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A ‘confissão’ de Ana Luiza Guimarães no JN que resume telejornalismo atual

Apresentadora da Globo expôs algo pessoal em uma reportagem sobre golpes com a CNH - e isso diz muito sobre a nova relação entre as pessoas e a TV

Por Marcelo Marthe Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 21 nov 2024, 16h51 - Publicado em 21 nov 2024, 14h27

A edição do Jornal Nacional da noite de quarta-feira, 20, se iniciou com uma reportagem sobre um tema de amplo interesse: os perigos de um novo golpe pelo celular que envolve as carteiras de habilitação, ou CNHs, dos brasileiros. Era uma reportagem relevante, sem dúvida, ainda que consistisse numa pauta absolutamente corriqueira para os padrões do noticiário da Globo. Mas eis que, no finalzinho da matéria, um lance destoou da edição impessoal e asséptica de praxe. O âncora William Bonner levantou a bola, e sua colega de bancada, Ana Luiza Guimarães, fez uma revelação um tanto pessoal no ar. Contou, primeiro, que também havia sido abordada pelos tais golpistas. Em seguida, fez uma “confissão” pueril, mas capaz de surpreender o público: ela nem mesmo tem CNH, porque nunca tirou uma.

O assunto pode parecer prosaico demais até para ser resgatado nesta reportagem — mas, se o leitor passar dessas linhas, verá que, por trás de algo assim, tão ameno e inofensivo, há uma mudança de postura notável que sintetiza os dilemas do telejornalismo atual.

O que há por trás do lance no JN, afinal?

Ao revelar que ela mesma foi alvo do golpe de que tratava a matéria do JN e ainda expor ao país que não tem carteira de motorista, Ana Luiza Guimarães fez aquilo que atiça o apetite do público na era das redes sociais: entregou de bandeja um pequeno naco de sua vida pessoal. É um detalhe fortuito que, na prática, não acrescenta nada digno de nota à denúncia importante do JN. Mas expor a intimidade, fazer crer que se é espontâneo e “verdadeiro” hoje é um ingrediente infalível —- como prova o sucesso dos ditos influencers — para se mobilizar não apenas a audiência televisiva, mas a arena da internet. Quando o maior telejornal do país incorpora esse tipo de expediente, mostra que algo substantivo está mudando na relação das pessoas com a TV.

Que mudança é essa no telejornalismo?

Nos últimos anos, o jornalismo profissional em geral no mundo todo passou a enfrentar a concorrência desleal — e nociva para a sociedade — da enxurrada de fontes de informação duvidosas e das fake news propagadas pela internet, especialmente nas redes sociais. A reação a esse avanço perigoso da desinformação inclui mudanças e readaptações significativas que não se pretende resumir aqui. Mas um sintoma pontual visível é a tentativa de telejornais como os da Globo de incorporar algo dessa “espontaneidade confessional”, digamos assim, ao estilo de seus apresentadores. Lances como o de Ana Luiza Guimarães e outros gracejos e rasgos pessoais de âncoras ou repórteres atendem a um anseio de ampliar a empatia e a própria credibilidade desses mediadores das notícias. A despeito do que o espectador pense sobre a singela falta de CNH da estrela do JN, é um fenômeno que veio para ficar.

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