audiência chegou a 17 milhões.
Mas quem pensou que a audiência despencaria na segunda noite, se enganou. A minissérie sustentou seu público, registrando a média de 13.1 milhões, com 4.7 milhões entre o público alvo.
A surpresa não termina por aí. Em sua última noite a produção bateu seu próprio recorde, registrando a média de 14.29 milhões de telespectadores e 4% do público alvo em sua primeira exibição (o canal não divulgou os números conquistados com a reprise na mesma noite).
O resultado pode ter sido recompensador para os produtores, mas para os telespectadores que buscam uma produção de qualidade, a minissérie deixa a desejar.
Com base em história real, Hatfields & McCoys apresenta a disputa sangrenta que existiu entre duas famílias durante o período pós-guerra civil.
Hatfield (Costner) e McCoy (Bill Paxton) são amigos e companheiros que lutaram juntos na Guerra. Mais tarde, quando cada um retornou aos seus respectivos lares e famílias – Hatfield na Virgínia e McCoy no Kentucky – tem início uma rivalidade que custará a vida de vários membros das duas famílias ao longo de anos.
Tudo começa quando o ex-soldado da União, Harmon McCoy, primo de Randall, é assassinado. As suspeitas recaem sobre os membros da família Hatfield. A partir deste evento, surgem ao longo dos anos diversos conflitos que levarão as duas famílias a uma nova ‘guerra civil’.
Os personagens não são a razão pela qual a minissérie foi produzida, já que ela se restringe a mostrar o conflito, apresentando sucessivas cenas de brigas, lutas, emboscadas e mortes que exemplificam a rivalidade. Com isso, a minissérie não estabelece seus personagens ou motivações, o que impede o público de se envolver. O telespectador observa um lado destruir o outro.
Por não fazer um estudo de personagens, as motivações e as consequências emocionais e psicológicas que o conflito traz para cada um são apresentadas apenas como um registro ao fato ocorrido. Sem uma construção emocional e psicológica dos personagens, não se estabelece a evolução do ódio, da revolta, da dor, da decepção, do remorso e das contradições que surgem ao longo dos 28 anos em que as duas famílias se enfrentaram.
O que é apresentado é a ideia desses sentimentos e das perturbações pelas quais os personagens passam, para que o público compreenda a gravidade das ações. Assim, espremidos entre as cenas de ação, os atores não conseguem convencer o telespectador de que eles são as pessoas que interpretam.
Além das cenas de rivalidade, a minissérie também dá excessiva atenção ao casal Johnse Hatfield (Matt Barr, de Hellcats) e Roseanne McCoy (Lindsay Pulsipher, de True Blood), que formam a relação Romeu e Julieta da história, deixando os protagonistas (Costner e Bill Paxton), considerados velhos, em segundo plano.
Filmada na Romênia, a produção conta com figurantes que comprometem o realismo das cenas em que aparecem e com alguns atores que não conseguem se desassociar do Século XXI para encarnar personagens que vivem no interior do sul dos EUA no Século XIX (a exemplo dos atores que interpretam o casal ‘romeu e julieta’ da história).
O resultado é uma minissérie que está muito perto de uma produção de Hollywood e quilômetros de distância das montanhas do Kentucky e da Virgínia.
Quem se destaca é o ator Noel Fisher (Shameless) que interpreta Ellison, um sobrinho de Anderson Hatfield (Costner), deficiente mental que se envolve na disputa quase que por acidente.
O que sustenta seis horas de minissérie é a riqueza cultural que existe por trás dos personagens que, mesmo mal construídos, conseguem atrair e manter o interesse do telespectador em sua história. Pena que, ao terminar, a produção deixe uma sensação de desperdício.
Para o canal History, a produção de Hatfields & McCoys foi encomendada para marcar o 150º aniversário do início da luta entre as duas famílias. Mas, para os fãs do gênero, o sucesso da minissérie pode promover o ressurgimento do faroeste televisivo.
Apesar da boa receptividade crítica de Deadwood em 2004, a série da HBO não conseguiu promover a volta do gênero. No máximo influenciou o canal AMC a produzir a minissérie Broken Tail, em 2006, que também registrou uma audiência elevada (9.8 milhões de telespectadores).
O que se tem até o momento é o desenvolvimento de diversos projetos situando as histórias no Velho Oeste. Mas, na hora de escolher qual deles será transformado em séries, as produções estreladas por ‘cowboys no asfalto’ ganham a disputa, como é o caso de Justified, Vegas e Longmire.
Fernanda Furquim: @Fer_Furquim
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