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Críticas e análises sobre o universo da televisão e das plataformas de streaming

De Maria de Fátima a Caco Antibes, o horror a pobre estampado na TV

Personagens da ficção passam por cima de tudo e de todos em busca da riqueza num retrato incômodo do próprio Brasil e da chamada "aporofobia"

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 15 abr 2025, 11h35

Uma cena de Vale Tudo virou piada (ops, meme) nas redes sociais ao mostrar a alpinista social Maria de Fátima (Bella Campos) explicando para a mãe, Raquel (Taís Araújo) o quanto ela detesta os pobres. A palavra pobre é dita por ela treze vezes (os internautas contaram) no longo discurso para a mãe, que acaba inclusa no balaio do ódio da filha – afinal, Raquel é pobre. Num passado não muito distante, Caco Antibes, personagem do humorístico Sai de Baixo, interpretado por Miguel Falabella, emplacou o bordão “eu tenho horror a pobre”. O personagem falido, que vivia às custas da família da mulher, não baixava o nariz, apesar de não ter onde cair morto. Ironicamente, no frigir dos ovos, ambos os personagens são nada mais, nada menos, que pobres — financeiramente e, claro, de alma. 

A aversão a pobre é engraçada na novela, mas não na vida real. Em 2017, a filósofa espanhola Adela Cortina emplacou no vocabulário acadêmico o termo “aporofobia” – que no Brasil foi também adaptado para “pobrefobia”. Trata-se da aversão às pessoas de classes mais baixas e da rejeição sistêmica e social do que elas representam. A palavra nasceu da junção dos termos gregos á-poros (sem recursos) e fobos (medo, aversão). Há ainda os que consideram, sem colocar em palavras exatas, que a pobreza deveria ser criminalizada – desejar que pessoas em situação de rua, por exemplo, sejam presas, faz parte desse mentalidade. 

Segundo a pensadora, essa aversão se expande para situações como a rejeição à imigrantes – não à toa, recentemente, o presidente americano Donald Trump, um voraz perseguidor de imigrantes ilegais nos Estados Unidos, propôs um visto de permanência no país para àqueles que podem comprá-lo: batizado de “gold card”, ele custa a bagatela de 5 milhões de dólares. 

Claudia Rodrigues em 'Sai de Baixo'
Miguel Falabella e Claudia Rodrigues em ‘Sai de Baixo’ – patrão e empregada (Divulgação/TV Globo)

Vale Tudo é, desde sua primeira versão, dos anos 1980, um exemplo primoroso dessa tensão de classes. Além de Maria de Fátima, que representa a parcela da humanidade que odeia até a própria família por ser pobre – e toma atitudes como vender a casa e deixar a mãe na rua para se dar bem –, a novela tem também, na ponta de lá, a icônica vilã Odete Roitman, uma ricaça que, se pudesse, não pisaria no Brasil nunca mais… por ser um país de pobres. Ambas desdenham não só da própria origem, como também de suas fontes de renda – a empresa dos Roitman prosperou no Brasil, e Maria de Fátima usurpou a única herança da mãe, conquistada pelo avô, um homem honesto e trabalhador. Ao redor das duas, outros tipos seguem a mesma lógica: do trambiqueiro César (Cauã Reymond) ao empresário Marco Aurélio (Alexandre Nero), que se recusa a dirigir a palavra às secretárias, Vale Tudo é um antro de pessoas que, sem moral ou honestidade, fazem tudo e mais um pouco com o intuito de se manter o mais longe possível das camadas sociais que desprezam. Um retrato sagaz da elite brasileira — e de seus aspirantes. 

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