‘Massacre na Escola’: doc da HBO Max revisita tragédia de Realengo
Vítimas e sobreviventes são resgatados em produção do caso que chocou o Brasil em 2011
Em 7 de abril de 2011, um homem de 23 anos matou doze adolescentes — entre as vítimas, dez meninas e dois meninos — a tiros dentro da Escola Municipal Tasso de Silveira, no bairro de Realengo, no município do Rio de Janeiro. Outros 22 estudantes ficaram feridos. O assassino foi interceptado por um policial militar, que o baleou, e depois cometeu suicídio. Além das marcas da tragédia conhecida como o Massacre de Realengo serem eternizadas pelas fatalidades daquela manhã fatídica, os sobreviventes e parentes das vítimas relembram o terror em Massacre na Escola: A Tragédia das Meninas de Realengo, nova série documental da HBO e HBO Max que estreia na plataforma e na TV paga no próximo domingo, 9. às 22h.
A coprodução da Giros Filmes e Warner Bros. Discovery é dirigida por Bianca Lenti e conta com a restituição do caso, além de depoimentos de ex-alunos da Tasso de Silveira que presenciaram o ataque, assim como o antigo diretor da escola e o sargento Márcio Alves, policial militar que impediu que o massacre fosse maior, e a análise de especialistas em comportamento humano para falar do caso. O documentário não cita o nome nem mostra o rosto do assassino, uma iniciativa que visa desmotivar novos casos, já que autores cometem ataques a fim de ficarem famosos de alguma forma.
Em entrevista a VEJA, a diretora Bianca Lenti explicou que a decisão de omitir a identidade do criminoso estava prevista desde o início do projeto e que havia sido inspirada na ex-primeira-ministra da Nova Zelândia Jacinda Ardern, que havia se negado a dar holofotes para o autor de um massacre que matou 50 pessoas em duas mesquitas na cidade de Christchurch. O caso ocorreu em 2019, mesmo ano que Massacre na Escola fora idealizado. “Essa condição de não mostrar o assassino era até uma decisão contratual com as nossas roteiristas. Fomos muito inspiradas pela decisão da ex-primeira-ministra da Nova Zelândia. Ela levantou essa bandeira, e nós vimos que queríamos jogar luz na história das vítimas, não na história do algoz. Porque tem um efeito nocivo, justamente porque o que eles querem é reconhecimento”, pontuou.
À frente da gestão que produz documentários da HBO Max, Patricio Díaz, gerente de não-ficção da WBD Brasil, também elucidou à reportagem o motivo para escolher Realengo como objeto de estudo em uma série: “O fenômeno de massacres em escolas começou com Realengo. É um assunto super relevante e está muito atual, infelizmente, mas acho que o debate tomou uma nova dimensão com três ou quatro ataques que tivemos recentemente no Brasil. Isso dá um senso da atualidade ainda maior, e o documentário é bem-sucedido ao demonstrar um fenômeno do qual não se pode fugir”.
Nos dois primeiros episódios, os quais VEJA teve acesso antecipado, a série faz um resgate tocante do massacre, mostrando o estado atual de alguns dos alunos sobreviventes, ressaltando que a tarefa de reconstrução após o trauma, obviamente, não foi fácil, principalmente para pais, irmãos e amigos que perderam pessoas no ataque. A produção é objetiva, costurando a cronologia dos fatos rapidamente, mas não passa do tom introdutório e ligeiramente apelativo neste começo. Um grande acerto do conjunto da obra é ressaltar que o ataque teve uma questão de gênero — o atirador queria matar meninas –, além de homenagear as vítimas esquecidas na época da cobertura, quando se dissecava as motivações do autor. “As pessoas estavam se perguntando o tempo todo porque isso tinha acontecido, é natural que eles fossem buscar respostas no perfil do atirador, mas aqui quisemos buscar entender o por quê os massacres continuam e por quê a gente não se responsabiliza enquanto sociedade por esse fenômeno social, por que não investigamos mais os discursos de ódio disseminados por algoritmos na internet e essa busca por uma masculinidade violenta tóxica”, defende Bianca.
Nos demais capítulos, a série pretende analisar, com ajuda de especialistas, o fenômeno dos “incels”, jovens que menosprezam o gênero feminino por se sentirem rejeitados — perfil parecido com o do assassino de Realengo, destacando mais um dos perigos da internet, de forma necessária.