‘Black Mirror’: as alfinetadas nada sutis da nova temporada à Netflix
Disponível na plataforma, a produção não poupa nem o próprio streaming das críticas feitas nos novos episódios

A sexta temporada de Black Mirror chegou à Netflix recentemente, depois de quatro anos de espera, e é uma das produções mais assistidas da plataforma nesta semana. Ironicamente, a nova leva de episódios da série de Charlie Brooker, conhecida pela sua visão fatalista sobre os perigos da tecnologia, traz alfinetadas nada sutis à própria Netflix, como uma espécie de “mea-culpa” controlado da plataforma.
A brincadeira crítica começa no primeiro episódio, batizado de A Joan É Péssima. Com Salma Hayek no elenco, a trama conta a história de uma mulher comum que tem a vida virada de ponta-cabeça quando um streaming chamado Streamberry lança uma série quase em tempo real sobre a sua vida, expondo segredos e enfatizando seus defeitos. Quando procura ajuda jurídica, Joan descobre que autorizou a produção ao aceitar sem ler o termo de uso do streaming que, quando impresso, se torna um calhamaço de milhares de páginas que dão à companhia o direito de fazer o que bem entender com a sua vida.
Com o streaming em foco, pintado como um malvadão que usa os assinantes e a tecnologia sem nenhum escrúpulo, a série tira sarro da própria casa ao usar referências da Netflix na construção visual da plataforma fictícia. “Falamos para a Netflix: ‘Podemos usar o logo de vocês?’ E eles disseram que sim. Ficamos mais corajosos e pedimos para usar o som do tudum. Eles também autorizaram. Então, seguimos usando mais referências”, explicou a produtora Jessica Rhoades em entrevista a VEJA.
Outro episódio que também pode ser visto como uma crítica discreta à plataforma (mas não só a ela) é Loch Henry. Situada em uma cidadezinha do interior que foi palco de diversos assassinatos, a trama relata a história de Davis McCardle (Samuel Blenkin), um estudante de cinema nascido e criado no local que é convencido pela namorada a fazer um documentário sobre as mortes que aconteceram ali. Incomodado em reviver o sofrimento das vítimas, ele reluta em um primeiro momento, mas acaba convencido de que a produção ajudaria a transformar o local em um polo turístico devido ao fascínio da cultura pop com o dito “true crime”.
Com uma visão crítica sobre o gênero, o episódio aponta o dedo para a glamourização de assassinos e para a falta de humanidade com que a indústria, muitas vezes, trata os crimes reais, transformando tragédias em fonte de lucro enquanto ignoram o fato de que, por trás das telas, há vítimas reais que sofreram com a violência. Embora não dê nome aos bois, a crítica serve também para a Netflix, que mergulhou de cabeça nos últimos anos nas histórias de assassinos famosos — recentemente, Dahmer reviveu a história de um dos assassinos mais conhecidos dos Estados Unidos, o que causou incômodo à família das vítimas.