Autor de ‘Império da Dor’: “A epidemia de opioide mata 100 mil por ano”
Barry Meier cobriu a crise sanitária que vitimou milhões de pessoas nas décadas de 80 e 90 nos Estados Unidos

Série que acabou de chegar à Netflix, Império da Dor retrata de forma revoltante como a empresa farmacêutica Purdue Pharma produziu e colocou no mercado — utilizando de manobras antiéticas — o OxyContin, um opioide potente e tão viciante quanto a heroína, o que desencadeou em uma das maiores crises sanitárias dos Estados Unidos. Hoje, estima-se que cerca de 500.000 pessoas morreram de overdose da droga nas duas últimas décadas. Na ficção baseada em histórias reais, Matthew Broderick interpreta Richard Sackler, que foi o mentor do OxyContin e que se tornou bilionário graças ao marketing agressivo do medicamento. Uzo Aduba também brilha na produção Edie Flowers, investigadora da procuradoria da Virgínia que desvendou o esquema da Pardue. Em entrevista a VEJA, o jornalista americano Barry Meier, de 74 anos, autor do livro em que se baseia a série, Pain Killer: A Wonder Drug’s Trail of Addiction and Death, lamenta a impunidade dos responsáveis pela OxyContin, que devastou milhões de famílias ao redor do mundo.
Como o senhor se sente ao contar a história que basicamente reforça o fato de que homens brancos e ricos sempre podem sair impunes de crimes? Eu diria que o departamento de justiça dos Estados Unidos tem um senso de justiça muito peculiar. Ele sente prazer em aplicá-lo em pessoas pobres, pessoas que não têm poder, mas quando se trata de executivos corporativos, eles geralmente recebem apenas um passe livre. E, de certa forma, é disso que se trata esta história de Império da Dor. É sobre pessoas que cometeram crimes, sobre uma empresa que cometeu crimes, sobre uma indignação de que nosso governo se recusou a enfrentar essa companhia e porque eles se recusaram a enfrentá-la, temos esta epidemia que poderia ter sido interrompida ou atenuada de alguma forma. Deixaram essa epidemia continuar rolando, rolando e rolando. E hoje temos 100.000 pessoas, só nos Estados Unidos, morrendo de overdose todos os anos.

O senhor cobriu a história há duas décadas, viu acontecer de perto. Sentiu algum receio de que a série pudesse fazer com que jovens descobrissem o OxyContin e talvez quisessem experimentar por curiosidade? Olha, esse trem já saiu da estação há muito tempo. Eu estava escrevendo sobre essa epidemia e sobre o abuso de OxyContin há duas décadas, e muitos já me questionavam se eu não estava ensinando crianças a como abusar do OxyContin, mas na verdade, se você conhece algum adolescente, sabe que eles estão muitos passos à frente dos adultos. Eles não precisavam de mim ou de nenhum jornalista para lhes dizer como abusar do OxyContin. O que descobrimos é que eles já sabiam como usar de forma recreativa e é por isso que temos essa crise. Eu vejo que a série está colocando esse problema em contexto. E espero que a mensagem que Império da Dor deixe é a possibilidade de evitar que esse tipo de desastre aconteça novamente. Nós, como pessoas, nós, como indivíduos, temos que intensificar. Não podemos contar com o governo ou funcionários de saúde pública ou reguladores para fazer algo. Temos que nos levantar. Temos que começar a gritar e temos que impedir que isso aconteça.